A pornografia vem crescentemente sendo objeto de discussão dentro e fora das redes sociais, especialmente em sua tensa relação com a psicologia humana (seja pela dimensão emocional, afetiva, sexual ou até mesmo comportamental). Algo que não surpreende, dado a facilitação do acesso e consumo desse conteúdo em tempos de expansão da internet e do crescimento e adaptação da indústria pornográfica com o passar dos anos. Isso fica claramente perceptível quando comparadas as épocas de 1980, 1990 e depois dos anos 2000. Ontem, havia Playboy. Hoje, XVideos (e afiliados diversos), além do WhatsApp, TikTok, Instagram (que embora sejam meios de comunicação e entretenimento, também apresentam conteúdos análogos e que servem como um ‘estímulo’ ao conteúdo adulto propriamente dito, quando não trazem explicitamente a própria pornografia em si - e note que falando das redes, falo também dos usuários).
Fato que as transformações da sociabilidade humana ao longo do tempo também repercutem na sexualidade e na psicologia humanas. Estar em 2023 logicamente é diferente de estar em 1950 ou 1980. As relações afetivas, amorosas, sexuais, sociais, mudam a todo tempo, a despeito de certos elementos que continuam presentes, para o bem ou para o mal. Fabiano Cambota, comediante e apresentador do ‘ A Culpa é do Cabral’ (Comedy Central), frisou num dos seus especiais de comédia: “Na minha época, a gente só tinha imaginação e revista. Hoje, tá tudo no celular”. Há uma relação muito entrelaçada entre a internet e sua expansão às massas, sua modernização e inovação, com as mudanças em nosso comportamento e nossa psiqué, de maneira geral.
Em relação à sexualidade, relações amorosas, afetivas e sociais, não é diferente: Ao mesmo tempo que essa facilidade de se conectar e se comunicar com as pessoas cresceu, se converteu em parte da nossa alma (brinco aqui com uma interpretação de Caetano Veloso, em Contigo En La Distancia, do Fina Estampa (1996)), teve um efeito colateral de afastamento emocional, dos laços afetivos, relativamente, de modo que era mais “fácil” mandar um WhatsApp do que encontrar pessoalmente (estou simplificando, sem esquecer que as coisas são mais complexas do que aparentam), e isso pode erodir, corroer como ferrugem, as ligações socioemocionais entre as pessoas.
À essa altura, talvez, você esteja se perguntando: Onde a pornografia entra nisso?
A indústria pornográfica se vale desse aspecto da facilidade proporcionada pela crescente expansão da internet. Mais pessoas com acesso livre, logicamente, com mais chances de acessar conteúdos que antes eram mais difíceis (seja em relação ao lugar onde esses materiais estavam ou o próprio processo de acesso e consumo), numa fascinante rapidez e em grande volume. Trata-se de um prazer que pode ser obtido de forma rápida, sem muitos obstáculos, e a qualquer momento (trocando em miúdos, uma bomba nuclear de dopamina na palma da sua mão (perdão pelo trocadilho)). Trata-se de uma fonte de prazer de baixo custo, baixo esforço e uma recompensa gigantesca, em comparação com outras fontes (comida, relações sociais, atividades esportivas, etc). Vai dizer que o cérebro não gosta de “muito prazer com pouco esforço”?
Não à toa, esse tipo de conteúdo em uma escala uso abusivo, assim como drogas, álcool, etc., causa efeitos colaterais severos, onde a reversão é mais demorada. Esse é um dos pontos dessa relação conflituosa com o ‘amor’, seja ele o amor dos relacionamentos afetivos, sociais, e até mesmo o amor de si. A razão dessa tensão é que a pornografia, nesse ciclo de consumo crescente a ponto de viciar, ela tira a sensibilidade à dopamina e faz com que outras atividades outrora prazerosas como as relações sociais/amorosas, exercícios físicos para o corpo/mente, hobbies como ler, escrever, jogar futebol, etc., passem a não servirem mais como fonte de prazer primárias porque comparada à dopamina liberada pelo consumo de conteúdo pornográfico, essas atividades têm uma retorno mais demorado, em menor volume, e com um processo menos fácil (se comparado a colocar um vídeo adulto, no conforto da cadeira, e assistir).
Portanto, não são poucos os alertas sobre esse tipo de conteúdo vindos de terapeutas sexuais, sexólogas, psiquiatras, psicólogos, que alertam para uma realidade paralela que se forma na mente do sujeito, tanto em relação à percepção que ele (ou ela) tem de si, de seu corpo, de seu comportamento, quanto às atividades que podem te proporcionar prazer e bem-estar. E isso acontece de forma menos perceptível comparativamente a outros vícios, além de impactar a rotina do indivíduo diretamente. “Pra quê vou sair com alguém, ter aquele trabalho todo de conhecer para ter uma relação casual ou não, quando posso ter prazer em casa, sem esse processo todo?”. É comum justificativas desse tipo. E isso se potencializa em quem já tem questões psicológicas mal resolvidas (ansiedade, depressão, contexto social/familiar conturbado, etc.).
O que eu quero chamar a atenção aqui, lembrando que esse assunto demandaria mais espaço, é que essa relação tensa é uma questão muito cara à saúde das pessoas, especialmente a mental, além da pornografia ser um elemento dificultador dentro das próprias relações pela sua característica de fortalecer a inibição emocional, as distorções sobre o corpo e a sexualidade alheia, erodindo fundações importantes por onde o amor se manifesta. O prazer de uma tela não tem a menor chance de se igualar ao prazer de amar (seja qual for a manifestação dele, seja qual for as relações que você tenha, e independente da sua rotina). Trata-se de um alerta, porque do mesmo modo que “nem tudo que reluz é ouro”, a pornografia não é o sexo de verdade (e muito menos um elemento agregador ao amor, pelo contrário: é um elemento destruidor). Tanto é assim, que a assertiva “quem vê pornô transa mal” tem a sua justificativa concreta.
Pense nisso. Há uma vida fora das telas.
Tempus Fugit.
FONTE:
IMAGEM: Aline Esteves
Muita coisa a se refletir. Assim como a pornografia,o sujeito prefere maratonar séries que passear por Morro com a galera. Só os gastos,transtorno da viagem, e o deslocamento já deixam muita gente desleixada. A pornografia entra como mais um elemento de "preguicização" da sociedade. O comodismo no amor é um condicionante para comodismos gerais.