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O que está por trás da greve dos caminhoneiros no Brasil

Foto do escritor: Alan RangelAlan Rangel


Neste domingo, 27 de maio, o Governo Federal cedeu as reivindicações dos caminhoneiros. Certamente alguém vai sair prejudicado, pois haverá cortes orçamentários ou aumento de impostos de algum lugar. Não esperem outra coisa! Eu e você já sabemos quem sairá prejudicado: a grande maioria da população brasileira.


Esta semana tive dificuldades de entender o conjunto de informações sobre o contextual atual brasileiro. De todos os lados há polarizações e aproveitadores da situação caótica para fins políticos, ideológicos, o nós e eles, esquerdistas x direitas, retrocesso x progresso e outras divergências. Todos, de alguma forma, mostrando que existe uma fórmula para o bem estar coletivo. A minha exposição não busca ser a solução a todos os problemas, pois não prego a verdade. Tento somente apontar para possíveis explicações – jamais a única – da nossa realidade tupiniquim. Vamos lá!


A greve dos caminhoneiros teve início no dia 21 de maio, segunda feira. Houve tentativas por parte da Confederação Nacional dos Transportes Autônomos (CNTA), no dia 15 de maio, sugerindo uma reunião com o governo federal cobrando demandas emergenciais, principalmente o congelamento de preço do Diesel sob os combustíveis, e o fim da cobrança dos pedágios sob os eixos suspensos, uma reinvindicação já posta na lei 13.103/2015, de 2 de março de 2015, conhecida como Lei do Motorista, que entre algumas alterações, propõe no Art. 17 que os veículos de transporte de cargas que circularem vazios não pagarão taxas de pedágio sobre os eixos que mantiverem suspensos. Consta que o oficio endereçado ao órgão federal, a Casa Civil, teve apoio de empresas, inclusive. A Confederação avisou a Administração que caso não fossem prestigiados para negociar as reinvindicações, eles iam paralisar exatamente no dia 21.


No decorrer desta semana, a classe patronal esteve apoiando a reinvindicação dos motoristas autônomos, pois, com a redução do Diesel, as transportadoras tenderiam a ganhar. Contudo, as Federações e entidades, sindicatos autônomos, filiados à Associação Brasileira de Caminhoneiros (ABCAM), acusaram a os empresários de só enxergar seus interesses em supostos acordos com o Governo.


Na prática, os autônomos que rodam no país são donos dos próprios caminhões e pagam seu próprio combustível. O Brasil possui uma frota de caminhões com 60% de motoristas autônomos. E mais de 60% de tudo que é transportado de mercadorias no país passa pelos veículos de cargas rodoviárias. Modais como ferrovias, aquaviários e aéreos prestam poucos serviços no que diz respeito aos alimentos e combustíveis. As ferrovias, por exemplo, servem á mineração. Se o país investisse mais neste modal, como em muitas Nações desenvolvidas, haveria menos problemas sociais. Mas o lobby de empresários do setor automobilístico sempre foi muito poderoso por aqui, sobretudo a partir dos anos 50. O Brasil é uma verdadeira fábrica de ganhar dinheiro para as empresas automobilísticas. E também está entre os 4 países que mais matam por acidente de trânsito no mundo em números absolutos. Terrível estatística!


O Governo Federal acusou a paralisação dos caminhoneiros de locaute, encabeçada por empresas, usando supostamente os empregados como massa de manobra, o que torna inconstitucional os atos. Mas as entidades de autônomos veio desmentido as acusações durante a semana em vídeos, notas e entrevistas em todos os meios possíveis.


Darei mais um passo. Há várias acusações contra a política de preços do petróleo adotada pelo presidente Michel Temer, desde o ano passado, através do atual presidente da Petrobras, Pedro Parente. Quais as mudanças? O preço do combustível ficou a mercê das flutuações diárias do mercado internacional e com a cotação do dólar. Sem um valor fixo, os preços mudam de um dia para outro, pois depende do cenário externo. Paralelo a isto, houve aumento significativo de acionistas na Petrobras, vangloriada pelo presidente.


O Brasil é o nono maior produtor de petróleo do mundo, segundo dados de 2017 da EIA (U.S. Energy Information Administration , agência de informações energéticas do governo americano). Ao o todo, possui 17 refinarias, 13 são da Petrobras. Em termos didáticos, as refinarias têm por função processar o petróleo para transformá-lo em combustível. Mas, a capacidade de refinamento tem diminuído no país, operando abaixo de seu potencial. Somos um grande país exportador de petróleo e um grande importador de derivados. Com a incapacidade e incompetência da Administração pública brasileira em organizar adequadamente as refinarias do país, o governo atual criou o plano para privatizá-las em 60%, incluindo Landulfo Alves, segunda maior refinaria do Brasil, localizada na Bahia, que perdeu cerca de 30% de sua produção durante os últimos meses. Não há interesse em melhorar as refinarias estatais ou construir mais. A lógica é a venda para grandes empresas estrangeiras.


Desde o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, com a chamada Lei do Petróleo, a Petrobras deixou de ser a única empresa responsável pela cadeia produtiva, da prospecção ao refino. O capital estrangeiro teve carta branca para explorar as reservas do país. Pórem, no que diz respeito ao refinamento do ouro negro, a empresa estatal, ou mista - a Petrobras - é soberana, quase não têm concorrentes, sobretudo por causa da intervenção do Estado. Basta dizer que ele é o maior acionista da empresa, o que resguarda o direito de indicar membros que assumem as decisões mais importantes, aparelhando a estatal.


