O beijo. August Rodin (1888-1889)
Hoje irei falar de um assunto popular, que está na cabeça e na boca do povo: o sexo. Não irei me referir apenas ao sexo no seu sentido biológico, como naquelas aulas de ciências e biologia dos meus tempos colegiais, mas da sexualidade vivida, desde muito cedo, e constituída socialmente.
Creio que antes de tudo devo prestar minha homenagem ao velho Sigmund Freud, que dedicou boa parte de sua obra, e sua maior criação – a psicanálise -, a esse tema tão polêmico e controverso na sociedade vienense de fins do século XIX e início do século XX. Freud foi um grande revolucionário de seu tempo, indo de encontro a uma sociedade puritana e tirando a sexualidade do espaço restrito da vida privada, sob os lençóis sempre brancos e os limites das quatro paredes do quarto de dormir, para torna-lo público, convertendo-o em objeto de estudo. Depois dele, creio que apenas seu discípulo e dissidente, Wilhelm Reich, foi tão revolucionário, tratando de temas como a função do orgasmo e dando à sexualidade um caráter político.
Não irei me ater, no entanto, às construções teóricas da psicanálise ou da análise reicheana, nem me debruçarei sobre a história dos estudos sobre a sexualidade, embora eu creia ser importante pontuar que, apesar de passados mais de um século desde a criação da psicanálise, e durante esse período muito ter-se falado, debatido, construído, desconstruído e transgredido em termos de verdades e discursividades em torno da sexualidade, esse tema continua a ser objeto de polêmicas, resistências, reações acaloradas e reiterações de tabus. Em função de tudo isso, precisamos sempre retomar a este velho tema para tentar compreender seus nós no emaranhado que é a vida e o comportamento humano.
O primeiro ponto que considero ser importante ser tratados é o polêmico tema da sexualidade infantil. O velho Freud já tratou desse tema, inclusive dando primazia à infância em relação a todas as outras fases do desenvolvimento humano. O que tenho claro, no entanto, é que a sexualidade na criança não é e nem pode ser igualada à do adulto.
A criança tem um corpo erótico demandante de satisfação e prazer tal qual o do adulto, mas essa sexualidade não é a do contato sexual genital, mas da experimentação e descoberta da corporeidade, dos prazeres da manipulação do próprio corpo e do de outras crianças, da imaginação e da comparação do seu corpo infantil com o corpo do adulto, das fantasias amorosas e eróticas muito mais de caráter idealizado e platônico que realizável na concretude.
Isso, creio eu, se dá até a puberdade, quando a sexualidade genital começa a aflorar de forma mais evidente, dadas as mudanças hormonais e a intensificação do desejo sexual, que vai se desenvolvendo durante toda a adolescência e ganhando seus contornos mais estáveis na idade adulta.
Ao trazer essas considerações sobre a sexualidade infantil não quero idealizá-la, convertendo-a a uma sexualidade angelical. Longe disso! Porem creio que essa deveria ser compreendida como a sexualidade vivida em sua forma mais natural, quando respeitados o desenvolvimento e maturação corpóreos e psíquicos da criança.
Vivemos, no entanto, numa sociedade hiperconectada e hipersexualizada, de modo que, desde muito cedo as crianças já tomam conhecimento sobre a sexualidade adulta, via novelas e programas de televisão, sites da internet e pelas trocas de informações realizadas entre as próprias crianças.
