Muitos sabem que o mundo passa por convulsões políticas. Em alguns países, populações protestam por mudanças significativas na estrutura social e econômica. Por outro lado, há também um clima de xenofobia, racismo, opressões étnicas que assolam nações governadas por gestores que, eleitos, endossam medidas anti-imigração. Todo esse clima é sentido pela classe artística, que elabora significados e recortes dessas realidades. E assim, surgem séries como “Nós Somos A Onda”, disponível na Netflix, retratando o antigo desejo de lutar contra “o sistema”. É baseada no filme “A Onda”, de 2008.
O cenário é a cidade alemã de Mapplesped e sua juventude ociosa em fase pré-universitária. Na escola local, a interação entre os estudantes se altera com a presença de um novo aluno, cuja origem é desconhecida. Com seu jeito cativante, ele agrega em torno de si colegas que não eram próximos, e que apresentam problemas familiares, são vítimas de bullying, sofrem preconceitos étnicos e até uma “patricinha”. Com a formação do grupo, passam a contestar as agruras e martírios e articulam reações às opressões suportadas. Verificando o sucesso das empreitadas, denominam-se “A Onda” e passam a agir contra segmentos dominantes da sociedade, chamando atenção da polícia, da imprensa, e demais adolescentes. O que era um projeto de ataque a instituições e pessoas que não respeitam direitos alheios, passa também a atingir símbolos que representam poder e são antipatizados por alguns integrantes, gerando dúvidas sobre os reais objetivos da trupe.
Além da confusão entre refletir o que traduz um perigo macro e uma aversão a um modelo de classe – típico de pessoas em faixa etária transitória – a série aponta como pano de fundo o recrudescimento do nacionalismo europeu, ainda mais na Alemanha, país emblemático no surgimento de sentimentos antissemitas que culminaram em um regime nazista que provocou guerras e genocídios. E como o vai e vem da História evidencia mais ou menos ressentimentos conformados em seus respectivos contextos. No entanto, o eixo da série, a meu ver, é o inconformismo com os valores morais, a concentração de fortunas, a falta de lideranças, perspectivas frustradas, e uma insatisfação generalizada com normas e conceitos ultrapassados, ao mesmo tempo que a inovação tecnológica empurra para as margens aqueles que não conseguem se adaptar ou se inserir nas transformações que essas inovações projetam para o futuro do mercado de trabalho.
A série é curta e dividida em seis capítulos, não sabendo se haverá uma segunda temporada. “Nós Somos A Onda” é o reflexo de uma geração que age e provoca, mesmo sem saber ao certo se o potencial de suas práticas pode abolir os velhos hábitos do “sistema” ou apenas o reforça.