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Foto do escritorEquipe Soteroprosa

TERRA 2044


O planeta se tornou uma única Terra. Os governantes criaram um conselho maior chamado GROW (Great Rights of World), uma espécie de corte de Haia, mas essa não mais existia. É 2044. O mundo outro.


As populações mais pobres queimaram Instituições desde parlamentos à delegacias, lojas que representavam o capitalismo. BURN, BABY, BURN, gritavam os manifestantes. Tudo começou em 2030 e eu os observava da minha janela enquanto cozinhava ovos mexidos, meu corpo estava tão molengo quanto a gema.


No começo eu não acreditei que isso acarretaria uma revolução, havia poucos anos que o mundo tinha saído de uma pandemia. Acharam uma vacina realmente eficaz, digo que durou mais de um ano no corpo dos sujeitos apenas em 2025. Mas, antes disso, sobrevivíamos, eu tinha vinte e poucos anos na época. Estou fazendo cinquenta hoje.


Naqueles cinco anos até o começo do início da revolução, tudo ficou nebuloso, a economia especulativa estava em decadência, as pessoas ficaram ainda mais desempregadas porque o modelo digital já tinha sido implementado. Defendi doutorado pelo notbook e não sei como sobrevivi ao fato de só olhar para uma máquina assim como faço agora ao escrever esse registro para você que está aí em outro tempo.


Sim, durante os últimos catorze anos a população assassinou alguns de seus comandantes e começou a ditar sua própria legislação. Eram vaga-lumes quando queimava. Não, eram fogueiras e sangue. Mas nada que já não acontecesse antes. No entanto agora os poderosos estavam queimando.


A comida foi redistribuída, os bens, as casas, os terrenos vazios inutilizados. Eu assistia televisão as oito da noite e ouvia os gritos da minha janela, foi assim, durante cinco anos, enquanto eu cozinhava ovos. Algumas balas perdidas atravessava o vidro e os estilhaços ficavam na minha pele. Eu fazia parte daquilo, mesmo sem querer.


Em uma quarta feira e posso garantir que essa foi o estopim do que vivemos hoje, a revolução que já tinha sido espraiada pelo mundo como um vírus altamente contagioso propôs um acordo entre as Nações. De antemão posso garantir que não era nada novo. Na verdade, um projeto utópico. Mas esse pensamento foi até antes de acontecer.


Estávamos vivendo momentos de trevas e fogo, eu me sentida no mundo medieval enquanto a barbárie era o império da vida. Os acidentes uma realidade, pessoas morrendo aos montes nos morros, as drogas como moeda de troca. O Estado que promovia isso cheirava a merda e a gente conseguia sentir isso das nossas televisões mesmo usando máscara.


Não gostaria de estar lembrando deles, não hoje, não agora, quando estou fazendo bolo. Aprendi a fazer bolo, a bater a massa e deixá-la no forno, mas tomando cuidado para ela não queimar e para que eu não saísse com a pele exposta depois de tocar o dedo nas bordas da forma. É preciso usar luvas para se proteger.


Naquela fatídica noite, de quarta, a revolução tomou os meios de comunicação e já estavam no legislativo, os pretos, pobres, oprimidos, gays, lésbicas, transexuais, indígenas, mulheres, trabalhadores, naquele dia, todos, todos estavam unidos na multidão. Eu desci. Eu fazia parte daquilo e se não fazia me senti parte. Me senti um recheio do bolo.


Foi assim que as coisas foram mudando, primeiro a derrubada dos governos em cada Nação, depois a união de cada líder e a redistribuição de moradia. A terra para de quem é de direito. Nenhum tinha mais do que o outro e nem menos do que outro.


Você deve estar se perguntando se estávamos embebidos de ideologia comunista, algo que nossos algozes odiavam. No começo sim, mas depois, não apenas. Devo admitir. Melhoramos os países subdesenvolvidos e que ainda não tinham saneamento básico, implantamos sistemas unificados de saúde e planos de alimentação em que todo mundo tinha acesso a comida e saúde gratuitas.


As escolas estavam cheia de esperança, os alunos não mais pintavam quadradinhos para dizer as respostas certas. Em alguns momentos nem existiam respostas certas. O que importava mesmo era a pergunta e as vezes só uma pergunta respondia a outra. Isso não era um enigma, mas a possibilidade de reflexão.


Hoje, em 2044 estamos implementando um novo sistema legislativo, o GROW (Great Rights of World). As leis não são mero pedaços de papeis, quando desobedecidas oferecemos prisões com jardins, camas para cada um, piscina, área de trabalho, você deve estar se perguntando o porquê de tanta dignidade.


As pessoas não deixam de ser humanas porque cometeram crimes e não será o mal tratamento que mudará alguém, tampouco a morte. Isso já acontecia antes da revolução em países considerados desenvolvidos como a Suécia.


Do Brasil pegamos a ideia do sistema único de saúde que agora estava sendo posto em prática, do Japão os sistemas rápidos de transporte. Atualmente temos linhas subaquáticas e trem bala. Estamos pensando em medidas mais sustentáveis de vida.


Não comemos carne, a não ser em casos específicos de que por alguma deficiência nutricional a pessoa necessite comer proteína animal e mesmo quando é feita, essa é biológica, criada em laboratório, mas livre de qualquer consequência para o corpo vivo.


Nas nossas cidades tem cavalos, carneiros, cobras, jumentos, ratos, galinhas, de tudo um pouco, a comunhão com a comunidade animal é o futuro. Provavelmente você que está aí recebendo essa mensagem, essas minhas transcrições do aqui e agora. Talvez você não acredite no hoje, mas eu digo com propriedade, vocês terão que ser fortes e lutar até o fim. Se não o fizerem um milhão de futuros serão construídos, mas não esse. Talvez vocês matem a raça humana antes de 2044.


Carta ficcional escrita por Jacqueline Gama

Capa: Laura Cardoso ( instagram: @azzarte)


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