Tomando a mim mesmo como exemplo, tive meu primeiro contato com filmes “eróticos” – na época os famosos filmes da série Emanuelle, que passava na TV Bandeirantes, que não eram tão explícitos, mas mostrava os corpos nus, sem as genitálias à mostra -, aos 4 ou 5 anos de idade. Nesta época, passava “programação adulta” na televisão a partir das 22 horas da noite, horário em que criança já deveria estar dormindo. Aos 11 anos fui apresentado à minha primeira revista Playboy, por um coleguinha de escola que também me ensinou, na teoria, como me masturbar. As aulas de ciências da escola, que tratava de “sistema reprodutor” e “doenças sexualmente transmissíveis” só vieram um ano depois, aos 12 anos, quando quase todos os meninos e meninas da minha turma já estavam mais do que escolados nas técnicas de masturbação e, quase que literalmente, subindo pelas paredes. Aos 14 anos, alguns coleguinhas meus já namoravam sério e, não tenho dúvidas quanto a isso, já começavam suas primeiras experiências sexuais. Alguns, como meu coleguinha que me ensinou a masturbação, já participava de brincadeiras sexuais desde os 10 ou 11 anos, incluindo sexo grupal com meninos e meninas, já sabia a utilidade da camisinha e falava com a autoridade de um mestre. Eu só fui descobrir o que era uma ejaculação alguns meses depois da primeira masturbação, e, como na época estava na catequese para a primeira eucaristia, pois estudava em colégio religioso, achava que a masturbação era pecado e me sentia muito culpado toda vez que ejaculava. Só muito depois deixei de me sentir culpado, quando a fé cristã deixou de exercer tanta influencia sobre minha personalidade. Apesar de ter iniciado meus contatos com filmes eróticos aos 4 anos, o que parece precoce, só assisti meu primeiro filme pornô aos 14 anos e só iniciei minha vida sexual aos 19 anos, muito depois de muitos de meus contemporâneos, porém, ao meu ver, no momento certo de assumir relacionamentos afetivos e sexuais com responsabilidade.
Por que trago essas memórias “picantes” de minha juventude? Para exemplificar que as descobertas da sexualidade na infância e adolescência se dão muito mais cedo do que nós – adultos ingênuos – ousamos imaginar. E essas descobertas não são lineares nem implicam necessariamente em passagem ao ato. Há descontinuações, elaborações e reelaborações, construções e desconstruções de sentido e de experiência ao longo de todo o processo. Em função dessa variabilidade quanto ao tempo e o modo como a sexualidade é descoberta e vivida pelas crianças e adolescentes, faz-se necessário que pais e professores estejam atentos desde cedo para poderem orientar seus filhos e alunos sobre o tema, sem preconceitos ou tabus, mas de forma pragmática, com realismo e responsabilidade.
É importante que os pais e professores possam instruir bem seus filhos e alunos no sentido de nem esconder conhecimentos necessários e compatíveis com a maturidade e o desenvolvimento psicoafetivo da criança e adolescente, nem queimar etapas desse desenvolvimento, considerando que já são adultos em miniatura com plena compreensão de seu desejo, de seu corpo e de sua sexualidade. Para isso faz-se necessário sempre checar o que a criança já sabe sobre a sexualidade, quais as suas duvidas e, tendo essas informações em mãos, orientá-las de modo claro e objetivo, sem fantasias ou romantizar, nem criar medos ou limites desnecessários.
Lembro-me de dois episódios curiosos:
Um foi de ter visto um pai ou tio, vizinho na rua em que morava, mostrando revistas pornográficas para dois meninos, que deveriam ter entre 5 e 9 anos. Os meninos, obviamente, estavam curiosíssimos e excitadíssimos por serem apresentados ao mundo do homem adulto. (Eu, na época, adolescente ou já adulto, achei um absurdo!) Compreendendo que, nessa idade, ainda não seria o momento adequado para esse tipo de informação, podendo vir a despertar precocemente uma sexualidade genital ainda em processo de maturação. De todo o modo, entendo que, para um leigo, se estava a iniciar desde cedo a criança para ser “homem”, “macho” e heterossexual.
Outro fato foi minha mãe ter me dado aulas sobre o que era e como usar uma camisinha. Na época eu tinha entre 10 e 11 anos, e não me recordo se já tinha aprendido a me masturbar nem tinha tido minha primeira ejaculação. De todo o modo, na época, fiquei constrangido e um bocado surpreso com o tamanho da camisinha, em comparação ao meu pênis pré-adolescente, e, como tinha sido também educado desde cedo para priorizar os estudos em detrimento do namoro – e achava um absurdo meus coleguinhas já estarem aos “amassos” pelo colégio -, só vim a utilizar a dita cuja muitos anos depois.
Desde muito pequeno, minha mãe também me dizia para não falar com estranhos e não ir nos mictórios, usando sempre o reservado dos banheiros públicos, para evitar os “tarados”. Lembro que, apesar disso, só vi um pênis que não o meu aos 6 ou 8 anos de idade, no banheiro do estádio de futebol. Lembro que achei estranhíssimo e bem diferente do meu, tanto pelo tamanho, quanto pelo formato. De todo o modo, até hoje tenho o hábito de ir ao reservado dos banheiros públicos, e compreendo bem o que minha mãe queria dizer, referindo-se possíveis eventos de exibicionismo, atentado ao pudor e aliciamento de menores por pedófilos, ou às “pegações” de banheiro.
