A adolescência é aquela fase louca da vida em que grandes decisões precisam ser tomadas enquanto nem mesmo nos entendemos ou estamos totalmente formados enquanto indivíduos. Escolher uma profissão aos 17, 18 anos é um ato cruel que pode levar a grandes descargas de desespero e indecisão. É claro que nada é tão definitivo assim na vida e novos caminhos podem ser traçados com o tempo, mas ter esse tipo de pressão tão cedo mexe com a cabeça.
Como outros jovens, eu também passei por isso, e foi no segundo ano do Ensino Médio que decidi que faria Jornalismo. O motivo: gostar de escrever. Aliás, depois logo soube que não era a única — e provavelmente não serei a última — a escolher esse curso com base no gosto pelas palavras. Até certo ponto, faz sentido. Mas a realidade não é tão preto no branco assim. É verdade que na faculdade de Jornalismo, o aluno terá disciplinas que exijam escrever. Porém, eu não tardei a perceber que aquele tipo de escrita proposto ali não era bem o que eu queria,
E me lembro de um professor no primeiro semestre que dava uma dessas disciplinas de texto. Na primeira aula, houve aquele ritual comum de todos se apresentarem e dizerem o que pretendem com o curso, essas coisas. E eu, ainda fascinada por estar na faculdade, fiquei encantada ao saber que ele trabalhou em cadernos de cultura de jornais, e quando foi minha vez, disse que gostava muito da área cultural e adoraria escrever sobre isso, no que ele me jogou um balde de água fria: “depois de um tempo, vai ficando mais difícil escrever, pois ficamos mais exigentes com nossos textos e não achamos nada bom”. Ora, não é esse o tipo de coisa que deveriam falar para alunos recém-ingressos no curso, não é mesmo? Eu estava ali justamente porque gostava de escrever, e a última coisa que queria era que alguém me dissesse que isso não seria tão divertido assim.
Naquele dia, eu poderia não saber, mas as palavras desse professor foram premonitórias de alguma forma. Não demorou muito para eu perceber que o Jornalismo não me daria a chance de criar o tipo de texto que eu gostava — que hoje sei que é literatura. Ao longo dos anos, tudo ficou repetido demais e eu não tinha mais o ânimo de caloura. Mas ainda assim me formei, trabalhei na área, enfim, fiz minha parte.
Corta para o ano de 2013.
Escrever um livro sempre esteve nos meus planos, mas parecia algo distante demais para alcançar. Um dia, no entanto, resolvi esboçar um rascunho de um primeiro capítulo, que ficou esquecido no meu computador até ano passado.
Dois mil e dezessete foi um ano de descobertas para mim. Conheci muita gente e fui me aproximando cada vez mais do mundo literário. Retomei a escrita daquele livro e, aos poucos, estou vendo alguns pequenos frutos brotarem. Minha escrita tem evoluído e me sinto cada vez mais conectada comigo mesma: era isso que sempre quis quando escolhi Jornalismo porque gostava de escrever. Hoje encontrei minha turma e meu espaço, não só para escrever textos ficcionais, mas para falar sobre livros e o que eles significam para mim.
Eu sempre vou lembrar com carinho dos anos de faculdade. Afinal, não vou cuspir no prato que me deu ferramentas que, mesmo indiretamente, me são úteis hoje em dia. Acredito que nenhuma forma de conhecimento deve ser desperdiçada e não me arrependo das escolhas que fiz, pois foram elas que me permitiram chegar onde estou hoje — inclusive passar em um concurso público e trabalhar com algo que eu gosto (revisão de texto) também no “horário comercial”, além de ter uma vida estável para me aventurar pela literatura.
Se eu encontrasse hoje o professor que me disse aquelas palavras no primeiro dia de aula, diria a ele que tem razão em mais um ponto, além do que citei no início do texto: realmente, fiquei mais exigente com meu texto com o tempo, Mas isso não me impediu de escrever como achei na época; só fez com que eu tivesse mais empenho em ser cada vez melhor.
E o que mais me orgulha no momento é ter adquirido a coragem de não mais me esconder na minha formação acadêmica para dizer “quem eu sou”. Encho a boca para dizer: meu diploma pode até dizer que sou jornalista, meu contracheque, que sou servidora pública, mas o que eu sou mesmo é ESCRITORA. E esse prazer título nenhum pode me dar.