A vinda da paquistanesa Malala Yousafzai, mais jovem ganhadora do Nobel da paz ao Brasil para participar de um evento sobre educação na cidade de São Paulo; e o encontro sobre superação das fronteiras, em Manila, nas Filipinas no mesmo final de semana tem mais elementos comuns do que se imagina. Ambos receberam notoriedade de alguns meios de comunicação, a fim de provocar determinadas inquietações e questionamentos, levando-nos a refletir temáticas como protagonismo e participação. Também está embutido nestes atos o sentimento de busca por algo novo, por experiências diversas das já apresentadas. Uma oriental vem ao ocidente, e tantos ocidentais vão ao oriente. O iminente fato resulta em um desdobramento simbólico não eurocêntrico, capaz de promover significativas trocas culturais e mudanças tangíveis a um mundo desacreditado.
É sabido que vivemos o fim de uma era, um momento em que a velha economia, política, e maneira de viver em sociedade tornaram-se insuficientes e incapazes de realizar o ser humano com a complexidade de demandas que possui. Estamos imersos em um modus operandi prescrito, ultrapassado e que apresenta sinais de falência e morte.
Apesar da introdução um tanto pessimista, conservo em mim um otimismo que não quero perder jamais. Nele encontro motivação para acreditar que um mundo novo está sendo gerado, e encontra-se na barriga deste, por ventura sujo e irreparável, como afirmou uma vez Eduardo Galeano em uma manifestação estudantil na Espanha. Neste mundo novo começam a brotar pessoas como Malala, partilhas como o encontro nas Filipinas. Novas forças, canalizadas para novas realidades e experiências sociais.
Neste exato momento ideias, ações, projetos certamente estão sendo testados e compartilhados por pessoas do mundo inteiro. O experimento é parte da construção de um novo paradigma, capaz de superar as fronteiras culturais, sociais e politicas, alimentadas pela ação de cidadãos globais.
Então o que é ser um cidadão global? Como ele se comporta e quais são os impactos da ação pessoal na vida coletiva?
Um cidadão global é aquele que acredita que pequenas atitudes podem mudar o mundo, mas que, sobretudo suas atitudes impactam na vida do planeta. Cada pessoa é muito importante no envolvimento com as questões globais, contudo é no local que elas se iniciam, ali nos dilemas da cidade, do bairro, da comunidade. Começam doando algumas horas do seu dia, depositando em um “fundo de investimentos” que será aplicado na transformação da vida de pessoas que talvez nem conheça. Ao longo do processo esse cidadão perceberá que não age sozinho, mas é parte de uma movimentação positiva que abraça tantas causas. Pouco a pouco experimentará que seu coração se alarga, não pulsa apenas por seu povo, mas pela humanidade inteira.
Crenças, classes sociais, tornam-se insignificantes, reduzidas a diversidade fruto da troca. Pouco a pouco brota um incômodo frente a realidades sociais negligenciadas: como a pobreza, migração, guerras, degradação do meio ambiente. Contextos existentes na vida cotidiana capazes de sensibilizar e despertar o anseio de transformação, onde cada indivíduo utilizando o potencial que possui, torna-se peça motriz dessa nova engrenagem.
Ouvirá de alguns que seus sonhos não passam de utopia. Aproveito para citar outra vez Galeano: “A utopia está lá no horizonte. Me aproximo dois passos, ela se afasta dois passos. Caminho dez passos e o horizonte corre dez passos. Por mais que eu caminhe, jamais alcançarei. Para que serve a utopia? Serve para isso! Para que eu não deixe de caminhar”.
Que linda é a utopia! Ela nos tira da inércia, colocando-nos diante da possibilidade de um protagonismo pessoal e coletivo. Diante da ação concreta, que nada se assemelha a assistencialismo ou caridade. É um algo novo, uma consciência política global, que faz com que sejamos capazes de nos organizar e cobrar, exigir das lideranças o direito de sermos ouvidos e assim sendo, de ter nossas propostas atendidas. Podemos usar nossa inteligência e astúcia para com ousadia penetrar nos mais variados espaços. Indo além de atos racionais e protocolares, para experimentar e propagar: compaixão, fé, coragem, empatia, confiança e acima de tudo, a capacidade de colocar-se no lugar do outro.
Maria Voce, presidente do Movimento dos Focolares em seu discurso feito aos 6.000 jovens que se encontraram nas Filipinas disse uma coisa extraordinária. “Os grandes ideais fazem a história (...) e para isso são necessárias três coisas: Amar! Recomeçar! Partilhar!”. Façamos história, amemos com coragem cada pessoa que encontramos. Certamente a potência desse sentimento nos fará experimentar novas emoções, ousaria dizer uma felicidade plena, jamais experimentada. Tenhamos consciência das nossas limitações, erraremos em algum momento, não seremos ouvidos em algumas situações, seremos desestimulados em tantas outras... Mas que o dia seguinte seja desafiador e tenhamos coragem de começar outra vez; e por fim partilhemos nossas experiências, dividamos com todos, alegrias e dificuldades. Isso aproximará aqueles que ainda estão distantes e fortalecerá o relacionamento entre aqueles que estão vizinhos.
Sejamos cidadãos do mundo, pois o mundo precisa de nós!