Nesse aspecto acho que minha mãe foi sábia, não tanto em relação à camisinha, mas em relação ao uso do reservado nos banheiros públicos e a dizer que nunca falasse com estranhos na rua. Agiu de forma preventiva contra episódios reais que acontecem de atentado ao pudor, aliciamento, exploração sexual e até sequestro de menores.
Apesar de toda essa proteção dada pelos pais zelosos, quando estes realmente estão atentos ao desenvolvimento e maturação sexual de seus filhos, não podemos negar que muitas experiências sexuais se dão de forma muito mais precoce, geralmente com pessoas próximas, outras crianças, adolescentes ou adultos. Saber disso é importante, principalmente para se evitar traumas decorrentes de abusos sexuais de crianças praticados por adultos, que muitas vezes podem ser parentes próximos, como tios e primos mais velhos, vizinhos, professores ou até mesmo pais e padrastos pedófilos.
Ao trazer essa informação não quero espalhar caos e pânico nas famílias, mas esclarecer que o abuso sexual e do aliciamento de menores é uma realidade que precisa ser encarada de frente, de forma preventiva, proativa e assertiva pelos pais e responsáveis.
Assim como há adultos com tendências sexuais que os dirige a uma preferencia sexual por crianças (pedofilia) e adolescentes (pederastia), assim como para práticas sexuais não consentidas, como o estupro e o atentado ao pudor, temos também crianças que desde muito cedo despertam para o desejo e a atração sexual por um adulto, e, um contato afetivo inicialmente inocente pode vir a se converter em um jogo de sedução para o qual o adulto deve dar limites e contenção necessários, a fim de não vir a ser enquadrado como abusador.
Na relação entre adulto e criança, o adulto é o principal responsável por dar limites à relação, quando esta ganha conotações sexuais. Os jogos sexuais entre crianças e adolescentes de idade próxima são algo normal e saudável, desde que seja devidamente monitorado e orientado pelos pais, que devem instruir seus filhos principalmente quanto à gravidez na adolescência e uso de preservativos.
A idade para essa instrução, afirmo novamente, vai depender do nível de desenvolvimento e maturação sexual da criança e adolescente – o que não necessariamente tem a ver com idade e porte físico, mas sim à curiosidade e à experimentação do próprio corpo. Creio que para as meninas, deva-se falar abertamente sobre sexo, uso de preservativos, gravidez e aborto desde a primeira menstruação, posto que, a partir daí, ela já se torna fértil e suscetível à gravidez, mesmo que fisicamente ela aparente ainda ser apenas uma criança.
Desde minha época, já se falava em gravidez na adolescência. Recordo-me de passar uma noticia no fantástico, dia de domingo, de o pai mais jovem ter 12 anos e a mãe ter 14 anos. De lá pra cá já soube de casos muito mais precoces, entre os 10 e 11 anos de idade, sendo alguns casos registrados como decorrentes de abuso sexual.
Como disse, é importante que pais e professores estejam atentos à sexualidade de seus filhos e alunos e observem principalmente os sinais comportamentais dessas mudanças corporais e psicoafetivas, que se dão, em geral, na puberdade, principalmente a partir do abandono das brincadeiras típicas de criança e adoção de comportamentos que envolvem busca por privacidade e redução da espontaneidade da criança, engajamento em comportamentos gregários de grupo, participar de festas, passar muito tempo na internet e trancar a porta do quarto. É importante que os pais estejam atentos e respeitem esses movimentos das crianças e adolescentes, mas é importante também monitorar esses comportamentos, mantendo sempre um diálogo e aberto e franco com eles.
Creio que um outro fator importante a ser considerado, e talvez um dos nossos maiores desafios, seja o tratamento desigual dado a meninos e meninas em nossa cultura, com a estimulação da sexualidade precoce deles, e a repressão e controle maior da sexualidade delas. A educação sexual, do meu ponto de vista, deve ser igualmente dirigida para meninos e meninas e, considerando-se a maturação sexual das meninas tender a ser mais precoce que a dos meninos, nutrindo principalmente as meninas de informação.
