Hoje, a exatos 171 anos, nascia Antônio Frederico de Castro Alves, poeta nacionalmente conhecido e "patrono" do nosso site. Embora tenha tido uma vida curta (morreu com 24 anos por tuberculose), Castro Alves teve uma vida intensa, tanto do ponto de vista artístico, político e afetivo. Não por acaso, ontem se comemororou o dia da poesia.
O "Poeta dos escravos", conforme o chamou José de Alencar em correspondência para Machado de Assis, nos legou poemas que punham o dedo na ferida no recém emancipado Brasil: a escravidão. Seus versos, embora duros, conseguem a façanha de tocar em um assunto tão polêmico na época, mas, ainda sim, com uma leveza que só mesmo a pura arte consegue ser capaz de fazer. E é com esse espírito de compromisso com temas relevantes, mas ao mesmo tempo tomados pela leveza, que o Soteroprosa busca abordar diversas questões em pauta, aqui, no Brasil e no mundo, sempre com o intuito de compartilhar o conhecimento e promover o debate. Estamos abertos a qualquer corrente de pensamento.
Como singela homenagem, escolhemos dois poemas de Castro Alves. O primeiro é Canção de Africano, seu primeiro poema denunciando a escravidão, de 1863. O segundo é A Eugênia Câmara, dedicado ao maior dos seus amores.
A canção do africano
Lá na úmida senzala, Sentado na estreita sala, Junto ao braseiro, no chão, Entoa o escravo o seu canto, E ao cantar correm-lhe em pranto Saudades do seu torrão ... De um lado, uma negra escrava Os olhos no filho crava, Que tem no colo a embalar... E à meia voz lá responde Ao canto, e o filhinho esconde, Talvez pra não o escutar! "Minha terra é lá bem longe, Das bandas de onde o sol vem; Esta terra é mais bonita, Mas à outra eu quero bem! "0 sol faz lá tudo em fogo, Faz em brasa toda a areia; Ninguém sabe como é belo Ver de tarde a papa-ceia! "Aquelas terras tão grandes, Tão compridas como o mar, Com suas poucas palmeiras Dão vontade de pensar ... "Lá todos vivem felizes, Todos dançam no terreiro; A gente lá não se vende Como aqui, só por dinheiro". O escravo calou a fala, Porque na úmida sala O fogo estava a apagar; E a escrava acabou seu canto, Pra não acordar com o pranto O seu filhinho a sonhar!
A Eugênia Câmara
AINDA UMA VEZ tu brilhas sobre o palco, Ainda uma vez eu venho te saudar... Também o povo vem rolando aplausos Às tuas plantas mil troféus lançar... Após a noite, que passou sombria, A estrela-dalva pelo céu rasgou... Errante estrela, se lutaste um dia, Vê como o povo o teu sofrer pagou... Lutar!... que importa, se afinal venceste? Chorar!... que importa, se afinal sorris? A tempestade se não rompe a estátua Lava-lhe os pés e a triunfal cerviz. Ouves o aplauso deste povo imenso, Lava, que irrompe do poplar vulcão? É o bronze rubro, que ao fundir dos bustos Referve ardente do porvir na mão. O povo o povo Maldiz as trevas, abençoa a luz Sentiu teu gênio e rebramiu soberbo: — Pra ti altares, não do poste a cruz. Que queres? Ouve! — são mil palmas férvidas, Olha! — é o delírio, que prorrompe audaz. Pisa! — são flores, que tu tens às plantas, Toca no fronte — coroada estás. Descansa, pois, como o condor nos Andes, Pairando altivo sobre terra e mar, Pousa nas nuvens pra arrogante em breve Distante ... longe ... mais além voar.
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