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Sejamos conservadores para defender as instituições vigentes

Foto do escritor: Alan RangelAlan Rangel

Atualmente, temos visto inúmeras disputas ideológicas no Brasil e alhures, de que existe uma luta interminável entre direita e esquerda no campo político e cultural. Mas, na verdade, a chave conceitual mais realista é entre democracia e autoritarismo . O texto a seguir é uma continuação do anterior.


Os apoiadores incondicionais da democracia, que não é o povo, sinto-lhes informar, mas minorais em diversas áreas da sociedade, entendem que há vários problemas na relação entre representante e representado, classe dirigente e classe dirigida, em termos de responsividade e prestação de contas aos cidadãos; os democratas aceitam que há déficits de políticas públicas eficientes, mas, ainda assim, acreditam nas regras do jogo, nas instituições vigentes; é o melhor dos piores regimes.


Já os autoritários desacreditam nas instituições liberais, como a separação de poderes e a defesa das liberdades civis. São favoráveis a uma nova forma de governo; aceitam o desmonte e cerceamento dos poderes independentes; aprovam ações de lideranças sem freios e contrapesos, considerados virtuosos moralmente, supostamente esclarecidos sobre os reais problemas da sociedade. Essa nova elite teria por missão enfrentar a desordem e reconstruir uma verdadeira pátria, escutando a voz do povo. Aos seus olhos, há uma desordem latente, que teria uma causa clara: a elite esquerdista/progressista/globalista hegemônica. Lutam contra o Estado Democrático de Direito e atacam os valores liberais e democráticos na arte, cultura, ciência, educação, política.


O diagnóstico geral dessas minorias organizadas, capazes de disseminar suas ideias de uma forma extremamente eficaz, utilizando a internet, muitas vez coma indústria de fake news, é que o Brasil entrou num lamaçal e só uma mão de ferro é capaz de extirpar ou expurgar os males abundantes (os defensores de direitos humanos, da liberdade sexual, de gênero, religião, imprensa, meio ambiente) e colocar o país em um eixo correto (seja lá o que isso signifique). Não têm vergonha de aceitar teorias conspiratórias; acolhem a tese de um satânico projeto comunista/socialista/globalista que estaria por trás de homogeneizar a cultura, a imprensa, a arte e a política. Tal projeto, segundo seus gurus e apoiadores de plantão, teria por objetivo tomar posse do Estado e impor um modelo universal contrário à família tradicional, ao patriarcalismo, a heterossexualidade, ao capitalismo, ao militarismo, a nação e os valores da comunidade cristã.


Os amantes do autoritarismo, de populistas a autoritários, sentem que o estado civil é caótico, desprovido de uma hierarquia rígida capaz de suprimir o reino anômalo da liberdade e dar-lhes mais segurança. Neste diagnóstico, é necessário o líder segurando a espada em uma mão e a bíblia na outra, capaz de dar uma unidade essencial ao povo.


O pensamento autoritário em voga no Brasil, e alguns países afora, anseia não por tentar melhorar as instituições vigentes, mas em destruí-las, sim, troca-las por outras, pois o que a modernidade criou e disseminou ao ocidente não teria sido benéfico suficiente para trazer robustez, solidez e segurança ao indivíduo e a sociedade. Preferem recomeçar do que a continuar vivendo numa insegurança secular.


A revolução iluminista, liberal, científica, racionalista, burguesa, democrática e social (considerada por eles com conotação socialista), ao modificar, lentamente, os pilares anteriores do Antigo Regime, calçadas numa estrutura rígida aristocrata, imbuídos de valores tradicionais/religiosos milenares, de valorização da arte sacra e do império da fé sobre a racionalidade, teria falhado ou já nasceu decadente. O grande sonho dos defensores do autoritarismo, leia-se reacionários, extremistas de esquerda, é resgatar um modelo de existência que teria sido solapado pela laicização e racionalização do mundo, da infâmia ascensão da ciência e o afastamento da religião no direcionamento da política e da moral.


Nobres leitores, a grande questão hoje é quem é a favor da manutenção do Estado Democrático de Direito e quem não é. Quem defende práticas autoritárias e quem é contra. Quem defende as liberdades civis, políticas e sociais versus quem defende autoritarismo (ditadura, autocracia, monarquia absolutista, totalitarismo). Democracias liberais podem ruir gradativamente, com uso das próprias normas legais, e não mais unicamente por golpes ou revoluções militares.


Ao meu ver, a disputa entre esquerda e direita, nos últimos anos, no cenário nacional, desde a redemocratização no Brasil, concentrado principalmente entre PT e PSDB e suas bases de apoio, estava dentro do jogo democrático. A disputa era sobre mais ou menos Estado, mais ou menos mercado, quais políticas públicas eram prioridades, quais projetos eram mais urgentes, que demandas deveriam ser respondidas de forma mais imediata a população. Com a crise econômica, política, segurança pública, e os vários casos de desvios de dinheiro público entre partidos, políticos e empresários, houve uma enorme descrença nos sociais democratas e liberais.


É importante destacar, em caixa alta, que boa parte da imprensa, do judiciário, dos políticos, empresários embarcaram na onda anti-establishment e foram responsáveis pelo espírito da antipolítica, da polarização extrema (com traços psicológicos envolvidos) e da intolerância, exacerbando o anti-democratismo de massa. Essa onda foi capaz de colocar alguém que defende tortura, fechamento do Congresso[1], imprensa cerceada, militarização da sociedade, excludente de ilicitude e contrário aos direitos humanos e pautas de minorias (a minoria deve se curvar à maioria).​


Hoje, a extrema direita é quem dá as cartas no governo federal e em alguns estados, apoiado por aqueles que não viam outra alternativa política, e por vários atores e militantes, antigos e novos, organizados que têm total desprezo pelo Estado de Direito, pela classe política, partidos, imprensa e apoiam cegamente práticas autoritárias, como método político de desmonte e criador de conflitos permanente.


Sejamos conservadores e prudentes (por princípio ou sobrevivência) para defender e lutar pela manutenção das instituições republicanas, os valores democráticos e liberais, com todas as suas dificuldades factuais de promover igualdade, liberdade e justiça. Mesmo você que é anticapitalista, que não acredita na distribuição do sistema de produção econômica, ou você que não acredita no modelo da meritocracia liberal, te convido a defender o que temos atualmente. Não é o melhor dos mundos, mas... é o que há.


O único caminho crível na melhoria do sistema político e da sociedade (tão desigual e injusta como a nossa) são as reformas lentas e graduais, com envolvimento da sociedade (movimentos sociais, associações populares, imprensa, academia, artistas) junto à classe dos representantes políticos. Sempre com diálogo, tolerância, respeito às leis e as divergências sociais, que fazem parte do jogo democrático. O contrário disso tudo é barbárie: repressão da liberdade, perseguição aos opositores e minorias e simplificação tosca da realidade.



Fonte: http://www.kaleydos.com.br/plataforma-ira-reunir-conteudo-pedagogico-de-educacao-para-cidadania/


[1] https://www.youtube.com/watch?v=gu6-ZZ1dTzk

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