Tanto meninos quanto meninas devem ser esclarecidos quanto à questões ligadas a gravidez precoce, sobre o uso dos métodos anticoncepcionais, quanto ao uso de álcool e drogas, sobre os cuidados na prevenção de aliciamentos, abuso e exploração sexual, em especial contra a pedofilia nos meios virtuais, e, principalmente, sobre a importância do desenvolvimento de uma afetividade para além do ato sexual.
Na descoberta da sexualidade, meninos e meninas se veem dominados pelas suas reações fisiológicas de excitação e prazer e, muitas vezes, desconhecem o sentido da sexualidade para além do puro ato sexual e descarga da libido. Acredito, inclusive, que muitos adultos desenvolveram sua sexualidade tendo como principio apenas a satisfação da excitação sexual, convertendo o ato sexual a mera função de meio através do qual se chega ao gozo, ao orgasmo e à ejaculação. Pois bem, desconstruir e ressignificar essa compreensão faz-se mais do que necessário, até para se garantir uma boa saúde sexual afetiva e sem tantas cobranças quanto ao desempenho no ato sexual em si.
O sexo e a sexualidade são vias para o estabelecimento de vínculos de união e afeto. Embora, historicamente, tenha servido a fins outros, como a união entre clãs, povos e famílias, para a manutenção de alianças que iam muito além da união entre duas pessoas singulares, somente na modernidade e, principalmente, após a invenção do amor romântico é que o sexo passou a ser vivido como experiência privada, nas relações afetivas entre dois indivíduos. (Hoje, inclusive, esse modelo de pares e casal está sendo revisto, dentro das perspectivas dos relacionamentos abertos, da poligamia e do poliamor). A qualidade da relação, no entanto, não foi muito bem esclarecida e estabelecida até os dias de hoje.
O sexo não é apenas um vinculo de conjunção meramente genital, físico e carnal, mas um momento de estabelecimento de vínculos de afetividade, que inclui intimidade e entrega ao outro. Se reduzido o sexo a um mero ato de excitação, ereção e fricção entre órgãos sexuais, que finaliza em orgasmo e ejaculação, perde-se muito da sua dimensão humana e do seu potencial humanizador, que a sexualidade traz embutida em si. Os humanos não fazem sexo como outros animais – e nem mesmo alguns animais fazem sexo apenas na genitalidade, havendo todo um ritual de corte para o acasalamento -, movidos apenas pelo cio e pelo instinto de perpetuação da espécie, mas sim para o estabelecimento de trocas intimas de emoções, sentimentos, afetos e, principalmente, para o desenvolvimento de uma intimidade.
Suspeito, inclusive, que muitos casos de transtornos ligados à sexualidade, e, em especial, os relacionados a abuso e violência sexual, venham dessa educação excessivamente genital e pouco afetiva à qual submetemos crianças e jovens desde muito cedo, seja pelo ocultamento e controle excessivo, seja pelas vias de educação informais, via experiência direta ou pela pornografia.
Não educamos os meninos para o respeito ao corpo da outra pessoa, para o contato carinhoso, afetuoso e delicado, no sentido de constituição de uma intimidade. Do mesmo modo, quanto à sexualidade feminina, que embora mais familiarizadas com aspectos emocionais a afetivos, não são educadas para a consciência e o empoderamento do próprio corpo, para a assertividade e para o estabelecimento de regras e limites para que o outro seja admitido em sua intimidade.
Em meio a tentativas e erros, muitos encontros se dão “aos trancos e barrancos”, deixando às vezes dores e marcas e, nem sempre, lembranças agradáveis. Ao invés de educados para a afetividade e a intimidade, o aprendizado do sexo e a sexualidade se dá pela experimentação ou por exemplos nem sempre realistas, como os transmitidos via pornografia, ou nos discursos que estimulam uma sexualidade masculina, em sua face machista e misógina, e reprimem uma sexualidade feminina, despotencializando-a e tornando-a dependente. Isso quando tratamos apenas da sexualidade heterossexual e normativa.
