Se você é ou vai se tornar mãe, tenho uma notícia para te dar. Prepare-se para a inevitável penalidade materna!
Se você é ou vai se tornar pai, não se preocupe. Você sempre poderá ganhar o bônus paterno!
É muito comum nos meus percursos de estudos e análises sobre o tema materno me deparar com um termo ou ideia que consegue traduzir muito bem uma opressão que já descrevi em vários textos, mas não havia falado especificamente daquela forma. Foi assim com a “penalidade materna”, “(...) termo que se refere aos diferenciais observados entre mulheres com características e inserção laboral semelhantes, mas que apresentam diferentes rendimentos no trabalho devido a presença de filhos.”
Claro que podemos imaginar que no Brasil, um país com faltas em políticas públicas maternas e dominado pela desigualdade e o machismo, essa questão prevalecesse. No entanto, o fenômeno consegue ser registrado mesmo em países ricos que garantem licenças maternas longas e bem remuneradas. Segundo um estudo elaborado pelo economista Henrik Kleven, da Universidade Princeton:
“o nascimento de um filho causa uma perda salarial de até 26% nos países escandinavos, de 44% no Reino Unido e nos EUA, e de até 61% na Alemanha”.
E o jogo da penalidade parece um ciclo vicioso. A maternidade, mesmo quando estruturada com rede de apoio e alta renda, entrega a mulher uma rotina mais exaustiva, que a torna menos produtiva do que as empresas esperam (do imprevisto da “criança doente” até a solicitação de férias de acordo com a rotina escolar dos filhos). Ainda que isso não aconteça, uma mãe já é vista como menos competente e confiável, sendo descartada em entrevistas de emprego ou perdendo credibilidade para assumir cargos mais altos. Tudo isso tem nome, viu? Assédio Materno, “comportamentos de violência psicológica dirigidos contra as mulheres no local de trabalho, desde a gravidez até a amamentação e, em muitos casos, após a gravidez.”
Dessa forma, mulheres-mães são penalizadas, como indica essa observação de Katherine Goldstein (2019) :
“Mesmo na busca por inserção no mercado de trabalho, as mulheres com filhos(as) são prejudicadas apenas pelo fato de serem mães. É o que diz um estudo realizado pela American Journal of Sociology, que apontou que em uma oportunidade de contratação em que as candidatas sejam iguais em todos os aspectos, havendo uma sutil indicação de que uma delas é mãe, a probabilidade da mãe ser escolhida é reduzida em 37%”.
Vale lembrar que essas considerações perpassam outras áreas de atuação, como o campo de pesquisa nas universidades, onde muitas análises apontam a prevalência da evasão escolar em alunas que se tornam mães no meio do curso, tanto de graduação quanto de pós. Mesmo com a possibilidade de exigirem um regimento especial pela condição materna, muitas mulheres-mães são oprimidas por coordenadores ou professores, como no caso da Ambar Soldevila Cordoba, estudante de pós-graduação em Ecologia da Universidade Federal de Ouro Preto (UFOP) que teve seu título de mestre negado, mesmo após conseguir apresentar a sua dissertação. Ela deu à luz ao seu filho 19 dias após a apresentação do trabalho final e não conseguiu entregar as correções do texto dentro do prazo estabelecido.
Para os pais, o caminho é completamente o oposto. Não há penalidades para a prática paterna, até porque é culturalmente estabelecido o entendimento que o rendimento deste homem não será afetado quando seu filho ficar doente, ou a professora convocar uma reunião de pais e qualquer outra atividade do campo doméstico/particular. Pelo contrário, as empresas percebem que esse homem se engaja com mais intensidade para que a oportunidade de ganhar mais dinheiro seja conquistada (afinal, ele precisa prover para o seu novo rebento, certo?). Esse paradigma entrega ao sujeito o bônus da paternidade no campo profissional, que pode ser literalmente uma bonificação financeira ou passar a ser visto como mais responsável, correto e confiável, diferente dos colegas solteiros que, dominados pelos hormônios, podem dar prioridade apenas às farras.
O que habita entre a penalidade e o bônus é apenas a estrutura machista que sobrecarrega mulheres em múltiplas funções e poucas oportunidades de desenvolvimento de carreira. Essa discrepância pode ser diminuída com iniciativas concretas de apoio às mulheres em todas as etapas da sua vida, especialmente na fase da maternidade. Sem esse suporte, essas sujeitas ficarão, mais uma vez, deixadas para trás, abandonando sonhos e projetos.
FONTE:
GOLDSTEIN, Katherine. The Open Secret of Anti-Mom Bias at Work. The New
York Times, Nova Iorque, 16 mai 2018.
GALVÃO, Lize Borges. Mãe solteira não. Mãe solo! Considerações sobre maternidade, conjugalidade e sobrecarga feminina. Revista Direito e Sexualidade, v. 1, n. 1, 2020.
Fonte de imagem: https://www.estadao.com.br/emais/nana-soares/ganhar-menos-nao-e-o-unico-problema-das-mulheres-no-mercado-de-trabalho/
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