Nos governos anteriores, o Estado regulava fortemente o preços dos combustíveis, a fim de manter valores abaixo das flutuações internacionais, segurando o aumento da inflação. Com a ex presidente Dilma, houve uma baixa de preço do produto no mercado internacional, gerando prejuízos a Petrobras, que teve seu espaço reduzido por conta das importações realizadas pelas grandes distribuidoras que compravam mais barato. Com Temer as coisas mudaram. Houve redução do subsídio praticado amplamente pelas gestões anteriores. Em tese, há uma liberdade de preço, pois aumenta a concorrência com as empresas estrangeiras e as poucas existentes no país, o que retira, em parte, maior poder da estatal no refinamento. Mas, e o consumidor final? Caminhoneiros e motoristas comuns? Estão sofrendo com a elevação de preços atualmente. Depender das flutuações do cenário internacional torna muito imprevisível os valores dos combustíveis para o bolso de todos.


Mas não para por aí. A taxação sobre o combustível é caro. Por quê? Bem, entra o imposto da ICMS (Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação), imposto estadual que varia de região; PIS (Programas de Integração Social)/COFINS(Contribuição para Financiamento da Seguridade Social), impostos federais, e o CIDE (Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico), imposto também federal. Os outros custos ficam a cargo de comercialização das distribuidoras e dos postos e revendedores, que definem livremente os preços. As distribuidoras de combustíveis e seus acionistas (as maiores são a Raízen, Ipiranga, BR Distribuidora) e donos de postos acabam tendo grandes lucros.


Todo o panorama acima deixa escapar muitos problemas que temos que resolver. O discurso do governo é de que o país não pode diminuir os tributos. Não pode? Como se explica que até junho do ano passado, o governo federal apresentou uma quantidade de cargos comissionados e de funções de confiança e gratificações em 99.817? Quase 100 mil! Salários que variam entre RS 2,467,90 a 15.479, 92 reais. Nem estamos contabilizando os absurdos dos estados e municípios brasileiros. A enorme quantidade de cargos comissionados não é novidade no governo atual, ela vem crescendo desde Lula. O resultado disso é aparelhamento da máquina pública, e aumento de emprego para apadrinhados e afiliados. Os critérios são cada vez menos técnicos e mais partidários. Por isso é urgentíssima uma Reforma do funcionalismo público, enxugando o Estado, a fim de reduzir os gastos.


Além disso, temos um dos mais caros judiciários do mundo, incluindo salários, penduricalhos e início de carreira, com gasto de 1,4% do PIB, 3,5% mais caro que na Alemanha, por exemplo. Quer mais? Somos também um dos países que mais gastam com parlamentares, o que inclui salários, cotão, auxilio moradia, verbas para contratar até 25 funcionários, ajudas de custo, plano de saúde, carro oficial. Só para se ter uma ideia, gasta-se 1 bilhão por ano com deputados federais. Pagamos a conta com nosso dinheiro!


É necessário também a Reforma Tributária, pois a nossa taxação incide mais em tributos indiretos (consumo) no que os indiretos (renda). Quem ganha mais - a minoria dos brasileiros - paga pouco em relação a renda. Por isso que no Brasil o tributo é regressivo. Vamos aos dados da OXFAM: os mais pobres pagam 32% do que recebem em tributos; os 10% mais ricos pagam apenas 21%; o mesmo vale para impostos indiretos (produtos e serviços): os pobres pagam 28% do que ganham e o rico apenas 10%. Na prática, os desfavorecidos saem perdendo porque praticamente todo seu salário é gasto com produtos e serviços. A taxação sobre lucros e dividendos no país é muito baixa. A alíquota efetiva no Brasil isenta todos aqueles que ultrapassaram o teto de 40 salários mínimos no Imposto de Renda. Os mais privilegiados economicamente são beneficiados e deixam de pagar impostos sobre propriedade, urbana ou rural, renda, ganhos de capital e herança. Uma realidade injusta comparado aos mais pobres. O dinheiro arrecadado poderia ser investido em politicas de saúde, educação, emprego. E nem vou comentar sobre as enormes desonerações tributárias realizada nos últimos governos, privilegiando setores privados, como agronegócios e rentistas. Também não podemos esquecer da incapacidade do Estado de fiscalizar os crimes de sonegação realizadas por pessoas físicas e jurídicas.


Toda essa herança se abate sobre todos nós. Nossos representantes brasileiros enxergam o Estado como um mar de privilégios, patrimônio privado, um lote de terra a ser repartido com seus pares. A população é encarada como súditos, destituídos de espírito de cidadania democrática e aliança, que deveria lutar - conjuntamente - pelo desenvolvimento social, econômico e político do país. A suposta efetivação da República, dos direitos civis, políticos e sociais, na prática parece só atingir a pele, pois não consegue adentrar aos tecidos e órgãos.


É um problema de esquerda, direita ou seja lá que direção for? É uma patologia que ultrapassa as camisas ideológicas e políticas! Existe uma lógica que perdura no Estado, que é da capacidade de atrair todas as direções para si. É uma raiz cultural ou de classe? Tem para todos os gostos. Tanto um como outro estão no mesmo cesto. Muito antes da fundação do país como Nação, sempre existiu exclusão e marginalização da sociedade. Todo o trajeto do Brasil foi feita de cima para baixo, desde tempos coloniais. A lógica por aqui não escapou de uma preservação de casta, que, no fim das contas, marginaliza os que estão fora do esquema de compadrio, clientelismo, de promiscuidade, que sempre envolveu Estado brasileiro e o grande Mercado destituído de qualquer espírito liberal e democrático.


Link da imagem: https://www.topimagens.com/imagem/1281






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