
Andei divagando por pensamentos interessantes durante as últimas semanas que me fizeram refletir sobre quem eu sou. O que me fez ser. O que já é por natureza o eu. Será que realmente é a neuro divergência, ou é um trauma?
Será que eu sou assim ou assado por ser mulher, ou me moldei assim para diminuir a quantidade de possibilidades de assédio? Questionei a um colega de curso “quem seria você se todas as suas necessidades fossem atendidas?”, ele começou vago, sem entender a profundidade da pergunta: “Seria mimado, prepotente.”, não, não. Não é sobre isso que estamos falando aqui. Não estamos falando de suas vontades como indivíduo pensante, mas sim, quem você seria se nunca tivesse sido espancado na infância pela falta de preparação de seus pais para lidar com seu processo de aprendizado.
Quem seria você se fosse óbvio que não é um luxo ter pessoas que te amam e te respeitam ao seu redor e sim, somente elas. Quem seria você se não precisasse se preocupar com o aluguel que vencerá no fim do mês, com a conta de luz, água e internet. Quem seria você se saúde fosse realmente entregue como deveria. Se houvesse acessibilidade ao atendimento psicológico, psiquiátrico e que isso não fosse um tabu social e sim, uma questão de saúde pública.
Quem seria você se não fosse comum pessoas ao seu redor correrem risco de serem mortas a qualquer momento por violência policial. Quem seria você? Venho pensando sobre isso a séculos e realmente percebi que eu não sei. Francamente, eu não sei quem seria essa pessoa. Mas não seria eu.
Acabo sendo parte de relações tóxicas, acabo não percebendo abusos pela normalização destes. Acabo normalizando correr ao descer do ônibus para que não seja assaltada no centro da cidade após o pôr do sol. Acabo me culpando por não ser suficiente em um mundo de insuficiências.
Quero destrinchar com mais didática o que seriam as necessidades básicas primordiais de um ser humano. As primeiras seriam aquelas de sobrevivência, que os poetas escrevem em muros: Você está vivendo ou sobrevivendo?
Moradia digna: Bem iluminada, ventilada, sem cheiro de mofo; Saúde pública: Ir no posto de saúde e ser atendido sem demora, não precisar passar por humilhação para ter um atestado médico, não morrer nas filas de espera por cirurgias ou procedimentos; Segurança: Poder ir e vir em paz, sem se preocupar com as possibilidades reais de assaltos, assédios, sequestros, assassinatos ou abordagens violentas; Acesso à educação: Oficinas, cursos, oportunidades divulgadas igualitariamente, bom empenho no corpo docente dos secundaristas, de forma que os professores recebam seus salários e não precisem fazer greves e paralisações por seus direitos básicos; Saneamento básico: Não haver esgotos à céu aberto, minimamente. Parece até utópico, mas é o mínimo.
Estamos tão acostumados a não ter o básico, que enquanto escrevia isso, parei em segurança e pensei, sonhadora: “Se tivesse isso, eu já estaria muito feliz”. Mas é doentio. Estamos doentes por precisar lutar diariamente pelo básico. Trabalhar todos os dias para pagar contas referentes a nossa sobrevivência. Isso não faz sentido nenhum. Estamos cada vez mais doentes e sim, continuaremos assim se não houver uma mudança drástica nos padrões sociais colocados.
Pense comigo, caro leitor: Como você já teria organizado a sua vida se para comprar uma geladeira, você não precisasse ocupar doze meses de sua vida com essa responsabilidade. Se ter um almoço digno diariamente não fosse uma questão, e sim, algo simples de se resolver.
Trocamos nosso tempo por sobrevivência. Há um filme chamado “O preço do amanhã”, se você não assistiu, por favor, o faça. Assista “O poço” também. Vai ajudar na sua construção de pensamento do que é a necessidade nua e crua.
Temo estar utilizando de diálogos cansativos e predominantes no âmbito social. Mas pare para pensar, meu bem, é desmotivador. É cansativo acordar todos os dias com a mesma incógnita. Não temos liberdade para superar novos obstáculos por estarmos preocupados com o dinheiro do aluguel. Não há tempo de pensar numa mudança de carreira quando você sabe que se você for demitido, não haverá outro meio de sobrevivência.
Parei de falar sobre as necessidades básicas e sim, há mais delas: necessidade afetiva: quando você não precisa se sentir culpada por algo que não fez, quando seu coração não fica pesaroso ao pensar em voltar para casa no final do dia ou quando o clima não pesa quando a outra pessoa chega.
Você percebe o quão estamos doentes? Mesmo sabendo de tudo isso, eu tento com muito empenho continuar tentando superar as necessidades básicas para alcançar outro patamar. Tenho uma lista intitulada “auto presentes” e percebi que boa parte dela é de total necessidade. Claro que há objetos supérfluos como uma Alexa, mas está na posição 36. Imagina só se na lista não precisasse ter um liquidificador, por exemplo. Um sonho!
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