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O RETORNO DA CATARINENSE EUROPÉIA - SEM O BEBÊ ALEMÃO




Poucos meses atrás escrevi um texto sobre uma catarinense que gravou um vídeo receitando “como fazer um bebê alemão”, e nele opinei sobre sua fala, que poderia ser caracterizada ou não como algo racista (A CATARINENSE EUROPÉIA E SEU BEBÊ ALEMÃO). Pois bem, eis que a mesma mulher gravou um vídeo na companhia do marido comparando o comportamento das pessoas numa festa no interior do Maranhão, Bom Lugar, e em Blumenau, Santa Catarina. No vídeo, uma destilação politica sobre a miséria que é viver em lugares onde o assistencialismo do PT, o Bolsa Família, e outras mazelas são totalmente diferentes da maravilha que é viver no Sul, um lugar ordeiro, com pessoas educadas, e claro, sem PT! No texto anterior (leiam!) eu até tentei livrar a cara dela, mas nesse aqui... tá dificil, Mädchen*!

 

 Bom, ela - juntamente com seu marido e sem o bebê alemão - veio com a narrativa de que uma festa do Dias das Mães lá em Bom Lugar terminou com pessoas atacando um bolo de 60 metros, como um bando de famintos, e guardando em sacos, inclusive com um rapaz com uma pá na mão, pegando a guloseima como se fosse argamassa! Já em Blumenau, a festa ofertando um bolo semelhante foi na maior paz, com gente esperando sua vez, com etiqueta e postura, mostrando o quanto o povo sulista é decente, digno e sem petismo. Um marciano que chega aqui e vê as duas festas, concorda plenamente com a catarinense. Mas festinha com bolo é o melhor comparativo pra decifrar as nossas diferenças regionais?

 

A colonização pelas bandas do Nordeste foi braba, muita exploração, escravismo, revoltas nativistas, invasões estrangeiras, uma desgraça. Nesse mesmo Maranhão, entre 1838 e 1841, ocorreu a Balaiada, uma revolta popular contra o autoritarismo que reinava naquelas províncias. Depois de muita luta, Luís Alves de Lima e Silva, um coronel, coordenou as tropas que massacraram os revoltosos. Ele viria a se tornar o Duque de Caxias. Desde aquela época, choques entre militares e a população tomariam gosto até hoje.

 

Aquela população queria melhorar seus meios de vida, após crises econômicas que dificultaram a vida dos nordestinos, como a queda dos valores do açúcar, afim de se evitar no futuro, tumultos para pegar bolo. Ainda ocorreriam outras rebeliões pelo Nordeste, inclusive fundiárias. Desde o Brasil Colônia era assim, vários embates, muito antes dos alemães desembarcarem lá em Santa Catarina, durante o Império.

 

Enquanto catarinenses plantavam e colhiam, maranhenses e demais nordestinos sofriam com a questão agrária, coronelismo, cangaço, e êxodo rural. As condições sociais de séculos são bem mais esclarecedoras que uma festa que terminou em tumulto. Ao invés de receitar bebê loirinho, muitos tiveram que reagir a tantas agruras e comer o pão que o diabo amassou, emigrando para outros estados e trabalhando pesado, principalmente na construção civil e cozinhas alheias.

 

Mas continua a máxima da educação germânica? Vamos lá... Acontece no mesmo estado de Santa Catarina a Farra do Boi. Consiste em soltar um bovino que corre pra lá e pra cá atrás de pessoas que “brincam” de atazaná-lo, afim de que ele alcance um desavisado, exausto de tanta perturbação. O que estranha, é numa terra ordeira acontecer esse tipo de festejo... A policia militar até montou operação esse ano pra coibir a festa.

 

E somente no Maranhão que ocorre aquele fuzuê morta-fome? Pois bem, nos 450 anos de São Paulo, fizeram um bolo gigante também. Adivinhe o que houve? A multidão correu pra pegar seu pedaço, pedacinho, ou pedação, criando o maior furdunço. Claro que muita gente vai dizer que isso tá mais pra brincadeira do que fominhagem. Mas isso não aconteceria em SC né? Nem por brincadeira! E soube que tem uma “tradição” dessas no bairro do Bixiga, em São Paulo. Pessoas levam horas fazendo um grande bolo pra galera devassar em poucos segundos “na brincadeira”. No Maranhão, não sei como interpretariam isso... Aliás, a festa no Maranhão foi patrocinada pela prefeitura, durante o Dia das Mães. Já a de Blumenau, ocorreu dentro de um Shopping Center, é uma tradição anual, com barraquinhas típicas. Ambientes diferentes, eventos diferentes, formas distintas de organização. Uma comparação um tanto forçada, pra não dizer desonesta...

 

No artigo anterior, dissertei sobre uma possível idéia de supremacia racial na fala dela, sem definição de que foi ou não. O vídeo agora deixa clara uma superioridade regional, envolvendo tratamentos governamentais questionáveis. Ela também exalta sua origem germânica. O que fico me perguntando, é se esse povo reconhece algum mea-culpa em aceitar o crescimento do nazismo, o que culminou numa guerra sangrenta e em genocídio étnico. Seria a primeira coisa a pensar antes de desmerecer os outros.

 

Levando em conta que os catarinenses nada tem a ver com as atrocidades do nazismo lá nos anos 1930 - mesmo porque a maioria da população desse estado, até onde eu sei, não tem essa descendência - um pouco de reconhecimento das misérias que as autoridades que comandavam seus ancestrais realizaram, é um bom começo, melhor que avaliar os outros através de uma zona ocorrida em determinada data. E falo isso em nome da mulher que gravou o vídeo, se colocando como uma representante teuto-brasileira. No discurso sobre como fazer o bebê alemão, a catarinense falava em respeito às diferenças, reconhecendo a diversidade de um país continental e multicultural como o Brasil. Parece que aquilo era papinho furado. Espero que o bebê alemão cresça e possa circular pelo país. Quem sabe ele não pare no Maranhão, pra comer um gostoso bolo?


*garota, em alemão


FONTE:


 

 

 

 

 

IMAGEM: Pragmatismo Político

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