Por Yago Pedroza*
Vício. A palavra por si só já traz um peso. Talvez o sentimento que mais tem a ver seja impotência. Como se você lutasse contra algo que já ganhou de você. Te deixa desmotivado. O vício é algo tão cruel que você esquece como é a vida sem ele. Parece que ele faz parte de você. Mas só parece.
Vou começar a parte onde o meu texto corresponde ao título. Imagine o vício como uma partida de futebol. Você pode estar tomando 2x0. Mas quando você faz o primeiro gol, vem aquele ânimo, aquela esperança que leva você a empatar o jogo. E, quando você vira… é uma das melhores sensações que um ser humano pode sentir.
E, no momento, estou lutando contra um vício. E, pela primeira vez, estou virando o jogo. O meu vício tem nome. Transtorno Obsessivo Compulsivo. Ou T.O.C., uma psicopatologia cruel que faz você achar que é a pior pessoa do mundo. E o mais cruel… você vicia nele. Pois, assim como todo vício, ele pode ser uma fuga. E, assim como todo vício, dói demais sair. Dói demais lutar contra seu corpo nos primeiros dias. Mas, cada semana conquistada sem sucumbir ao T.O.C. É uma vibração. É um gol que comemoro como se fosse o da vitória. Pois, a cada semana que passa, estou mais perto do meu objetivo.
Nesse momento, que começo a desmistificar algumas sensações. A primeira que vai embora é a impotência. Pois você começa a ver uma luz no fim do túnel. E ela é tão bonita que você não quer deixar de vê-la nunca mais. Ainda dói, mas dói menos do que a dor de sucumbir.
Como é uma partida cansativa, você sente a fadiga. Sente seu corpo pedir arrego. Mas é nessa hora que você tem que lembrar de seu objetivo maior. E manter a disciplina, a garra. Pois a vitória está logo ali. Tão perto algo que já pareceu tão distante. Você se sente mais vivo. E a sensação de desmotivação começa a ir embora.
Com o tempo, você começa a prestar mais atenção na “torcida”. O que ela diz. Ela te empurra para frente. Gosto de dizer que a torcida são seus objetivos; seu bem estar mental e físico; o sucesso na sua carreira; a vontade de ter um relacionamento com alguém; e, principalmente, a vontade de ser feliz. Logo, você começa a experimentar uma vida que achou que nunca mais iria viver. E começa a perceber que existe MUITA vida fora do vício.
Quando a partida chega nos seus minutos finais, você percebe que está ganhando. Que agora é correr para o abraço. Logo, você percebe que o vício não faz parte de você. Foi apenas um período ruim da partida. Já passou. Você está levando mais uma vitória para casa.
Mas lembre que virão outros jogos para vencer. Ou seja… a tentação da recaída. E nessa hora que você lembra do se time. No meu caso, meu time é meu terapeuta que está comigo 24 horas, praticamente. É meu tio, que me incentiva a deixar o T.O.C. me levar com sua própria luta. No caso dele, o cigarro. A força dele me inspira. É minha mãe e minha avó, que viram muitas crises minhas e procuravam entender como poderiam me ajudar. Sempre tentando me acalmar.
O T.O.C. É um transtorno que vicia. Você condiciona seu mundo a ele. É a partida mais longa e a mais contraditória. Pois uma vez que eu ganhe essa partida, o próprio transtorno vem para o meu time, se torna uma ferramenta. E é isso que eu queria mostrar com esse texto. Seu vício pode virar um combustível quando você supera ele. Quantas pessoas não começam a dar mais atenção a coisas na sua vida porque a superação do vício abriu seus olhos? Quantas pessoas usam suas próprias histórias para ajudar os outros?
Nunca tenha vergonha do seu vício. Reconheça que ele existe, é uma doença. Que pode até não ser tratada, mas você pode usar ao seu favor. E fazer isso talvez seja a final da copa do mundo, quando você ganha a partida de sua vida.
* Yago Pedroza é músico profissional, professor de contrabaixo, e ex-colunista do Soteroprosa.
FONTE DA IMAGEM: INPA - Instituto Nacional de Psicologia Aplicada.
Vício me faz pensar em viceral, uma luta do eu com próprio ser. Um embate sobre versões nossas que estamos tentando viver e que conseguimos viver...
Cara, esse texto veio num momento certeiro: também estou lutando contra um vício que já vem ocorrendo há mais de uma década. Meu jeito reservado, como já é sabido, e a vergonha, de certa forma, me impede de expô-lo. Eu gostei muito da analogia que você trouxe e a forma pela qual você construiu e disse o que queria dizer. Não é fácil lutar contra o vício porque ele não só faz parte de você, mas no meu caso tem um certo agravante: ele responde a um dilema da minha percepção de mundo, que é construída em cima de traumas diversos não resolvidos. Esse meu vício, ao mesmo tempo em que me impede de evoluir e melhorar meu aspecto social,…