O Tribunal Regional Federal de Porto Alegre (TRF4), segunda instância dos condenados da Operação Lava Jato, manteve a condenação do ex-presidente Lula. Isso significa muito para o enraizamento da Lava Jato, que virou praticamente uma corte dentro da justiça brasileira.
Desde que a Operação teve início em 2014, setores da sociedade vem endossando seus atos após uma série de prisões de ricos empresários e figuras políticas de alto gabarito. No vácuo de protestos gerados por melhorias dos serviços públicos, a Operação desvendou um esquema gigantesco de desvios envolvendo políticos, empreiteiros, funcionários públicos, doleiros, e apaniguados do governo, projetando no cenário nacional juízes e procuradores tratados como redentores. E aí começam os problemas.
Apesar do sucesso em desativar os frequentes saques ao dinheiro do contribuinte e garantir o retorno aos cofres públicos – o grande benefício - houve um bombardeio midiático louvando as ações, o que fez com que as instituições se moldassem perante os anseios de seus integrantes, os novos heróis nacionais. Em razão do vazamento de áudios a uma emissora de TV, o ex-presidente Lula foi impedido de ser ministro. O STF, em 2016, autorizou a prisão em segunda instância, atendendo aos desejos da LJ, para acelerar as condenações. O juiz Sergio Moro virou uma espécie de Midas: o que ele tocava, não virava ouro, mas todas as suas ações foram hipervalorizadas. Passou a ser pouco questionado. Boa parte da opinião pública evitava exercer qualquer crítica que fosse. Uma parcela da população adotou o discurso e enfatizou o fenômeno. Moro continua sendo blindado por qualquer atitude que tome.
O instituto da delação premiada deu fôlego às prisões. Essa negociação, onde o delator apresenta ou não provas contra um comparsa no crime descoberto, foi o principal expediente para a execução das penas. Acontece que a delação serviria para dinamizar investigações, porém, muitos foram condenados apenas com a descrição verbal dos fatos, sem no entanto, encontrarem a materialidade dos crimes. Em muitos casos, a prova testemunhal foi conclusiva, sem ir adiante uma investigação mais aprofundada. Alguns réus foram absolvidos na segunda instância justamente por terem como prova de culpa a palavra do delator! Maioria dos delatados são agentes políticos, o gerou uma criminalização da política. “Combate à corrupção” virou um jargão, mais associado a parlamentares e membros do executivo. A Operação desmantelou o conluio entre Capital e Estado, contudo, a classe política arcou com a ojeriza. Funcionários da Petrobras devolveram centenas de milhões aos cofres públicos. Um deles, Pedro Barusco, entregou sozinho 100 milhões de dólares! Mas se passar na rua ninguém sabe quem é...
Passada as eleições e a euforia do seu início avassalador, a Operação perdeu um pouco a força após uma proposta, a qual seus membros tornariam perene seus ideais formando uma fundação independente que administraria 1,25 bilhão de real proveniente de parte dos recursos recuperados. E levou um baque tremendo após vazamentos do site The Intercept que revelou conluios entre a Vara de Curitiba e os procuradores do Ministério Público. Ao invés do proveito para escrutínio dos vícios da Operação, travou-se uma batalha contra quem planejava “melar” seus objetivos, proporcionada por analistas políticos, jornalistas, deputados, e juristas, conhecidos como “lavajatistas”, tal o grau de passionalidade nas arguições dessa turma, sinal que uma operação jurídica redundou em ideologia.
Com a decisão do TRF4 em manter a condenação de Lula, cria-se uma saia justa com o Supremo Tribunal Federal. É que o STF, através da Segunda Turma, anulou uma sentença após o réu – Aldemir Bendine – afirmar que foi obrigado a apresentar sua alegação final ao mesmo tempo que o delator, ou seja, o prazo final de defesa foi o mesmo para delator e delatado. O Ministério Público Federal havia pedido anulação da sentença de Lula pelo mesmo motivo, mas voltou atrás declarando que o fundamento utilizado não era mais válido! E assim prosseguiu o processo que culminou no aumento de pena do ex-presidente. Com isso, o TRF4 “peita” o STF praticamente expondo quem de fato detém as rédeas do ordenamento jurídico: A Operação Lava Jato e seu corpo atuante, recebendo os aplausos de segmentos da sociedade e opinião pública. O TRF4 não era obrigado a seguir a regra que foi estipulada pelo STF no caso Bendine, contudo, expõe o Supremo, que tem sido pressionado a corresponder às vontades populares e instado a incertezas constitucionais, causando uma vulnerabilidade da Corte. A prisão em segunda instância tramita no Congresso atendendo aos caprichos de membros da Lava Jato. Um divisor de águas e tanto.
A Lava Jato tornou-se quase que um time de futebol, quando um torcedor vai se tornando fanático e faz vista grossa para um pênalti mal marcado para seu time ou quando o mesmo faz um gol em nítido impedimento. Como a equipe avança na tabela rumo ao título, vale mais a emoção de gozar com o adversário. Brigas já ocorreram em virtude da defesa cega da Operação, tal qual torcidas organizadas. E assim o campeonato vai seguindo. Porém, somente o árbitro pode levantar a taça. Ou não...
FONTE:
https://www.conjur.com.br/2019-nov-21/procurador-muda-posicionamento-acusa-defesa-lula-ma-fe
https://www.brasil247.com/blog/trf-4-peita-supremo
https://www.conjur.com.br/2019-ago-27/turma-stf-anula-sentenca-moro-aldemir-bendine
https://jus.com.br/artigos/46491/delacao-premiada
Imagem: oantagonista.