Primeiramente, tenho que explicar a expressão contida no título, que é uma metáfora futebolística, tem nada de lactação aí. Quando a defesa de um time toma um gol que poderia ser evitado, fazendo o que quer sem ser impedida pelos zagueiros, os torcedores aborrecidos dizem que o sistema defensivo do seu time “deu leite”. O que isso significa? Quem na natureza fornece leite? A mãe, um ser permissivo, carinhoso, que deixa passar muita coisa (algumas.....). Portanto, quando ouvimos durante uma transmissão esportiva que a defesa de um time “é uma mãe”, quer dizer que está levando muito gol besta. Ou seja, “dar leite” equivale a vacilar, dar mole, um derivativo da criatividade do linguajar do torcedor. Tai o trocadilho no título, um chamariz. Agora, seguiremos com nossa programação normal.
Recentemente, os fãs da cantora Claudia Leitte ficaram possessos em função de uma polêmica envolvendo a artista. Ela teria curtido um vídeo do cantor gospel André Valadão, proferindo ofensas ao presidenciável Luiz Inácio Lula da Silva, o que gerou revolta de seu público. Valadão já havia dito em outra ocasião que igreja não seria local pra homossexuais. “Podem ir pra um clube gay, mas igreja não dá”, teria dito. Nos dias de carnaval, Leitte tem grande audiência do folião LGBTQIA+, que agitam as passagens da cantora pelos circuitos da festa. Quando ela passou a seguir o cantor (que tá mais pra um personagem de Jece Valadão que evangélico) foi a gota d’água. Dado o imbróglio, estão realizando uma manifestação – por enquanto online – para afastar Claudia da “Micareta Salvador”, evento que acontece no primeiro fim de semana de novembro, no Wet’n Wild. Muitos estão afirmando que não vão ou desistiram de ir pro show dela e outros estão organizando uma sonora vaia quando a mesma pisar o palco do evento.
Tudo isso tem fundo político, claro. Estão a chamando de “bolsonarista enrustida”, ainda mais que na festa programada estarão nomes que já fizeram o “L” com os dedos. Porém, acredito que a questão eleitoral é apenas um vetor, uma consequência, um clima. A mensagem para ela é muito mais de ordem social.
A artista já se meteu em algumas poucas e boas. Já respondeu “Deus me livre” quando perguntada, enquanto gestante, se o primeiro filho dela fosse gay. Isso bem antes de assumir que seu público era gay sim, de fato; já comparou haters a nazistas; aconselhou mulheres a fazer sexo, mesmo sem vontade; fez piadas de pintinhos pisoteados e mortos durante seu casamento, na gravação de um “Encontro com Fátima”; falou que as mulheres vieram da costela de Adão; já fez festa com bolo em formato de nadegas expelindo fezes; e outras tantas, que não vou ficar listando aqui. A fama de “bolsonarista enrustida” ganhou força quando postou um abajur em formato de arma.
Até o momento Claudia Leitte não se pronunciou sobre o aborrecimento de seus seguidores quanto aos likes a Valadão. Tá “dando leite”. Ela precisa entender que não foi um manifesto apenas de cunho polarizador. Mostra não estar em sintonia com os anseios do seu público. O movimento LGBTQIA+ vem sendo bastante restringido nas acepções do atual governo federal e pelos pastores que vem transformando cultos em peças de propaganda presidencial. Sua conduta nas redes tem se inclinado para esse lado sujo da força. Não quer se ligar diretamente a questões ideológicas? Beleza. No entanto, demonstra ter simpatias a gente que faz de boa parte do seu público um rebanho de hereges comunistas.
Mas aí que entra um fator por mim já citado. Não é algo que remete a esse cenário de guerra eleitoral. É lavar as mãos pra um seguimento que valoriza muito o mercado no qual a cantora está inserida: a cultura. Os homossexuais consomem seus produtos, adquirem abadás, seguem os passos dela em uma carreira que almeja o estrelato no exterior. Claudia não está dando a mínima para o fato de que possui um público que precisa de atenção diante de fortes tendências claras de aumento da opressão sobre eles. São parcelas da sociedade, não apenas números que registram aquisição de música nas plataformas de streaming.
Desde seu surgimento, ouço muitas pessoas suspeitando de sua ascensão, colocando em xeque o valor de seu trabalho, ou se portando com indiferença a suas canções, embora não reste dúvidas de que consegue arrastar multidões atrás do trio. Não se trata aqui de questionar se ela tem talento ou não, pelo amor de Deus! Mas diante de tantas polêmicas, sua postura parece levantar mais suspeitas de que as confusões em que se mete são mais sucessivas que seus hits radiofônicos.
Por enquanto, a cantora parece pagar pra ver se vai ser vaiada ou não, excluída da grade ou não. Veremos se o público reagirá. Ou se vai dar Leitte.
Fonte:
IMAGEM: Twitter
Carlos, amei demais seu texto. Amo a maneira jocosa e de "conversa de bar" que você traz nos seus textos. Deixa tudo mais leve e ajuda a cutucar nos assuntos sem virar um drama. Papo de amigo mesmo! Por isso, como amiga, eu falaria, caso isso fosse um papo de bar, que não curti a chamada com a foto da cantora. Mesmo eu detestando a figura, politicamente como mulher, preciso dizer que usar essa "chamariz" foi algo machista. Ainda que seja uma expressão popular que combina com o nome da cantora, colocar isso com uma foto sensual da cantora, puxando a dualidade do que seria o tal "leite", acho bem sexista. Acredito que escrever é uma forma de avançar nossas…
Nunca gostei dela e nunca achei ela pro lgbtqiapn+, sinceramente precisamos boicotar. Pessoas que fingem não ter postura politica nem partidária com medinho de ter consequências financeiras, mas que indiretamente expõe claramente sua ideia de sociedade... chega de passar pano pra essa gente.