Esse texto foi escrito por Yago Pedroza em coautoria com Jacqueline Gama.
No início do mês de novembro perdemos um dos maiores nomes da nossa música. Gal Costa fazia história toda vez que subia aos palcos. Seja aqui em território nacional ou no exterior, onde se consagrou como um dos maiores expoentes da música brasileira. Semanas depois desse november rain, a chuva não parou e desaguamos no adeus a um dos maiores compositores do nosso país, Erasmo Carlos.
A partida de Gal e de Erasmo inevitavelmente acende um alerta para a cultura brasileira e sua produção musical. Afinal, muitos dos grandes nomes estão nos seus últimos anos de vida. A lei natural que rege a todos. Gil, Caetano, Bethânia, Milton Nascimento, Zé e Elba Ramalho… todos esses já passaram dos 70 anos.
Obviamente não os estou sentenciando. Mas, a idade e todas as adversidades que ela acompanha vem chegando como chegou para Gal Costa, Moraes Moreira e Elza Soares, por exemplo. Sem falar dos que ficaram pelo caminho, como Raulzito e Elis Regina, além de tantos outros nomes como Cazuza, Cassia Eller e Renato Russo, que tiveram uma curta vida, mas uma produção vasta de conhecimento e musicalidade. Todos eles estão imortalizados.
Ainda assim a gente pensa… quando esses ídolos da música brasileira cantarem suas últimas canções, ficaremos órfãos culturalmente? Afinal, eles são alguns dos músicos que tornaram a música brasileira o que ela é. Dos palcos, eles vão para a imortalidade. Mas e nós mortais apaixonados por música… como ficaremos?
Muitos desses músicos que tememos a perder tiveram seu apogeu no meio musical na época da ditadura militar. E foram alguns dos corajosos artistas que se opuseram ao regime ditatorial que se instalava no Brasil. Esses magos da música nacional eclodiram um movimento contra cultural que influencia até hoje artistas, intelectuais, educadores e cientistas, pessoas de diversas identidades e de maneiras de pensar.
Tal representação cultural aliada com as suas músicas com forte personalidade, juntando a performance singular com conteúdo de extrema necessidade para a nossa compreensão de mundo, de país e de ideias. Essa combinação apoteótica fez desses artistas ícones insubstituíveis. Essas composições emocionam até quando suas músicas são cantadas por terceiros em mesas de bar por todo o país.
Depois da ditadura outros gêneros musicais além da MPB assumiram a vanguarda. Mas, ainda assim, com a bandeira contra cultural e influenciado por gerações anteriores. Um exemplo disso é o movimento que nasceu em Brasília nos anos 80. Talvez seja possível dizer que essa será para onde nossas atenções irão voltar.
Bandas como Legião Urbana, Capital Inicial, Paralamas, Titãs e Biquíni assumiram a posição de expoentes do movimento imponderado pós ditadura. Ecoando letras politizadas e reflexivas, a galera do rock nacional, mesmo que - ou sobretudo- influenciados pela música internacional, herdaram a atitude dos artistas das décadas de 60 e 70. E hoje, depois de alguns anos longe do holofotes principais, essas bandas estão sendo colocadas em evidência novamente.
Não é difícil ver nos outdoors de Salvador anúncios de shows de bandas que outrora não víamos tanto. Encontros especiais estão sendo promovidos como a reunião dos Titãs e a dos membros remanescentes do Legião Urbana, com ambos fazendo shows, e aqui também poderíamos citar outros exemplos, percebemos um resgate do que foi o herdeiro direto do movimento artístico que Gal e Gil fizeram parte. Além disso, está cada vez mais comum bandas de rock e pop internacionais dos anos 80 tocarem aqui no Brasil, reforçando essa teoria do movimento que chega para serem os novos “acordes” da música tocados em uma velha guitarra.
Esse movimento vivo de renascimento da corrente do rock dos anos oitenta não quer dizer uma tomado do lugar desses ídolos de sessenta que marcaram gerações anteriores, porém os rockeiros de 1980 supririam a falta que vão fazer os de 1960/10970 e assim sucessivamente.
Explicando melhor, ninguém vai substituir a galera que está indo embora, mas além dos mitos a cultura precisa de anciões para se manter viva. Esse movimento da morte de um para (re)ascensão de outro vai se repetir de novo daqui a décadas quando a galera do rock também desacelerar. Vamos atrás de outros anciões. E aí teremos que escrever outro texto falando sobre quem vem depois da reanimação do rock nacional.
Agora fica uma nessa teoria. E os grandes sertanejos que apareceram nos anos 80 como Zezé Di Camargo e Luciano ou Chitãozinho e Xororó? Não seriam eles os descendentes? A resposta é simples, não. Porque eles não formaram um movimento contra cultural.
Essas eram as músicas que queriam que se destacassem. Eram a “cultura”. A cultura obediente que pode permear o apolítico. Assim como Roberto Carlos foi na ditadura. Eles não têm esse apelo emocionante de força e resistência que a galera da MPB e do Rock Nacional possuem.
Do ponto de vista mercadológico, a contra cultura e a representatividade vendem. Parece cruel esse diagnóstico, mas é por isso que quem gosta e sempre gostou desse tipo de música pode ir assistir seus ídolos de volta aos palcos grandes em eventos e festivais de relevância. Afinal, esses anciões, que são, por exemplo; Gil, Bethânia, Caetano, Zé Ramalho, Chico, Alceu e que serão Titãs, Legião, Paralamas, devem ser apreciados.
Reavivar ou reviver essas lendas agradam dois públicos: os que realmente entendem o que eles querem dizer e os que querem ganhar dinheiro com isso. Ainda poderíamos por os terceiros e quartos públicos que vê essa geração com saudosismo ou que quer pagar de cult, mas aí já é conversa para outro texto. Só nos resta então aproveitar a boa música, valorizar e homenagear os que continuam conosco, um brinde aos nossos mestres e mestras das canções.
Foto de capa: <https://aventurasnahistoria.uol.com.br/media/_versions/hard_news/gal_e_erasmo_widelg.jpg>
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