Desde as investigações da Lava Jato, uma série de discussões com foco na forma de se fazer política vem sendo destacadas. Candidatura avulsa, a importância de emendas constitucionais, financiamento de campanhas... A sociedade civil e a opinião pública vêm cobrando mudanças significativas para que o contribuinte não arque com a manutenção da classe política no poder. O debate é bem-vindo, mas há uma série de lacunas que devem ser bem escrutinadas, pois as argumentações variam de acordo com o espectro ideológico de quem defende – por exemplo – o fim dos fundos partidário e eleitoral.
O Fundo Partidário é resultado de várias fontes, a saber, de multas judiciárias, recursos da União, e doação de pessoas físicas, garantidos por lei e distribuídos aos partidos de acordo com o tamanho das bancadas no Congresso (divisão proporcional). O Fundo Eleitoral é específico para financiamento de campanhas e oriundo de dotações orçamentárias da União, ou seja, recursos públicos. A eliminação total desses fundos é defendida por algumas legendas e parlamentares veteranos e neófitos. E por boa parte da população também. O senador Cristovam Buarque (Cidadania-DF) já apresentou Projeto de Lei para acabar com o Fundo Partidário. A proposta não avançou e está parada na Comissão de Constituição e Justiça.
A principal alegação é a economia de gastos, fazendo com que os partidos se sustentem com a contribuição de seus filiados e simpatizantes. Quanto ao Fundo Eleitoral, há previsão de gastos entre R$ 2,5 e R$ 3,7 bilhões, o que irrita boa parte dos contribuintes. Vários parlamentares contestam esse valor. Afinal, há fundamentos para o fim dos fundos?
Acredito que é legitimo contestar gastos públicos em períodos bicudos. Mas também devemos pensar em diversas situações que tornam a questão um pouco mais complexa do que parece. No último pleito, foram eleitos vários parlamentares que prestaram contas com baixíssimo orçamento nos gastos de campanha. As redes sociais foram vetores na difusão de nomes notórios que conquistaram vagas nas Assembleias Legislativas e no Congresso Nacional. Muitos se apropriaram do fato de terem conquistado seguidores em suas mídias, aparições em programas de rádio e TV, e vários deles defendem a extinção dos fundos (e alguns deles defendem a candidatura autônoma, sem filiação partidária). Grande parte é oriunda de movimentos de rua e de renovação política, custeados por Think Thanks e múltiplos investimentos empresariais. Para eles, fica fácil sustentar um discurso de autofinanciamento. Essa forma de sustentabilidade é para todos?
Não, não é. Existem variadas formas de construção de coletividades e com dificuldades em se manter. Grupos geralmente formam lideranças, mas com alcances limitados. Como movimentos rurais e agrícolas conseguem verter fundos para ampliação de suas metas, se a prioridade de muitos filiados é a própria sobrevivência? E os professores? Muitos tem baixa remuneração e as lutas pela qualidade da educação são cotidianas, sem tanta visibilidade para conquistar simpatizantes. Categorias cuja representação vem se desmantelando (industriais, comerciários, servidores públicos, carteiros, etc.) com a constante fragmentação das forças sindicais e redução de benefícios, não obtém financiamentos de suas atividades eleitorais com facilidade. Muitas vezes, combatem ideologicamente aqueles que poderiam lhes custear. Os fundos existem para democratizar o acesso de variados grupos pertencentes a estamentos sociais diversos e conflitantes.
Nem todo eleitor possui redes sociais para seguir seus postulantes a cargos públicos. Em pequenos municípios, a aproximação pode ser mais fluida. Mas em grandes cidades carece de maior divulgação. Sem falar que muitos movimentos oriundos das redes sociais são constantemente acusados de propagar fake news, o que dinamiza a ojeriza a seus adversários, influenciando votos de um eleitor que historicamente é bastante volátil, mas vem criando apego àqueles que tem como bandeira a redução drástica dos gastos públicos. O que facilita esse cenário é o crescimento de candidaturas autossustentáveis, de empresários e profissionais liberais. Segundo dados do TSE, 10,3% dos postulantes se declararam empresários. Obviamente, o panorama favorece quem pode bancar sua própria disputa à vaga.
Se há algo que talvez seja positivo em findar financiamentos advindos do erário público é a dificuldade de eleição de “caciques” partidários, acostumados que eram com as doações empresariais, proibidas por lei, geradoras de propinas e caixa 2. Outra discussão paralela a esse debate é a reforma política, que pode estabelecer o voto distrital, onde há um limite geográfico para atuação do postulante e assim maior concentração e acesso ao eleitor. No entanto, existem variáveis a serem consideradas para eliminação total dos recursos de campanha. Resta saber se há fundamento em apreciá-las ou não.
FONTES:
https://nataliafoliveira.jusbrasil.com.br/artigos/564789141/qual-a-diferenca-entre-fundo-partidario-e-fundo-eleitoral
https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2017/07/21/proposta-que-acaba-com-o-fundo-partidario-aguarda-indicacao-de-relator-na-ccj
https://oglobo.globo.com/brasil/orcamento-preve-25-bi-para-fundo-eleitoral-em-2020-23922306
https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2018/eleicao-em-numeros/noticia/2018/08/25/candidatos-empresarios-e-advogados-crescem-nas-eleicoes-2018-numero-de-servidores-publicos-vereadores-e-donas-de-casa-cai.ghtml
Fonte da Imgaem: Jornal do Commercio