Por Neusa Maria dos Santos Pires
Quantas vezes educadores ouvem de seus alunos, principalmente do ensino médio, questionamentos sobre a leitura de textos literários em sala de aula.
Sabe-se que a prática da leitura tem sofrido modificações durante toda a história da humanidade, hoje, a oferta de outras formas de entretenimento a partir do uso das tecnologias tem afastado muitos alunos das práticas leitoras. Mas, o que se se escuta nas escolas é: literatura para que, professor?
Embora, esse fato seja observado por muitas pesquisas, a literatura se insere em todos os âmbitos sociais. O que precisa ser discutido é como a leitura do texto literário pode ser realizada com prazer pelo leitor, deixando de ser apenas um instrumento didático em determinadas situações de ensino e aprendizagem.
Quando se pensa em leitura, são muitas as definições e conceitos apresentados pelos autores e críticos. Na verdade, autores discutem se a leitura preenche uma lacuna na vida do leitor para realizar um desejo ou atender uma necessidade. Fato é que a leitura é um ato de autonomia, que deve contemplar o gosto do leitor. Sabendo disso, os textos literários e a forma como são utilizados em sala de aula nem sempre contemplam os jovens leitores.
Tantas são as teorias em torno da leitura, do leitor, da percepção ao se deparar com um texto literário. Então se pergunta? Quantas janelas são possíveis de abrir quando se lê literatura? A estética da recepção de Jauss não dá conta das possibilidades que a arte da palavra pode proporcionar ao leitor. Questão de sentimento, produzir sentido, talvez.... O prazer da leitura do texto literário, tão discutido por educadores e teóricos pode estar ligado simplesmente ao gosto de quem ler.
Barthes (2002) comenta que o texto prazeroso é o que promove euforia, que tira o leitor da zona de conforto. Convenhamos que a literatura nem sempre está no contexto da realidade do leitor e esse aspecto se configura como um diferencial, quando se quer encontrar algo diferenciado na literatura.
O que dizer da experiência da leitura? Algo dialógico? Um desafio? Expectativa de novas sensações? Emoções, ideias e desdobramentos infinitos por parte do leitor?
A leitura marcou a história da humanidade, desde os primeiros escritos até a leitura em ambientes virtuais, ela está presente na sociedade.
Não vamos exigir do leitor a compreensão, nem interpretação, como de costume nas escolas. Chartier (1999) retrata a leitura como “algo inventiva e criativa”, que sofre transformações de tempo e espaço e suportes em que são elaboradas a escrita.
O que dizer da literatura nos tempos atuais? Qual seu papel diante de tantas inovações tecnológicas, e dificuldades de abstração nas escolas? Como a literatura se insere na vida cotidiana? Porque os jovens leitores reconhecem a literatura como algo complexo e difícil? Precisa compreender? Ou basta sentir o prazer de ler? A liberdade de escolher os seus textos é algo que precisamos entender na formação dos jovens leitores.
A literatura acompanhou a evolução da humanidade e dialoga com várias linguagens artísticas, como o cinema, as artes plásticas, a música, o teatro, e demais manifestações artísticas. As adaptações dos textos literários para outras linguagens faz dela uma arte versátil, contemporânea e multifacetada.
Essa face da arte literária está retratada desde o trovadorismo, com os poemas musicados, o ritmo faz parte da escrita, do texto poético, na canção popular entre outros textos poéticos, como a ópera. Cândido (2000) observa a literatura sob três perspectivas da literatura e seu papel na sociedade: a literatura e as necessidades do indivíduo em conviver com a fantasia, o surreal. - a literatura e a interação com o consciente e o inconsciente – e a literatura e o conhecimento de mundo.
Voltando ao contexto da literatura na escola, a terceira perspectiva parece ser a mais comum quando se trata da leitura do texto literário em sala de aula.
A teoria da Estética da Recepção de Jauss trata da preocupação da oferta do texto literário aos novos leitores, a inserção das novas linguagens, dialogando com outras artes, os recursos tecnológicos, desde quando, este proporcione ao leitor a expressão, a crítica, a reflexão, e as interações com o mundo no qual se insere diante do texto.
Ler é prazeroso? Literatura para que? Que papel tem a literatura afinal, na sociedade contemporânea? Espera-se que a literatura se mantenha conforme Cândido (2000) uma instituição social que se constitui num sistema simbólico de comunicação inter-humana.
Sendo assim, vamos entender a necessidade de existir na leitura literária a dialética entre o autor, o leitor e a obra para que a receptividade aconteça e logo, o prazer de ler.
Se a literatura se concretiza a partir do processo de criação, através d a imaginação do autor, e tem como foco despertar o prazer da leitura, o que pode se concluir é que as práticas leitoras devem ser promovidas num contexto que desperte o interesse e o gosto pelo texto.
O estranhamento inicialmente causado por alguns tipos de textos literários, pode ser um fator positivo no que condiz a leitura. Sair da zona de conforto nos leva a buscar novos sentidos e provoca a construção de novas ideias, algo que certamente irá contribuir para o aprendizado.
Vamos visitar mais nossas estantes? Seja no âmbito físico ou virtual, a literatura sempre estará no nosso cotidiano, nas nossa vidas e na sociedade. Precisamos dela para desenvolver a valores que nos tornam mais humanos e receptivos com os demais seres.
Literatura para que? Esta resposta só teremos após o encontro com a arte da palavra, e que esse encontro seja prazeroso e com infinitas possibilidades. O texto literário pode ser um instrumento de transformação, depende da maneira como é apresentado e o modo que recebemos na subjetividade contextualizada no texto literário nas interações texto-leitor-contexto-social.
Neusa Maria dos Santos Pires
Mestre em Ciência da Informação
Especialista em Língua, Linguística e Literatura
Licenciada em Letras
Bibliotecária documentalista
REFERÊNCIAS
BARTHES, Roland. Sobre a leitura. In: ______ O rumor da língua. Lisboa, Portugal: Edições 70, 1984.
.CÂNDIDO, Antônio. O direito a literatura; O esquema de machado de Assis. In: Vários Escritos. São Paulo: Duas Cidades, 1995.
________. Literatura e Sociedade. 9 ed. Rio de janeiro: Ouro sobre Azul, 2006.
CHARTIER, Roger. A aventura do livro: do leitor ao navegador. São Paulo: editora UNESP. Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 1999, - (Prismas)
________. Do livro à leitura. In CHARTIER, R. (Org.). Práticas de leitura. São Paulo. Estação Liberdade. pp. 77-106. 1996.
JAUSS, Hans Robert. A história da literatura como provocação à teoria literária. Trad. De Sérgio Tellaroli. São Paulo: Ática, 1994.
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