VULNERABILIDADE INFANTIL E VIOLÊNCIA VIRTUAL: O Caso das Filhas de Ivete Sangalo
- Nieissa Pereira
- há 6 dias
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A cantora baiana, Ivete Sangalo, na última semana utilizou suas redes sociais para compartilhar os momentos da sua nova fase musical. Prestes a lançar o seu novo projeto, intitulado “Ivete Clareou” dedicado ao samba e a pagode, Ivete realizou gravações no Rio de Janeiro com direito a muita música e convidados. Porém, o que chamou a atenção da internet foi a participação das suas filhas, Marina e Helena, que interagiram com a mãe com muita alegria e dança. O que era para ser um momento fofo e descontraído, gerou polêmica, pois uma das meninas, com cabelo curto e roupa folgada, foi alvo de comentários homofóbicos, com internautas especulando sobre sua identidade de gênero e fazendo observações desrespeitosas.
Comentários como "A de branco quer ser menino" e "Essa filha de cabelo curto parece ser especial" foram disseminados nas redes sociais, refletindo um comportamento preconceituoso e intolerante.
O fato de a vítima ser uma criança agrava significativamente a gravidade do episódio. Crianças estão em fase de desenvolvimento físico, emocional e psicológico, e a exposição a discursos de ódio pode gerar traumas duradouros, afetando a construção de sua identidade, autoestima e percepção de pertencimento social.
A homofobia dirigida a crianças, mesmo quando disfarçada de “opinião” sobre aparência ou comportamento, insere-as em um contexto de discriminação precoce, transmitindo a mensagem de que suas escolhas e expressões individuais são inadequadas ou rejeitáveis. Esse tipo de violência simbólica e psicológica é especialmente danoso, porque interfere na formação de sua personalidade e na segurança emocional, aspectos fundamentais para uma infância saudável.
Do ponto de vista jurídico, a legislação brasileira já prevê mecanismos de proteção contra tais práticas. Em 2019, o Supremo Tribunal Federal decidiu que atos de homofobia e transfobia devem ser enquadrados na Lei nº 7.716/1989, conhecida como Lei do Racismo, garantindo que crimes motivados por preconceito contra orientação sexual ou identidade de gênero sejam tratados com rigor.
A lei prevê pena de reclusão de um a três anos, além de multa, para quem praticar, induzir ou incitar a discriminação. Além disso, os comentários dirigidos à criança podem ser enquadrados como injúria qualificada pelo preconceito, conforme o artigo 140, §3º, do Código Penal, que também prevê detenção e multa. A aplicação efetiva dessas normas é crucial para proteger crianças e adolescentes da exposição a violência e preconceito.
As plataformas digitais, responsáveis por veicular grande parte desses conteúdos, também têm papel central na proteção das crianças e adolescentes. É imperativo que adotem políticas rigorosas de monitoramento e remoção de conteúdos discriminatórios, bem como mecanismos eficazes para identificar e responsabilizar os autores de ataques homofóbicos. A omissão institucional ou corporativa apenas reforça a sensação de impunidade, perpetuando a violência simbólica e material que afeta diretamente a vítima infantil.
Mais do que um episódio isolado, o caso das filhas de Ivete Sangalo evidencia a necessidade de uma reflexão social profunda sobre os padrões de gênero e comportamento impostos desde a infância. É fundamental promover uma cultura de respeito à diversidade, incluindo orientação sexual, identidade de gênero, expressão de gênero e escolhas individuais.
O episódio deve servir de alerta não apenas para a aplicação rigorosa da legislação, mas também para a importância de políticas públicas, ações educativas e conscientização familiar que protejam crianças e adolescentes, garantindo seu direito a uma infância segura e livre de preconceito.
A homofobia, quando dirigida a crianças, transcende o campo da moralidade e da ética, entrando no domínio do direito e da proteção integral da criança, conforme preconiza o Estatuto da Criança e do Adolescente. A efetividade da legislação, somada à responsabilidade das plataformas digitais e à educação para o respeito à diversidade, é fundamental para construir um ambiente seguro, inclusivo e democrático. O caso das filhas de Ivete Sangalo evidencia que ainda há um longo caminho a percorrer para que a infância seja respeitada como um período de desenvolvimento protegido, livre de discriminação e violência.
REFERÊNCIAS:
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. ADO 26. Disponível em: https://portal.stf.jus.br/noticias/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=414010. Acesso em: 17 ago. 2025.
BRASIL. Código Penal Brasileiro. Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/1940-02-07.htm. Acesso em: 17 ago. 2025.
BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente. Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Disponível em: https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8069.htm. Acesso em: 17 ago. 2025.
CORREIO BRAZILIENSE. Filha de Ivete Sangalo é alvo de homofobia na web após gravação. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/colunistas/mariana-morais/2025/08/7224922-filha-de-ivete-sangalo-e-alvo-de-homofobia-na-web-apos-gravacao.html. Acesso em: 17 ago. 2025.
TERRA. Filha de Ivete Sangalo sofre ataques homofóbicos nas redes sociais. Disponível em: https://www.terra.com.br/diversao/gente/famosos-em-redes-sociais/filha-de-ivete-sofre-ataques-preconceituosos-apos-corte-de-cabelo-curto-quer-ser-menino%2Cb47efc6d4722b454929062b93bebb86all88hafn.html. Acesso em: 17 ago. 2025.
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