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Fotografias de Brasil em O SOM AO REDOR

Por Jacqueline Gama de Jesus



Em entrevista ao programa País do cinema, do Canal Brasil, Kleber Mendonça Filho – diretor e produtor de O Som ao Redor – revela que a rua em que se passa a narrativa é uma adaptação do engenho de cana, inclusive, a topografia da rua estaria configurada nesse molde o qual ainda é um símbolo da vida moderna brasileira. Remetendo a esse imaginário, Kleber utiliza dez imagens da fundação Joaquim Nabuco do Recife, na abertura do filme, as quais configuram a exploração do trabalho no campo, casas coloniais e o engenho de cana.


As imagens de arquivo expostas na abertura de O Som ao Redor retomam a significação social da arte expressa por Benjamin acerca das fotografias: “Já não é adequado o livre flutuar da contemplação. Elas inquietam o observador; ele sente que deve buscar um caminho determinado até elas” (BENJAMIN, 2017, p.67). Desse modo, as imagens põem o espectador diante da memória de um passado da história brasileira. O inimaginável das condições de trabalho no campo – plantation – assim como uma alusão à memória escravagista se fazem presentes nessas fotografias que desantropomorfizam o ser humano, ou seja, o coloca em estado de sensibilidade, distanciando-o do “animalesco”. As imagens fora de si também justapõem um mundo extra foto para quem está assistindo. Nesse reino da despalavra, o descolonial se apresentará no dispositivo já que o imaginário da história colonial está diante daquele que vê as imagens rodando na tela.


As fotografias são passadas anarquivicamente, mostradas sem referencial e em um curto espaço de tempo de aproximadamente um minuto. O estar diante delas implica questionamentos quanto ao onde, ao quando e ao como foram capturadas, e uma outra dúvida é provocada: essas imagens seriam ficcionais ou seriam arquivos? Em nenhum momento durante a diegese há uma menção direta a elas, entretanto, a narrativa propõe a reflexão sobre as imagens uma vez que a lógica da cordialidade está engendrada na subalternidade.


As fotografias denunciam a história de hierarquia social em que o Brasil se engendrou, portanto, as imagens das casas coloniais e das plantações de açúcar representam esse imaginário de casa grande e senzala que se instaura atualmente. Nessa constante, os brasileiros ainda mantêm uma sociedade vertical em que predominam as desigualdades sociais. Pensar nessas imagens é refletir sobre uma realidade colonial que se reverbera na contemporaneidade.


Conseguinte, as fotos acionam dispositivos para rever ou rememorar o imaginário brasileiro da exploração e subalternidade através dos referentes imagéticos, ou seja, do contexto social que elas representam.



REFERÊNCIA: BENJAMIN, Walter. A obra de arte em sua reprodutibilidade técnica. Org. Márcio Seligmann. Trad. Gabriel Valladão. Porto Alegre, RS: L&PM. 2017.


Fonte da imagem: http://g1.globo.com/pernambuco/noticia/2012/11/som-ao-redor-recebe-mais-dois-premios-de-melhor-filme.html


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