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Foto do escritorEquipe Soteroprosa

BACIAS HIDROGRÁFICAS DO RECÔNCAVO NORTE/INHAMBUPE

* Por Miguel Angel Polino

A literatura considera que os diferentes problemas entre a gestão de um recurso natural finito (Água Bruta) e os segmentos da sociedade que fazem parte da discussão do tema são similares em muitas regiões do mundo, cada um com seus respectivos desafios e particularidades na gestão. Agentes se articulam, aproximam e se relacionam de forma participativa institucionalizada com interesses distintos no intuito de colaborar ou formular políticas públicas em seus diversos usos e associadas a eventuais períodos de falta de água, distribuição muito irregular, aumento de demanda, perda nas tubulações, degradação do meio ambiente, sazonalidade das chuvas, etc.; assim, o caminho fica livre para infinidade de problemas e uma subjetividade importante que termina em disputas acirradas nos levando a pensar o pouco que sabemos sobre comportamentos de agentes institucionais. Na sociologia, o conceito mais adequado para o entendimento desta questão é o de “conflito”.


Na conjuntura atual, em que o modelo de regulação na bacia que concentra a maior reserva de água doce do Litoral Norte da Bahia (BHRN/I)[1] continua em ascensão, a pauta dos princípios e instrumentos é especificamente privada se sobrepondo aos tradicionais instrumentos de comando e controle; o esforço realizado em implementar a gestão da água não tem sido suficiente para equilibrar o quadro de degradação e escassez que se suscita nas classes menos favorecidas do rural e do urbano. Esta fragilidade das instâncias participativas nos processos de tomada de decisão somada à flexibilização dos instrumentos de planejamento e à subordinação destes aos instrumentos econômicos tem atiçado as condições para o efetivo direito à água e à sua gestão; desta forma, no campo da regulação, não somente por intermédio da luta política e jurídica, o público e o privado resolverão os conflitos em torno dos princípios que consideram água bruta como um bem público dotado de valor econômico. Na bacia em questão, as injustiças causadas pela atividade econômica desafiam a regulação das águas como meio efetivo capaz de promover a concentração social em termos dos diversos usos e dos significados do seu acesso para a manutenção de modos diversos de vida.


Os problemas a surgirem em detrimento do avanço no contexto, envolvendo condutas de resistência, em geral participativas, para garantir o acesso, apropriação, uso e distribuição da água contra a construção de infraestruturas hídricas em benefício político, contrarias a mazelas de pequenos proprietários, povoados e assentamentos rurais que clamam por soluções duradoura de metas e pactos, (Lopes Meirelles, Hely e Fabricio Motta, 2016).


A bacia em questão, é um território extenso e complexo, com diferenças marcantes nas características geográficas, étnicas, sociais e econômicas entre as dez bacias contiguas, onde atores sociais de cada local fazem parte, de maneira imperceptível, de uma complexa inter-relação conflituosa diante de nichos de oportunidades desenvolvimentistas de setores ligados ao mercado. A força política das decisões sobre o uso das águas na bacia, se transforma em conflitos desafiadores de processos técnicos adotados pelos órgãos institucionais, por não terem capacidade de equacionar realmente o problema da má distribuição, ou por encobrirem o real motivo das contradições entre os distintos interesses de uso das águas, levando o gerenciamento a ser constituído na linha de condições da falta da mesma por perdas ou por deterioração poluidora, impactando fortes interesses industriais [2]. Esta lógica, tem se seguido a expansão do desenvolvimento econômico no avanço de empreendimentos de diferentes tipos tentando manter o alto PIB sem incluir, neste contexto, a integração social das classes mais vulneráveis da BHRN/I. Estes conflitos denunciados através de discursos genéricos, associados ao direito dos consumidores, ao exemplo de áreas urbanas, tem sido pauta de OSCs consolidadas como agentes nos arranjos institucionais - Movimento por Atingidos por Barragens (MAB), Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), movimentos ambientalistas, sindicais e partidos políticos ou como objeto de estudo na academia, são discussões cotidianas que ocupam espaço relevante no jogo político da RMS, sendo objeto de delimitação no campo de projetos políticos adversários.


A vulnerabilidade dos mecanismos de participação do PNRH, a natureza e limites dos princípios e instrumentos orientados para as questões privadas problematizam a regulação se mostrando insuficiente podendo justificar o atual modelo como meio para o equacionamento das desigualdades no acesso, apropriação, uso e distribuição da gestão da água bruta. Nesta malha conflitiva, as discussões retomam folego sobre a relação complexa entre sociedade e natureza, exigindo tolerância do significado político, que é onde se encontra a disputa de interesses públicos e privados, das injustiças ambientais.



O caráter político e do interesse, de toda e qualquer forma de regulação, é resultado de compromissos entre poder público, mercado e segmentos sociais determinando para além do seu caráter pragmático os instrumentos que estimulam ou limitam ação de agentes econômicos, pela correlação de forças constituídas entre os distintos segmentos da sociedade. Colocar regulação na mesa de discussão tem significados diversos, é estar além de perguntas relacionadas ao conteúdo das regras requerendo habilidade e conhecimento no papel das instituições na imposição de tarifas, de metas de desempenho, restrições de espaço de atuação do mercado; mas exige, também, entender interesses contraditórios de: como e por que, em determinado momento, o Estado assume serviços pagos com dinheiro público ou empréstimos, que logo após são transferidos para a iniciativa privada. A ambiguidade desta relação com a sociedade civil (FADUL, 2007, p.10) pode resultar em desenlaces não definidos, sobretudo, porque o modelo referido, resulta das ações e lutas sociais que se desenrolam em diferentes planos sobre interesses que se opõem à acumulação privada de riquezas socialmente produzidas em um determinado regime de acumulação, austeridade fiscal e abertura comercial.


* Mestre em Ciências Sociais pela UFBA


Link da imagem: http://www.terrabrasilis.org.br/ecotecadigital/pdf/mapa-de-geodiversidade-do-estado-da-bahia.pdf


Notas


[1] A Bacia Hidrográfica do Recôncavo Norte/Inhambupe – BHRN/I, está situada a partir da cidade de Salvador – BA, compondo 46 Municípios da Região Metropolitana da Capital Baiana (RMS), distribuídos em oito Áreas de Proteção Ambiental - APAs e cinco Territórios de Identidade. O Planejamento e Gestão da Água - RPGA possui uma área de 18.069.9 km², inserida no semiárido baiano, como grande parte do território nordestino; sua população é de 4.436.698 habitantes, equivalente a 34% da totalidade do Estado (2018), dos quais 143.950 hab. estão distribuídos como pequenos proprietários, em assentamentos, e povoados menores.

[2] A Bahia tem reduzido seus índices, mas não tem motivo para comemorar: Salvador perde quase metade da água distribuída. Na RMS a cada 100 litros de água captada, 50,8 litros se perdem em vazamentos e ligações clandestinas, ilegais, antes mesmo de chegar aos domicílios


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