Lembro que na infância, meu pai, por consciência ambiental ou por medo da conta, sempre dizia:
- Menina! Não esquece de apagar as luzes.
E cá, estou. Sempre atenta aos interruptores. Porém, nessa última terça-feira não foi necessária essa ação. Simplesmente: Apagão! E só depois de algumas horas percebi que não era um problema local, era um problema nacional. Várias capitais compartilharam de um mesmo contratempo e no íntimo eu até ri, afinal são tantos os escândalos nos noticiários que realmente era só que faltava ao Brasil. Apagar as luzes. É chegada a hora de sair de cena, porque simplesmente não dá mais.
Todavia, eu não tenho ainda um passaporte. O jeito é ressignificar o caos e tentar encontrar a poesia. E não é que a gente acha? Bem, sabe-se que a poesia é tudo aquilo que desperta sentimentos de uma forma harmoniosa. E nessa pausa brusca foi fácil ver o barulho das crianças, a conversa entre os vizinhos tão incomuns, já que anda todo o mundo monossilábico com o universo das redes sociais. Fiquei até sabendo de certos arrependimentos de quem saiu correndo e não deu um bom dia para quem deixou em casa. Mas, nada se compara a respirada que muitos profissionais conseguiram dá logo pela manhã, afinal tem dias que a gente gostaria mesmo de um blecaute só para não termos a obrigação de viver como um robô.
Uma vez ao assistir uma série italiana, que trouxe um episódio chamado “Padrão ouro”, onde justamente o cenário era um apagão num hospital, o que tornou a vida de todos uma celeuma. Afinal, o que fazer sem energia elétrica num hospital? Até que o chefe de equipe percebeu que o “padrão ouro” não são as máquinas, mas o ser humano. O que você faz sem tantos recursos e auxílios é o que de fato torna-se digno de nota.
E agora em meio a esse apagão é inevitável não pensar: quem é você no apagar das luzes?
Sei que para muitos não foi tão simples caçar a poesia em um dia tão atípico. Vem a preocupação com os filhos, com o emprego, com a mercadoria que vai estragar, com o parente que precisa realizar aquele exame hoje, pois o câncer já está avançando no organismo e mais mil situações válidas para o desespero. No entanto, a minha alma literária ainda grita pela resposta: quem é você ao apagar das luzes?
Sou fã de pessoas que em meio a histeria continuam honestas, pacientes e leais. E também tenho predileção por quem te vê a beira da loucura lhe conforta, incitando em você o que há de melhor. Todavia, como a canção já avisara “o mundo está ao contrário e ninguém reparou.” Vejo várias pessoas justificando as suas péssimas atitudes em relatórios de psicologia. É comum o “é meu gatilho”, “Sou depressiva”, “eu sou complicado ao lidar com emoções.” No entanto, na verdade, todo o mundo tem mostrado muito prazer na selvageria. Alguns, te olham e falam coisas semelhantes a um rugido de um leão. E ainda outros, chegam de forma bem sorrateira e quando você percebe são esses os capazes de dizer e fazer coisas que nem merece espaço nessa crônica.
Sinto-me ainda aquela garotinha que entendeu muito bem que se já fez o necessário é importante apagar as luzes e passar, porque é perda de tempo no “apagar” assumir outra identidade. Reflexões à parte o que eu quero é uma dose do Renato:
“Vem cá, meu bem, que é bom lhe ver
O mundo anda tão complicado
Que hoje eu quero fazer tudo por você.”
__________________________________
Link da imagem:
https://www.uol.com.br/vivabem/noticias/redacao/2020/09/08/quer-comecar-a-meditar-criar-um-ambiente-favoravel-e-um-bom-comeco.htm
Que texto gostoso de ler!👋👋👋👋👋👋👋