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O olhar sobre o FÓRUM SOCIAL MUNDIAL





Nobilíssimos leitores soteroproseandos, o ensaio desta semana está conectado com o evento do Fórum Social Mundial, que será realizado em Salvador, entre 13 a 17 de março, com o tema: “Resistir é criar, resistir é transformar”. A leitura aqui desenvolvida é baseada no livro, Fórum Social Mundial: manual de uso, do sociólogo português, Boaventura de Sousa Santos. Inclusive, o próprio estará no evento. Boa Leitura!


Boaventura tem como objetivo trazer para o debate a chamada, sociologia das ausências, que nada mais é do que uma sociologia não convencional, anti-ortodoxa, cujo intuito é a necessidade de um novo discurso frente ao oficialismo científico. A abordagem dessa nova sociologia é resgatar atores sociais invisibilizados pela sociedade ocidental, escutando suas experiências, suas propostas, e mostrando ao mundo as novas possibilidades de compreensão da realidade.


Ao falar do discurso hegemônico, o sociólogo apresenta cinco lógicas ou modos de produção: a monocultura do saber e o rigor do saber; a monocultura do tempo linear; a monocultura da naturalização das diferenças; a monocultura do universal e do global; por fim, a monocultura dos critérios de produtividade e eficácia do capitalismo.


Em contrapartida, a esses modelos canônicos criados pela ciência, Boaventura substitui o termo monocultura (como única forma de pensar a cultura) por ecologias (diversidade de pensar a cultura). Seriam igualmente cinco as ecologias: ecologia dos saberes; ecologia das temporalidades; ecologia dos reconhecimentos; ecologia das trans-escalas, e ecologia das produtividades.


Devido ao curto tempo, apresentaremos somente a monocultura do saber e do rigor do saber, e seu contraponto: a ecologia dos saberes.


A monocultura do saber produz uma forma unilateral e linear de pensar a sociedade. É no ocidente, que esta lógica se desenvolveu, criando um pensamento universal, um modo canônico de interpretar a vida e o mundo através da lente teleológica. Tudo que estaria em desacordo com a História única, se apresenta somente como desvio. Acidente de percurso! Lixo descartável! Pois, nesta concepção não há espaço para outros olhares. Sobre a história única clique aqui.


Nessa vanguarda de pensamento, o ser humano dotado de consciência e com todo aparato biológico da espécie, é um individuo que pensa, sente e faz enquadrando-se em modos rígidos, em métodos convencionais bem delineados. Moldadas por uma cultura predeterminada, reproduzida para impulsionar um ideal de desenvolvimento científico e tecnológico, a humanidade se vê confinada a um modelo. Portanto, tudo que escapa ao padrão objetivamente elaborado pela ciência é considerado irrelevante - na etapa do “progresso humano”.


A monocultura do saber veda outras possibilidades de conhecimento; ignora diversas óticas de desenvolvimento e experiências sociais, locais e sub-locais. A proposta é visibilizar a ecologia dos saberes. Estas têm como objetivo fazer renascer outras formas de pensar a vida, a natureza, a sociedade, em suma, ressuscitar os conhecimentos desprezados pelo discurso científico hegemônico. Trazer à tona esses saberes é reconhecer que a vida em sociedade não está pautada em uma única lente, mas que há distintas experiências sociais, principalmente em países considerados subdesenvolvidos, historicamente invisibilizados pelo establish europeu e norte-americano.


A ecologia dos saberes busca descontruir o discurso dominante. Este, aponta que fora do modelo padrão científico, convencional, tudo é considerado pseudociência, pois é incompatível à evolução humana em seus diversos âmbitos. É tentando ir de encontro com essa forma de pensar, que as ecologias olham para a humanidade como um grande sistema ecológico, incluindo flora e fauna, imbuídas de diversidades. O olhar mais atento a este prisma enriquece o futuro, mesmo à custa das incertezas.


É a partir da ótica da sociologia das emergências, que Boaventura propõe que a pesquisa deve levar em consideração novas práticas sociais concretas. Estas estão inseridas nas experiências de novos saberes, povos e culturas, ainda à margem da “sabedoria universal” criada pelo Ocidente. A subjetividade dos chamados “pré-modernos” foi substituída por uma racionalidade com tendência evolutiva universal. A ciência teria se transformado em uma religião laica universal?!


A sociologia das emergências, contrapondo-se a tradicional, busca compreender todas as experiências, colocando-as no palco das possibilidades, no sentido de ajudar as pessoas na percepção de novos paradigmas ao conhecimento. Na verdade, é a necessidade de resgatar ecologias que sempre existiram, mas que foram consideradas como ausentes. É cada vez mais importante mostrar a incerteza do futuro, pois não há uma forma determinada a priori.


A proposta do Manual do Fórum Social Mundial, escrito por Boaventura, é tentar trazer as diversas experiências ou alternativas para o mundo atual. Há uma linguagem, mais ou menos comum, dos que participam e aderem ao Fórum, de que o modelo atual de sociedade precisa ser ultrapassado; sendo um outro mundo possível; um mundo melhor, claro. A questão é saber que outro mundo é este, e como será organizado.


Creio não existir no Fórum Mundial uma proposta única para um novo modelo de sociabilidade. Talvez nem haja tal modelo. O que efetivamente existe são múltiplos discursos que contestam o padrão atual – econômico, científico, político, filosófico, ambiental, cultural, artístico - seja para reformá-lo, seja para ultrapassá-lo. O que podemos ter certeza, caros leitores, é que o futuro é um grande labirinto!


Bom Fórum, e até a próxima!




Imagem: https://wsf2018.org/forum-social-mundial-2018-abre-inscricoes/

Referência: SANTOS, Boaventura de Sousa. O Fórum Social Mundial: Manual de Uso. São Paulo: Editora Cortez, 2005.


















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