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Foto do escritorCarlos Henrique Cardoso

Quem pode ser matável?

Uma operação policial no Morro do Jacarezinho, Rio de Janeiro, resultou em 28 mortos, a ação mais letal já perpetrada pela segurança pública do estado. O evento ocorrido no dia 6 de maio do corrente ano dividiu opiniões. Muitas críticas foram direcionadas, mas também elogios e congratulações pela mortandade de marginais, ainda mais depois da divulgação que quase todos os mortos tinham “passagem pela polícia”.


Quando se fala em confronto entre policiais e bandidos, sabe-se que vidas vão ser perdidas. No caso do episódio em Jacarezinho, não se sabe ao certo se houve essa batalha típica de uma guerra entre soldados inimigos. Os relatos são de execução. Moradores afirmam que policiais atiraram em rendidos e alguns deles foram assassinados no interior de residências. Uma perícia seria necessária para desvendar o que houve, no entanto, os corpos foram retirados do local, dificultando uma conclusão precisa. A iniciativa da diligência era o combate ao aliciamento de menores pelo tráfico. Entretanto, o inquérito final da Delegacia de Proteção da Criança e do Adolescente não mencionou nada sobre esse argumento. Lá chegando, um policial foi alvejado – vindo a óbito – o que desencadeou a suposta matança. 23 armas e 12 granadas foram apreendidas, ou seja, um número menor que o total de mortos. Não vou aqui me deter nos desdobramentos da ação, mas na reflexão de quem está autorizado a ser morto e em que circunstâncias.


Nas informações a respeito dos falecidos, 12 eram fichados por crimes relacionados ao tráfico; 16 já haviam sido presos por roubo, posse de drogas, porte ilegal de armas e outras infrações. Nenhum por homicídio. O suspeito de matar o policial está foragido. Ou seja, nenhum dos óbitos deu o tiro fatal no agente.


Uma série de informações acima constata que ser contraventor numa favela o condiciona a ser penalizado com a morte. Quando a polícia chega em um local dominado pelo tráfico, balas serão disparadas e caso inocentes morram significa efeito colateral da “guerra às drogas”. Parte da sociedade pode até lamentar a morte de um jovem inocente, mas suspiram aliviados quando descobrem que algum finado tinha “passagem pela polícia”. É esse o imaginário popular: um infeliz que foi pego com uns cigarrinhos de maconha e foi morto pela polícia, era matável, pois tinha “passagem pela polícia”.


Se algum individuo foi preso no passado e exercia algum trabalho decente e de repente vir a ser atingido por uma bala e morrer, não importaria sua situação atual, segundo o senso-comum de “passagem policial”. Isso quando se é pobre. Ricos homicidas, pedófilos, ou estupradores vão pra cadeia. Se não tiver condições, pode ser linchado ou, caso venha a morrer, sua própria condição penal justifica sua morte. Temos mortos em diversos níveis de transgressão sendo alvejados. Doutor Jairinho, Flordeliz, goleiro Bruno e outros, jamais podem ser alvejados nos quartos de uma casinha de reboco.


A ONU, Anistia Internacional, OAB, STF, e instituições reconhecidas solicitam explicações sobre o caso, todos eles “pessoal dos Direitos Humanos”, como dizem os que se satisfazem com a “passagem pela polícia”. No entanto, há uma preocupação bem pertinente pra tanta preocupação: a transformação de uma comunidade em palco de guerra. Lugar de moradia, por maiores que sejam suas mazelas, não deveriam sustentar trincheiras para confrontos e barbáries. Uma operação policial com a finalidade em erradicar a utilização de menores pelo tráfico não pode terminar com um individuo sendo executado no quarto de uma criança, como mostram alguns relatos. Contrassenso total.

Para não se ater à ação policial, tivemos o caso de tio e sobrinho mortos por traficantes em Salvador por roubarem carne! Foram entregues pelos seguranças de um supermercado após serem flagrados em furto famélico. Oito suspeitos pelo crime bárbaro foram presos, inclusive cinco traficantes de estarem envolvidos. Detalhe: sem ser disparado um tiro.


A classe social determina não a lei, mas o “justiçamento”. Aos detidos mais abastados, o tribunal; aos miseráveis, “pou-pou-pou!”


FONTE:




IMAGEM: UOL.






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