top of page

A PLURALIDADE DAS COISAS




Notavelmente o homem moderno ainda existe, passeia e se prolifera pelo planeta terra. Ao longo dos séculos não foram poucas as oportunidades que o tal homo sapiens ou homo sapiens sapiens (derivado do latim “homem que sabe”, ”homem sábio”, vejam só vocês) teve de exterminar a sua própria espécie. Guerras sangrentas pelo poder, por ódio, por vingança. Holocaustos, sadismos, perversidades, bombas nucleares, vírus e muito mais. A verdade é que o homem sobrevive a ele mesmo esse longo tempo e isso é, de certa forma, um milagre.


A pluralidade das coisas foi um tema que me tomou de assalto um dia desses comuns em que eu voltava para casa depois de mais uma jornada exaustiva de trabalho. A capacidade das coisas possuírem inúmeras interpretações, dependendo do ponto de vista, dependendo da cultura de quem julga, dependendo também (e porque não dizer) dos interesses de quem julga ou do poder de quem ou o que é julgado. Esse tema me fez refletir no quanto que nós vivemos num fio singelo que separa a civilidade da barbárie. Uma balança sensível que tende a pender para qualquer um dos lados, desde que as circunstâncias pesem para qualquer um deles.


O ex-Ministro do Supremo Tribunal Federal brasileiro, Hermes Lima (1963-1969 afastado pelo AI-5, ou seja, pela ditadura), dado momento aludiu que “é no meio social que o direito surge e desenvolve-se para consecução dos objetivos buscados pela sociedade, como, por exemplo, a manutenção da paz, a ordem, a segurança e o bem-estar comum; de modo, a tornar possível a convivência e o progresso social” (Introdução à Ciência do Direito. 29. ed. Rio de Janeiro : Freitas Bastos, 1989. p. 23.). Mencionei esse trecho dele para tentar fazer um link da selva de ideias rasas, achismo e convicções em que vivemos hoje com a existência da estruturação de leis que regem e balizam a harmonia social desde o início da estrutura social, uma vez que sempre houve essa necessidade. Mas, se até o direito é relativo como podemos dizer que uma ideia está certa ou errada, um comportamento é execrável ou não? Nossos tios e tias do whatsapp são um rebanho de desmiolados ou não?


Sabido por todos nós, o brasileiro é um exemplo de cidadão com sérios problemas de interpretação de texto, e isso misturado com a capacidade de dizer o que quiser nos espaços gratuitos das redes sociais, acrescentando uma cereja que é a falta de leis e regulamentações para o mundo virtual temos aí a fórmula perfeita do caos.


Um belo dia, lá pelas bandas do início da cronologia ocidental da história, surgiu o homem que destoava de todos os outros daquele tempo, e dos tempos atuais também (estou falando de mais de dois mil anos atrás). Jesus Cristo, um homem de família simples, sem relatos de heranças familiares, que andava a pé, descalço, nascido (segundo relatos) numa manjedoura, um tabuleiro onde se deposita comida para vacas, cavalos e outros em estábulos, começa a dizer pelas ruas de Cafarnaum, (não a cidade baiana, mas lá em Israel) que devemos amar o próximo, olhar o outro com empatia, perdoar e tantas outras coisas absolutamente estranhas ao povo daquela época, e de hoje também. Ele morreu sendo cruelmente torturado, pendurado numa cruz tendo suas mãos e pés perfurados com um objeto para o fixar e apedrejado pela população que pedia a sua morte em detrimento a de Barrabás, um famoso ladrão das redondezas na época. Morreu pedindo ao seu Deus que perdoasse aquelas pessoas. Por conta da sua história de vida e de morte Cristo virou a maior referência ocidental de um ser humano evoluído. Mas em 2023, vinte séculos depois (vinte vezes cem anos, isso mesmo), em nome Dele, fies ao redor do mundo pregam a morte, o descaso, a exclusão, o ódio, a ganância, a destruição. Como pode ocorrer tamanha distorção do entendimento de um fato que inclusive estes que pedem a morte repetem em demasia e apontam inclusive a posição exata de cada versículo que dita a trajetória deste homem? Ignorância? Má interpretação? Maldade? Ou as coisas nunca são o que elas parecem ser, elas são o que nós queremos que elas sejam?


Foi refletindo nessas indagas que me pus a pensar que o que chamamos de bem e mal, de bom ou ruim é apenas uma projeção momentânea dos valores, interesses, pensamentos ou do senso comum. O diabo “provocador de todas as mazelas, maldades e problemas do mundo”, partindo desse ponto de vista (e olha eu aqui exemplificando a coisa), pode ser, dependendo das circunstâncias, o nosso salvador na luta contra o terrível Deus “pai de todo mimimi, toda aquela conversa ridícula de direitos humanos, amor ao próximo, perdão das ofensas, empatia e coisa e tal e blá, blá, blá”.


A vida em coletivo, para ser possível, ela depende sim, mas não de qualquer tipo de interpretação aleatória, ela depende de evolução espiritual, inteligência emocional, capacidade de lidarmos com nossos problemas e entendermos que as pessoas possuem os delas. Termos empatia requer desprendimento, um sentimento nobre que não é alcançado pelos brutos e rancorosos, odiosos ou vingativos. Viver em coletivo carece de pluralidade de pensamentos, em torno da busca pela harmonia, bem-estar e garantia de vida de todos e todas.


FONTE:


Imagem: Blog da Rede Anísio Teixeira


43 visualizações0 comentário

Comments

Rated 0 out of 5 stars.
No ratings yet

Add a rating
bottom of page