Nos anos de 1492 os europeus, liderados por um espanhol chamado Cristóvão Colombo, ávidos por poder e expansão a qualquer custo, atracam na costa americana e descobrem que existem povos silvícolas além-mar. Percebem que suas terras são bonitas, frutíferas, abundantes e acreditam que aquele povo todo nu, cultuando um Deus diferente e desconhecido (para os brancos) talvez nem ligue se forem assaltados e molestados. Recorreriam a quem, não é verdade? Em seguida iniciam uma saga por usurpar tudo o que podem, até o que não podem. Essa saga acontece em todo o território americano e por vários povos europeus iniciando uma longa jornada de violências, intolerâncias, desumanidades, desrespeitos, crueldades e muito sadismo. Aqui no Brasil, em 1500, chegam cerca de 1400 homens liderados por um português chamado Pedro Alves Cabral e dão continuidade a uma guerra por domínios, poderes e riquezas.
Não posso afirmar que aqui, no meio daqueles povos indígenas que cuidavam das terras que descobriram e, sendo assim, eram os verdadeiros donos, não existiam conflitos. Muito provável que existiam. Mas, assim como na Europa, aqui no novo continente esses povos possuíam suas leis, suas regras sociais que permitiam o convívio entre eles e estabeleciam a convivência com as várias etnias que aqui viviam. Eles nunca precisaram dos europeus. Suas filosofias de vida permitiam avanços na medida da compreensão que tinham sobre sociedade, sobre família, sobre trabalho, sobre a vida, sobre a espiritualidade, que antes da chegada dos europeus era muito diferente do que estes propagaram para justificar os diversos crimes contra os índio do "novo mundo".
Uma matéria da BBC de 12 de outubro de 2021, chamada "Como realmente era a América antes da chegada de Colombo?", relata algumas informações relevantes apresentadas por estudiosos, arqueólogos e historiadores desse tema onde explicam que "Desde estruturas sociais quase democráticas, passando pelo manejo de florestas e o domínio da engenharia e da matemática, os povos originários da região ajudaram a criar grande parte do mundo que vivemos hoje, mesmo que não tenham recebido o crédito. Um exemplo disso é o milho, uma criação mesoamericana que revolucionou a alimentação humana e se tornou um componente essencial na dieta mundial. “A domesticação e a manipulação genética de plantas é a tecnologia mais impressionante desenvolvida pelos indígenas na América”, disse à BBC Brasil o arqueólogo americano Kurt Anschuetz, especialista na agricultura de povos pré-colombianos da América do Norte.
Os nativos também tinham “uma dieta mais equilibrada e mais nutritiva” do que em outras partes do mundo na época, graças não somente ao milho, mas também ao cultivo da batata, do abacate, do tomate e das abóboras, entre outros. Diferentemente do que ocorria no “velho mundo”, não havia evidência de períodos de fome prolongada entre eles, segundo Charles C. Mann."
Não precisamos de muito esforço para entender que a relação entre o homem e a natureza na perspectiva dos povos originários sempre foi de harmonia e respeito, buscando permitir a garantia da vida e quando falam de vida eles pensam em todos.
Fazendo um paralelo com as sociedades do velho continente encontraremos diversos, diria até sem medo de errar inúmeros exemplos claros de ganancia, apreço à morte e a destruição, mesmo antes do século XV como também depois, seja por meio de guerras, caprichos, vaidades, imposição de poder, ideia supremacista ou qualquer outras dessas justificativas que os exploradores deram para tomar à força as Américas.
Quando tratamos de Brasil colonial, sabe-se que na chegada dos portugueses "havia cerca de 3 milhões de nativos, divididos em 1000 povos diferentes". "No primeiro século de contato, 90% dos indígenas foram exterminados, principalmente por meio de doenças trazidas pelos colonizadores, como a gripe, o sarampo e a varíola. Nos séculos seguintes, milhares de vítimas morreram ou foram escravizadas nas plantações de cana-de-açúcar e na extração de minérios e borracha", segundo artigo do site fundobrasil.org.br.
Apenas esses dados conseguem demonstrar que o que vemos hoje nas terras Yanomamis não é um caso à parte, não é algo apenas fruto de omissão comprovada do ignorante, desastroso e necro-racista governo de extrema direita liderado pelo, talvez, mais antigo, irresponsável e obtuso político brasileiro do século XXI. A história do país está imersa em fatos manipulados para favorecer uma elite classista, ignorante e sem escrúpulos assim como o líder do governo passado. Após anos de escravização, assassinatos, crueldades e usurpação dos povos originários, foi aqui no Brasil um dos lugares no mundo onde a escravidão teve mais êxito e fez o maior estrago a povos africanos que, subjugados como os indígenas, sofreram e ainda sofrem um insistente e metódico apagamento de sua cultura e história.
Em 1803, a Dinamarca aboliu o comércio de escravos, em seguida a Inglaterra em 1807, a França em 1817, a Holanda em 1818 a Espanha em 1820 e a Suécia em 1824. Nas colônias britânicas, a escravidão foi finalmente abolida em 1833, nas holandesas em 1863. No Brasil, último país a acabar com o comércio de escravos negros, isso só se deu em 1888 e de uma forma arranjada e favorável aos donos de escravos, pois diferente do que o próprio país fazia com os imigrantes europeus, oferecendo incentivos, terras e outros benefícios, os agora escravos livres, imigrantes forçados, foram soltos sem qualquer apoio ou preocupação sobre seus futuros. Situação essa que permitia muitas vezes o retorno voluntario dos mesmos, sem perspectivas, à condição velada de escravos. E os que não retornavam tinham muitas dificuldades de conseguir trabalho ou respeito na sociedade.
A música “14 de maio” (dia que sucedeu a promulgação da lei Aurea) de dois brilhantes compositores baianos, o professor Jorge Portugal e o cantor Lazzo Matumbi relata com primazia essa condição infame em que os escravizados negros brasileiros foram submetidos:
“No dia 14 de maio, eu saí por aí Não tinha trabalho, nem casa, nem pra onde ir Levando a senzala na alma, subi a favela Pensando em um dia descer, mas eu nunca desci
Zanzei zonzo em todas as zonas da grande agonia Um dia com fome, no outro sem o que comer Sem nome, sem identidade, sem fotografia O mundo me olhava, mas ninguém queria me ver...”
A pergunta, diante desse passeio superficial sobre a real formação da nossa sociedade é: quem são os verdadeiros brasileiros? Os primeiros habitantes, donos da terra, explorados e exterminados durante séculos e que convivem com a guerra incessante contra um Parlamento ignorante comprado pela elite ruralista, grileira, da bala, do retrocesso, para provarem o óbvio e poderem cuidar do que resta das florestas que lhes pertence ou os descendentes dos imigrantes brancos privilegiados pela ignorância dos dominadores que até hoje só usurpam, matam, desmatam e centralizam suas riquezas passando por cima da vida em todas as suas esferas?
Qual é a verdadeira cara do Brasil original? ----------------------------------------------------------------------
Link da imagem: https://pt.wikipedia.org/wiki/Povos_ind%C3%ADgenas_do_Brasil
Letra da música citada https://www.letras.mus.br/lazzo-matumbi/14-de-maio/
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