Diversas reportagens recentes afirmam que o governo de São Paulo estaria estruturando um projeto, ainda em fase estudos, para remanejar moradores de rua para trabalho no campo. O “Saindo das Ruas” visa transportar essa gente sem teto para o interior (segundo dados, 52 mil pessoas só na capital paulista e 86 mil em todo o estado) para dedicar sua mão de obra na produção agrícola. Eles seriam contratados pelos próprios produtores (187 mil familias, segundo o governo) e a administração estadual se responsabilizaria pelo transporte e aquisição da colheita obtida por esses trabalhadores. A Defensoria Pública se manifestou preocupada com critérios de fiscalização, o bem-estar dos envolvidos, e perigos de trabalho análogo à escravidão praticados por futuros patrões. Alguns setores da imprensa elogiaram a iniciativa. No entanto, isso não seria bem um plano, e sim uma “ideia” vazada (e já com nome, hein?) sem consentimento da Secretaria de Desenvolvimento Social, responsável por uma futura proposição, caso se concretize. Todo esse imbróglio nos faz refletir sobre ideologia, participação popular, e política pública.
Imagine que você ouviu um plano desses, mas desconhece a fonte. Acredito que você reflita sobre a situação por ela mesma, sem se dar conta de qual partido ou governante, apenas faz uma reflexão sobre o problema em si. De acordo com suas observações, você destaca os pontos positivos e negativos, como qualquer análise técnica de algo que lhe foi sugerido. Entretanto, você fica sabendo que partiu de uma gestão cujo representante máximo foi ministro de Bolsonaro, apoiou objetivos nefastos do ex-presidente, se calou diante de absurdos verbais, e lutou pela reeleição da mesma peça. Falo do governador de São Paulo Tarcísio de Freitas. Ora, por toda aproximação com a figura asquerosa do ex-presidente, qualquer um que deu graças a Deus por esse governo não ter obtido sucesso eleitoral, estaria com a pulga atrás da orelha com os propósitos desse governador. Por isso mesmo, é sempre bom verificar as condições de implantação de algo do tipo primeiro para observar depois quem irá executá-lo. Diante disso, você pode suspeitar da índole dos que planejam colocar em prática tal ação, mas a própria dinâmica do empreendimento não deve ser descartada.
Porque depende muito da participação dos implicados no programa. Não há viabilidade de algo do tipo sem contar com apoio dos movimentos sociais que acompanham as mazelas dos que serão beneficiados (ou não). E aí conta muito a conduta dos proponentes para com esse povo em suas concepções políticas. Se há aproximação programática, participação em conselhos, se os recebe e os escuta em audiências públicas, etc. Ou seja, se não contar com uma cooperação compartilhada, não há jogo – como lembrou alguns colegas sociólogos com quem conversei. Pelo que me consta, os integrantes do governo paulista não possuem esse histórico...
Por fim, uma política pública desse nível precisa de ampla cobertura, como fiscalização, monitoramento, logística, checagem na qualidade dos produtos, moradia digna... Sem falar que muitos não tem documentação, capacitação profissional, possuem graves problemas psicológicos, de saúde, dependência química...Lembrando que tudo isso seria ofertado por políticos que pleiteiam a redução do Estado, privatizações em massa, valorização da iniciativa privada, empreendedorismo... Se articulam tanta autonomia do cidadão, fica difícil crer que haverá plena cobertura de algo dessa magnitude. Por outro lado, uns vão, outros surgem. Não adianta nada qualquer realização dessas sem contrapartidas para que novos moradores não venham habitar as ruas esvaziadas. Garantias para isso são quase impossíveis. Um plano para o agora, o futuro que se vire...
Tudo isso é pura especulação, já que não há aval nenhum para isso ser implementado. Mas fica o exercício de refletir algo do tipo e também mostrar aos críticos que pelo menos houve alguma ideia, por mais esdrúxula que seja.
FONTE:
IMAGEM: Escola Educação (escolaeducacao.com.br)
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