
O Ministério do Trabalho baixou uma portaria determinando que o trabalho aos domingos e feriados passaria a ser negociado com forças sindicais, por meio de convenção coletiva, ou seja, a previsão para atividade comercial e serviços nesses respectivos dias dependeria de acordos entre patrões e representações trabalhistas. Isso causou “uma grita” de parlamentares pedindo urgência para votar a medida barrando a determinação. O ministro da pasta voltou atrás alegando “falta de entendimento” e suspendeu toda a portaria, afim de refazê-la. Nesse imbróglio todo, me chamou atenção a fala de um ancora de um noticiário noturno que, indignado, afirmou que o governo queria “atrapalhar” o empreendedorismo, o andamento do comércio, e outros aspectos negativos do projeto, e ainda concluiu que o ministro fez isso “para ajudar sua turminha sindical”. Isso leva a várias considerações que pretendo expor nesse artigo.
Após 2013, quando “o gigante acordou”, uma onda liberal vem colocando seus ideais em pauta, pleiteando agendas importantes que eles consideram necessárias para que a economia cresça e se desenvolva no país. Com isso, vários parlamentares eleitos pertencem a essa linhagem, batendo no peito e dizendo com orgulho serem de direita. Um dos primeiros inimigos que essa gente declarou foram justamente os sindicatos. Já alguns anos, eles se tornaram um entrave pro trabalhador (segundo a lógica liberal) e isso realmente fez com que muitos deles concordassem e embarcassem na crítica aos sindicatos, optando em não mais contribuir com taxas sindicais. Desde então, paralelamente, vem crescendo muito o trabalho precarizado, “uberizado”, sem qualquer formalidade. Segundo DIEESE, 74% de quem trabalha “por conta própria” (muitos trabalham por aplicativos, enriquecendo esses meios digitais) não tem previdência social.
A origem dos sindicatos está na Inglaterra, país responsável pela Revolução Industrial. Naquele período, a classe trabalhadora labutava por várias horas, sem descanso, sem férias, trabalho infantil, uma desgraça. Isso gerou ondas de alcoolismo, violência doméstica, urbana, prostituição, um caos. Com a criação das primeiras associações, foi melhorando a situação dos trabalhadores e reguladas condições mais humanas na atividade industrial. Durante a Era Vargas, os sindicatos foram fortalecidos aqui no Brasil e criados benefícios previdenciários mais modernos. De uns tempos pra cá, os sindicatos têm sido rechaçados e duramente repreendidos, como se fossem os reais exploradores da força trabalhista.
De fato, os sindicatos precisam ser restruturados e até alguns líderes sindicais pleiteiam isso. É necessária uma Reforma Sindical urgente, acompanhando as mudanças e transformações tanto sociais, como trabalhistas. No entanto, não parece ser de interesse público tais mudanças. Quando o ministro anunciou a portaria, me pareceu razoável considerar acertos entre representações trabalhistas e dirigentes lojistas. A Reforma Trabalhista enfraqueceu essa representação, com criação de trabalhos intermitentes e crescimento de serviços terceirizados, além de ter deixado o trabalhador com autonomia para lidar com seu patrão, como se tivesse alguma simetria nessa lida...
Vejo atualmente uma situação muito ruim para o trabalhador, de modo geral. Hoje, além de um serviço formal, muitos fazem seus “corres” nas horas vagas e até mesmo seu trabalho fixo está sendo acrescido de mais horas e dias trabalhados. Domingo à noite os maiores shopping centers estão apinhados de gente e lojas funcionando como se fosse uma tarde de quinta-feira. Isso num dia de escassez de transporte público! O trabalhador, seja precarizado ou formalizado, trabalha praticamente o tempo inteiro – condições que parecem remeter aos primórdios do trabalho industrial. É preciso um freio, alguma capacidade de negociação, para que as atividades voltem a ter algum nível de sobriedade, e não ficar cada vez mais afundado nas tendências e amarras do mercado e do ultraliberalismo. Daí, minha discordância com o ancora jornalista que mencionei no primeiro parágrafo. Dizer que o ministro fez isso para atender sua turminha é simplificar demais o assunto. O empreendedorismo é visto como um elemento do Jardim do Eden, sendo covardemente emparelhado por algum líder Belzebu sindicalista a atrapalhar o crescimento econômico, crescimento esse “bom pra todo mundo”.
Claro que serviços de delivery, compras on line, e demais “uberizações” é um caminho irreversível, e portanto, criando possibilidades de trabalhos contínuos qualquer dia e horário, mas é preciso regulamentação séria para brecar explorações que surgem aos montes nesse cenário. E sim, precisamos que os sindicatos sigam atuantes. Tenho familiares que já trabalharam em sindicatos e não era raro denuncias de semanas de trabalho diário sem folga, por 12 horas consecutivas sem direito a almoço e outras barbaridades. Aí fica difícil liberal querer refletir! Abusos podem estar existindo aos montes e com tanta informalidade brotando por aí, milhões de pessoas vão passar apenas trabalhar, trabalhar, e trabalhar o tempo inteiro. E marido de apresentadora de TV falando que “vida de empresário é dura”...
FONTE:
IMAGEM: SUESSOR.
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