Recentemente, em uma coletiva, o governador eleito do Rio de Janeiro Wilson Witzel do Partido Social Cristão (PSC), afirmou que pretende treinar snipers – atiradores de elite da polícia – para atirar em bandidos que estejam portando fuzis nas ruas do estado. “A polícia vai fazer o correto. Vai mirar na cabecinha e... Fogo! Pra não ter erro”, falou o eleito. É uma das medidas para conter a violência desmedida que ocorre principalmente na Cidade Maravilhosa.
Não é necessário frisar que uma frase dessas não assusta muita gente, principalmente quem foi às urnas no último mês de outubro para eleger seus representantes. A apuração revelou a vitória de parlamentares e governadores que se apoiaram no discurso da resolução dos crimes urbanos que assolam as grandes cidades. Variadas patentes militares nominam os novos deputados, muitos deles neófitos na política. Portanto, uma declaração dessa está mais para um grito de gol que uma cara de espanto.
Sabemos que o domínio de facções criminosas vem provocando uma sucessão de assaltos, sequestros, explosões de caixas eletrônicos, tiroteios e assassinatos em profusão. E que muitos desses meliantes não levam muito tempo encarcerados, provocando uma onda de reincidência constante. A população assustada e sem poder andar tranquila nas ruas, solicita um “basta” homologando eleitoralmente uma série de pretensos especialistas em segurança pública ou que tem nos planos de atuação um rígido combate a atuação desses malfeitores. Logo, não admira que reações de estupefação sejam raras.
Não há detalhes de como essa ação proposta pelo governador que irá assumir em janeiro próximo será executada (sem trocadilho). Onde os policiais irão se posicionar, por quanto tempo, e em quais comunidades. Mas algo está claro: a população onde os fuzilados estarão presentes vai ter que assistir as balas flutuantes e os corpos estirados no chão. Nenhuma novidade no cotidiano delas. Operações ostensivas e repressoras são parte do dia-a-dia, muitas vezes com inocentes pagando a conta desse tipo de combate. Mas quem não mora lá, não tem esse sentimento de perda tão marcante. O automóvel financiado que foi roubado é a comoção maior. Quem aplaude a viagem de um projetil de fuzil rumo a uma carne provavelmente negra, nega a dureza de viver em um ambiente social rodeado de mazelas por todos os lados. Não é de hoje que “bandido bom é bandido morto”, isso vem de outros carnavais. Porém, pode estar havendo um alinhamento de maiores proporções entre milhões de cidadãos, aumentando a aprovação de medidas mais duras e um enraizamento da naturalização do extermínio e da extirpação de cidadãos mal conceituados. Ou seja, a bandidagem está apenas na linha de frente. O embrutecimento das ideias segmentadas atinge outras minorias desguarnecidas. Dar guarida à linguagens enfurecidas de representantes políticos escondem preconceitos engavetados nos armários da consciência humana.
Por via da bala, pessoas com fuzil e congêneres. Mas o fã-clube dos desvairados do poder não teriam dificuldades de se calar diante de outros aniquilamentos – não necessariamente com disparos. Integrantes de grupos sem-terra; sem tetos; travestis; feministas; ideólogos da esquerda. Qualquer iniciativa que faça calar ou enfraquecer indivíduos “inimigos” será respondida com silêncios sorridentes ou indiferença. Isso porque graça em nossa sociedade movimentos preocupantes. Ainda fatos isolados, mas que tem potencial de disseminação, visto a fragilidade mental imperativa que considera urgente o resguardo de valores que venham a se deteriorar. Olhares de soslaio vem sendo lançados a negros, homossexuais e pessoas com deficiência. Acossamento de professores, ameaça de estupros, extinção de cotas raciais, obstáculos para identificação de trabalho escravo; renúncia a direitos trabalhistas. Indicadores de uma vulnerabilidade social que empodera aqueles que montam em seus privilégios e meios de oprimir ainda mais os desprestigiados. As mensagens contém um teor as vezes implícito, por vezes explicito, de desagregação coletiva. Não comtemplo como pode haver um bom governo com a expectativa triunfante de uma ruína da unidade nacional. Matar, em sentido polissêmico, é sinônimo de liberdade civil? Chegou a hora da independência a ferro e fogo? Com acenos aos mandatários do domínio econômico?
Voltando ao plano em desbaratar o crime organizado na capital fluminense, as balas matam pessoas, mas não as armas. Que garantias há que aquele que carrega o fuzil é um marginal? Não pode ser um trabalhador ou líder comunitário desafeto da quadrilha a ser utilizado como cobaia? Não pensam que haverá novas logísticas de enfrentamento aos calibres policiais? Não há corrupção de agentes públicos para que armamentos cheguem até favelas dominadas? Milicianos armados também serão abatidos? Pouco importa as reações advindas ou respostas a questionamentos. Pobres há aos montes e, como já afirmaram certa vez, “se morrer alguns inocentes, não tem problema”. Parcelas da população “lava as mãos”. Só não sabemos como vai ser quando começar a faltar água para essa higiene social.
FONTE:
https://veja.abril.com.br/politica/wilson-witzel-a-policia-vai-mirar-na-cabecinha-e-fogo/
http://pastorjamesjanssenblogspotcom.blogspot.com/2013/ (imagem)