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JULIETA: do subsolo a superfície


Recentemente assisti Julieta, do diretor Pedro Almodovár, lançado em 2016. Confesso que levei algum tempo para assistir, mas felizmente o fiz. A longa-metragem aborda, em termos gerais, os sentimentos e relacionamentos femininos. Mas tentarei mostrar que o conteúdo vai muito além: trata das próprias vivências do ser humano, independente da sua condição. O objetivo é trazer uma breve reflexão acerca do tema, e, claro, apresentar uma boa dica de filme. Boa Leitura!


A personagem principal, Julieta, interpretada por Adriana Ugarte/Emma Suárez, em duas fases distintas da história, é uma mulher com mais de 50 anos que aparece logo no início do filme, como se a vida estivesse bem, como se não houvesse nada para dar margem à rachaduras aparentes. Ela possuía uma bela casa, um namorado atencioso e tinha uma viagem marcada para Portugal. Contudo, um evento inesperado, coisas do acaso, da gratuidade da vida, leva-a ao despertar de um trauma "esquecido". É exatamente esse mergulho às profundezas da consciência que o diretor vai explorar. Seremos guiados pelos segredos, aparentemente inexistentes, da protagonista.


Pouco a pouco Almodóvar vai nos guiando a uma espécie de autoanálise psicanalítica de Julieta, aos relacionamentos que tivera outrora, incluindo casos de morte. Tal dimensão leva-nos ao subsolo da personagem, e assim somos afetados pelas angústias, não tão incomuns á vida ordinária.


Não estamos imunes aos desastres, às perdas, aos golpes inesperados da existência! Podemos ter uma vida aparentemente sem tribulações, sem grandes dificuldades, e, de repente, o destino nos prega uma grande peça que desestrutura a nossa "inquestionável segurança ontológica", ruindo os alicerces que pareciam sólidos. Ou será que nossos alicerces nunca são firmes o suficiente e basta um prego fora do lugar para um terrível desmoronamento? Seja como for, existem dois típicos comportamentos que, geralmente, as pessoas podem ter frente às tragédias inesperadas: superar de forma tranquila, consciente, pois entende que o acaso é algo incontrolável e, portanto, estamos todos a mercê dele; ou simplesmente sucumbimos, não aceitamos a perda, daí o sofrimento que se arrasta para a depressão, suicídio ou melancolia.


Numa perspectiva freudiana, o filme convida a pensar que não podemos antever determinados sentimentos e atitudes em acontecimentos não experenciados; ninguém é totalmente consciente de como irá reagir à alguns fatos incomuns, estranhos às rotinas. Por exemplo, na prática, não sabemos como iremos reagir quando um ente querido falece, mesmo que tenhamos conhecimento teórico sobre as reações de pessoas que passaram por grandes perdas. Eis um fato: nunca teremos a real compreensão, sensação e dimensão da perda mais do que a própria pessoa! E é exatamente essa camada mais profunda que o filme deseja passar.


Nobilíssimos, não é um dos melhores filmes do ilustre diretor espanhol, que já produziu A Pele que Habito, Tudo sobre a Minha Mãe ou mesmo Volver, mas certamente é uma obra que vale muito a pena: retrata causas e consequências psicológicas nas quais não estamos imunes. Não tem tanto suspense quanto os filmes anteriores, mas, ainda assim, consegue nos envolver por uma inquietante reviravolta. Sem spoilers ( risos).


Até a próxima!


Link da imagem : http://www.adrianabalreira.com/2016/08/julieta-filme-do-almodovar.html


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