Quando nos referimos à sexualidade de orientação homossexual, creio que há várias outras circunstâncias e fatores que interferem no processo. Primeiro a experiência nos jogos sexuais na infância e adolescência, que muitas vezes se dá sem muita consciência de que, nesses jogos eróticos, se está realizando experiências homossexuais. Muitos jovens criados dentro de um modelo de sexualidade heteronormativa, heterossexual e machista, vivenciam experiências homossexuais desconectadas de qualquer identificação com a identidade gay, mantendo muitas vezes relações bissexuais, assumindo socialmente a heterossexualidade e mantendo intimidade em relações sexuais ou afetivas com outros homens. Embora resguardado ainda hoje a vínculos ocultos socialmente, há muito homens, casados e pais de família que mantém relações homossexuais com amigos, parentes ou desconhecidos que conhecem em saunas, banheiros públicos e outros lugares de “pegação”. Trata-se de uma realidade pouco conhecida e estudada, mas que, certamente, traz repercussões subjetivas importantes para aquele que vive essa sexualidade e afetividade dupla.
Muitos jovens homossexuais iniciam sua sexualidade assim, com outros garotos de sua mesma idade, com primos, tios, vizinhos ou desconhecidos, ainda na infância ou na adolescência, de forma quase sempre escondida, vivenciando também experiências heterossexuais, só vindo a definirem-se definitivamente na homossexualidade na idade adulta. Outros, porém, em função da repressão sexual e da não aceitação social da homossexualidade só vem a vivenciar a sua sexualidade na idade adulta, não tendo muitas experiências prévias e sem muitos parâmetros afetivos. Em ambos os casos, a sexualidade se dá, na maioria das vezes, com uma maior ênfase dada ao sexo que à afetividade, sustentada pelo discurso de que o homem é sexualmente mais demandante e pouco fiel. Assim vai se perpetuando uma sexualidade masculina pouco afetiva e intima, centrada principalmente no sexo e nos papéis de “ativo” e “passivo” na relação.
A homossexualidade feminina, por sua vez, também acaba por sofrer as marcas das repressões sexuais dadas às mulheres, porém tende a se caracterizar por relações que envolvem um pouco mais de atenção aos vínculos de amizade e afeto, para além do apenas sexual. Socialmente é mais aceitável a demonstração de afeto entre mulheres que entre homens, de modo que a homossexualidade feminina tende a passar muitas vezes despercebida na adolescência e, socialmente, sofrer menos sanções sociais que a homossexualidade masculina – o que não significa dizer que não sofram nenhum tipo de sanção.
Não irei me delongar mais desse artigo detalhando todos os aspectos da sexualidade humana. Creio mesmo que seria impossível. Meu objetivo, no entanto, foi trazer a necessidade de repensarmos a educação sexual de crianças, jovens e adultos de modo a incluir não apenas uma compreensão cientifica acerca dos métodos contraceptivos e DSTs/AIDS, como foi transmitido a mim nos meus tempos de colegial, a uns 15 ou 20 anos atrás. Proponho como alternativa uma perspectiva que inclua a intimidade, o respeito e o cultivo da humanidade via sexualidade.
Embora devamos também tomar cuidados preventivos quanto a gravidez na adolescência e contra a exploração e abuso sexual de crianças e adolescentes, faz-se necessário uma abordagem realista e de certo modo pragmática sobre o tema, que inclua o dado concreto de que a sexualidade se inicia e se desenvolve desde muito cedo, via experimentações e jogos eróticos e sexuais, podendo envolver pessoas mais próximas dos círculos sociais nos quais estão inseridos, sendo necessário monitoramento dos adultos bem como orientações objetivas sobre o sexo, a afetividade, os benefícios e perigos de uma sexualidade precoce, bem como quanto à importância da intimidade, do respeito aos limites seus e do outro e a abertura para o reconhecimento do desejo tanto heterossexual como homossexual.
Sei que não é tarefa fácil e que a dita “revolução sexual” iniciada nos anos 60 só agora tem dado seus frutos mais consistentes, na visibilidade de questões ligadas a uma sexualidade feminina mais empoderada e às diversas sexualidades LGBTI, com suas peculiaridades e demandas de aceitação, reconhecimento e legitimação social. Muito ainda se tem a avançar nesse século XXI, tendo todos nós que lidar com resistências, retrocessos e encobrimentos. Não podemos, no entanto, deixar encoberto pelos lençóis do pudor extremado, nem encerrados entre quatro paredes um aspecto tão importante como a sexualidade, tão fundamental e constitutivo da humanidade que carece cada dia mais de afeto e intimidade. Quem sabe, a partir de uma perspectiva de educação sexual verdadeiramente pragmática, possamos tornar concreto o ideal de amor universal e humano.