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Artista e obra se confundem?Ou é possível separá-los?Opinião.


Estreou no último dia 16 de março no canal HBO o documentário “Leaving Neverland” (Deixando Neverland) que traz os depoimentos de dois homens, Wade Robson e James Safechuck, que expõem com detalhes abusos sofridos por eles, cujo autor era o falecido artista pop Michael Jackson. Os dois chegaram a morar durante um período no Rancho Neverland, onde o astro residia, com aval das respectivas famílias. Dirigido por Dan Reed, o documentário narra fatos chocantes do convívio de Michael com os então garotos. Um deles chegou a processar o artista, que foi absolvido em 2005. Michael já tinha entrado em acordo com a família de outro jovem, em 1994, também por conta de assédios sofridos. A família do músico pretende processar o canal pela veiculação dos fatos.


O documentário, porém, causou mais que incomodo nos fãs do artista. Diversas reações aconteceram, tanto contra a transmissão e a favor do ídolo, quanto de espanto pelos pormenores contidos nos relatos dos envolvidos. No entanto, uma movimentação despertou atenção: Várias rádios ao redor do mundo resolveram excluir as músicas de Michael da grade de programação. Alguns desses veículos afirmaram que tomaram a decisão após pedidos dos próprios ouvintes. Nesse caso, cabe a pergunta: a obra do artista é complemento de sua vida?


Banir o repertório do artista é uma atitude polêmica e realizar isso em virtude da súplica dos receptores das rádios, deixam os responsáveis pelas emissoras em saia justa, pois entram em jogo quesitos comerciais, advindos de questões morais. Todavia, qualquer demérito ou deslize que um compositor, ator, ou escritor venha a cometer, isso não devia interferir na apreciação da sua arte. Vejamos porquê.


Reconheço que no caso específico abordado aqui, alguém que tenha sofrido abusos na infância sinta-se desconfortável em ouvir canções de um artista que cometeu atos que prejudicaram terceiros, semelhante ao que lhe ocorreu. Compreensível. Mas aliar uma melodia que lhe agrade a um comportamento incorreto ou criminoso, talvez seja exagero.


Quando boicotamos uma marca após descobrirmos que ela utilizava trabalho escravo, estamos nos manifestando contra um sistema industrial irregular; ao deixar de apreciar canções de um grupo que admirávamos ao tomarmos ciência de que defendem ideias nazistas ou são oriundos da Ku Klux Klan, estamos protestando contra segmentos que defendem pleitos universalmente condenáveis. Contudo, ao deixar de ouvir canções de um suposto pedófilo, estamos longe de combater a pedofilia.Ainda mais de um músico que influenciou gerações. Suas coreografias, clipes, vendagens astronômicas, parcerias, e sucessos históricos estão aí pra não deixar ninguém mentir. Suas influências artísticas não são condenáveis. É possível separar o músico e o monstro.


Música envolve sentimentos, muito mais do que razões. Independente da vida particular do astro pop, o produto de sua obra está presente na vida de cada um – e isso não está diretamente ligado ao intérprete em si, pois canções estão abertas a versões feitas por outros. Música é estimulo, desperta sensações. Nos faz recordar dos que já se foram, de antigas paixões, dos tempos de escola, de férias na casa da avó, da cidade onde nasceu, de locais onde conhecemos esposas ou maridos... Trilhas sonoras ligadas a emoções e anseios. Portanto, nem sempre podemos controlar o que ela nos provoca, e assim, não é fácil descartar um acervo através de julgamentos ou decisões de caráter racional. Ainda mais quando nos referimos a um artista já falecido, sem possibilidades de defesa ou condenação. Porém, a idolatria e o culto a uma pessoa devem ser revistos, até para evitar extremos, tanto de paixão desmedida quanto de repudio total.


Vez ou outra, nos é reportado casos envolvendo atores e diretores, afastados dos seus trabalhos na TV ou no cinema. No entanto, os filmes ou peças onde eles atuavam contam com um elenco, que não pode ser atingido por erros cometidos por um ou outro. O show tem que continuar.


FONTES:

https://cultura.estadao.com.br/noticias/televisao,deixando-neverland-sobre-abusos-sexuais-de-michael-jackson-tem-data-de-estreia-no-brasil,70002740545


https://rollingstone.uol.com.br/noticia/musicas-de-michael-jackson-sao-banidas-de-diversas-radios-ao-redor-do-mundo/


Imagem: Pixbay


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