
Ao falar sobre o trabalho em condições análogas à escravidão, muitas vezes nós nos lembramos de imagens que são baseadas em fatos, mas que estão situadas em um período histórico muito diferente da nossa realidade hoje. A construção dessa imagem em nosso imaginário social de forma cristalizada pode nos fazer ter dificuldades em, hoje, identificar práticas de trabalhos análogos à escravidão que podem estar acontecendo na nossa rua, bairro ou em algum lugar remoto da nossa cidade.
Quando nós fazemos o exercício de ler as descrições, em matérias jornalísticas e em relatórios, da situação em que viviam e trabalhavam os trabalhadores rescentemente resgatados desse trabalho análogo a escravidão, nos deparamos com uma outra construção de imagem que se torna muito mais fácil de ser reconhecidas ao nosso redor, infelizmente.
O que estou querendo dizer aqui é que, a mídia e todos os outros meios de comunicação influentes, podem e devem ter um papel importante de relatar com mais frequência quais são as características desses trabalhos análogos à escravidão, descrevendo, literalmente, os cenários mais comuns no Brasil. Esse movimento é fundamental para que as denúncias anônimas passem a acontecer com mais frequência.
Os dados vêm mostrando que, apesar da legislação que mobiliza uma fiscalização pelo território nacional, a maioria dos casos resgatados até hoje são casos encontrados através de denúncias. O auxílio da mídia pode ser visto como uma potente possibilidade por esse motivo, pois, infelizmente, existe uma certa omissão do Estado, principalmente quando está sendo representado por personalidades políticas que menosprezam pautas como essas.
A identificação de outros crimes relacionados com os trabalhos análogos à escravidão, torna o desafio ainda maior. Muitos desses casos estão relacionados com crimes ambientais, formação de quadrilha, porte ilegal de armas, entre outros. Trata-se de uma situação que pede uma articulação multidisciplinar e que necessita do esforço conjunto, em que diversas estruturas institucionais se articulam em conjunto para enfrentar esse problema, ou seja, representantes do Estado precisam fortalecer essas estruturas e esse último ponto é um dos mais penosos quando lidamos com representações que pouco lidam com essa temática e até deslegitimam essas pautas e a luta de movimentos sociais que a muito tempo vem denunciando essas atrocidades em nosso país.
O cenário atual é de alerta, as marcas da Pandemia aceleraram um processo que já vinha acontecendo no Brasil, que são as crises constantes, o aumento do desemprego, a flexibilização dos direitos trabalhistas e a diminuição do poder de compra. Esse cenário nos traz a necessidade de olharmos com mais atenção os desdobramentos que teremos, inclusive, de trabalhar com a possibilidade de que talvez o caso dos trabalhos em condições análoga á escravidão crescam.
As políticas de prevenção seria o caminho ideal a se seguir, principalmente as políticas de combate às desigualdades sociais, pois são pessoas em condições vulneráveis e sem segurança social que acabam se desesperando com as poucas escolhas que têm e acabam caindo nas mãos de escravocratas contemporâneos.
Link da imagem: https://www.cnnbrasil.com.br/nacional/mulher-de-86-anos-e-resgatada-apos-72-anos-de-trabalho-em-condicoes-analogas-a-escravidao/
Referências:
BRASIL. Manual de Combate ao Trabalho em Condições Análogas às de Escravo. MTE, 2011. Disponível em: <https://www.mpf.mp.br/atuacao-tematica/ccr2/coordenacao/comissoes-e-grupos-de-trabalho/escravidao-contemporanea-migrado-1/notas-tecnicas-planos-e-oficinas/combate%20trabalho%20escravo%20WEB%20MTE.pdf>. Acesso em: 24/09/2022.
OIT – ORGANIZAÇÃO INTERNACIONAL DO TRABALHO. 2o Plano Nacional para a Erradicação do Trabalho Escravo. Brasília: OIT, 2008. Disponível em: <https://goo.gl/7wsyKR>. Acesso em: 24/09/2022.
SAKAMOTO, L. (Org.). Trabalho escravo no Brasil. Brasília: OIT, 2006. Disponível em: <https://goo.gl/Vd4XpX>. Acesso em: 24/09/2022.
Acho que o filme nacional 7 prisioneiros retrata perfeitamente o que você descreve no texto. Recomendo!