BETS, VIRGÍNIA FONSECA, CONSUMISMO E O MUNDO DOS VÍCIOS
- Alan Rangel
- 14 de mai.
- 4 min de leitura
Atualizado: 15 de mai.

A CPI das Bets é uma comissão formada em dezembro de 2024, com prazo de validade até junho de 2025, pelos senadores (dez membros titulares e sete suplentes) a fim de apurar fatos que dizem respeito aos interesses da sociedade. Mais objetivamente: “verificar a crescente influência dos jogos virtuais de apostas online no orçamento das famílias brasileiras, além da possível associação com organizações criminosas envolvidas em práticas de lavagem de dinheiro, bem como o uso de influenciadores digitais na promoção e divulgação dessas atividades”.[1] Se for encontrado regularidades, cabe a Comissão enviar os resultados ao Ministério Público, visando fazer encaminhamentos que responsabilizem civil ou criminalmente os envolvidos. Essa é a parte técnica de todo esse imbróglio. Podemos ver isso no artigo 58 da CF.
Virgínia Pimenta da Fonseca Serrão Costa foi convidada para a CPI, em 13 de maio de 2025. Quem é a moça? Uma influenciadora e grande empresária, com mais de 5 milhões de seguidores, só no Instagram, dona da empresa WePink, criada em 2020, do ramo de beleza. Ela é sócia de outras empresas, como a agência de marketing Talismã Digital e a marca infantil Maria's Baby.[2] Um dado muito interessante: a WePink faturou em um ano, exatamente em 2023, cerca de 750 milhões.
A convocação de Virgínia foi resultado de suas empresas divulgarem as Bets, as diversas casas de apostas no Brasil.
A reflexão sobre os fatos apontados acima, é que, querendo ou não, Virgínia ajuda a alimentar o vicio de todo tipo de gente em jogos de azar, de crianças a idosos. É crime ajudar a alimentar os vícios? Não parece aqui o caso, seria mais uma questão imoral. Como disse a senadora, membra da CPI, “Pode não ser ilegal, mas é imoral”. [3]
Por que é imoral? Temos que considerar que a nossa espécie é fadada facilmente ao vício. Vício é algo inconsciente, perdemos o controle. Quantas pessoas e empresas não ganham a vida se alimentando da fraqueza humana? E quantas pessoas vivem disso e ainda creditam seu sucesso com um empurrãozinho do divino? Vide o perfil do Instagram da influenciadora que falamos acima: “Toda honra e Glória a Deus”. Capitalizar em cima do vício é um grande negócio e tem chancela divina. Nada é visto aqui como impuro, reprovável ou desumano.
Como a CPI tem mostrado, chamando profissionais da área de saúde, entre médicos e psicólogos, é que o vício leva as pessoas adoecerem rapidamente, o que afeta também o próprio entorno familiar. No que tange as políticas públicas, as pessoas que recebem Bolsa Família gastam parte do recurso com Bets. E não é pouco. Só no mês de agosto do ano passado, 3 milhões de reais foram movimentados por famílias cadastradas no Programa. “5 milhões de beneficiários fizeram ao menos uma transferência Pix para uma casa de apostas esportivas. 70% do total são chefes de família, ou seja, os responsáveis por receber o benefício”. [4] Famílias de baixa de renda alimentando seus vícios, e as empresas lucrando com o dinheiro dessas pessoas. Dinheiro público. Tudo aqui vai de mal a pior.
Vivemos em uma sociedade capitalista, de espírito consumista, que investe no desejo insaciável dos humanos por objetos. Seja em empreendimentos de beleza, como a WePink, seja em casas de apostas ou empresas de bebidas, tudo se resume em acessar alguns canais do nosso cérebro, que estimulam prazeres e vícios.[5]
Virgínia Fonseca é só a ponta do iceberg. A sociedade atual trabalha, dia e noite, direta ou indiretamente, para acessar áreas cerebrais que tornam as pessoas mais viciadas, estimuladas dia após dia. Toda a malha do sistema econômico em que estamos imersos vive disso, incita isso. E cada vez mais as técnicas de controle ficam sofisticadas. Os algoritmos, inseridos no mundo digital, auxiliam no processo de antecipar todos os tipos de gostos. As plataformas, as Big Techs, e todos os seus anunciantes, de pequena a grandes empresas, lucraram e lucram horrores com o vício humano. Mas ninguém está preocupado com os danos psiquisocioemocionais gerados por essa engenharia sofisticada, mas macabra. Lucros são moralmente aceitos na sociedade. E há várias ideologias que normalizam. Contrariamente ao que alertava, há mais de 2 mil anos atrás, o grego Aristóteles, o dinheiro acabou virando um fim em si mesmo. E o lucro, multiplicação dos recursos, é o efeito mais devastador.
A ciência vem alertando para as consequências destas novas tecnologias, que alimentam e reforçam esses desejos não naturais e não necessários, para usar as palavras do filósofo Epicuro. Mas, por mais absurdo que seja, a própria ciência e suas descobertas sobre o cérebro é usada, pelos neuromarketings e vários surfistas publicitários e influenciadores digitais, para lucrar e tornar mais eficaz o consumo compulsivo.
Vivemos a radicalização em que tudo é capitalizado ante as debilidades biológicas. O marketing hoje é potencializado por um upgrade sem fim, cada vez mais sofisticado na fase da Quarta Revolução Industrial.
Ou mudemos radicalmente o que pode ser aceitável moralmente, ou continuaremos sendo arrastados pela debilidade humana em todas as suas faces. Ou cortamos a cabeça do monstro que cultivamos ou seremos devorados. A crueldade precisa ser desnudada e desmoralizada.
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Link da imagem: https://www.itatiaia.com.br/entretenimento/2025/05/13/fas-de-virginia-fonseca-invadem-transmissao-da-cpi-das-bets-no-senado
Fontes:
[2] https://economia.uol.com.br/noticias/redacao/2023/09/26/wepink-marca-cosmeticos-virginia-fonseca-e-samara-pink.htm
[3] https://www.metropoles.com/brasil/bets-pode-nao-ser-ilegal-mas-e-imoral-diz-soraya-sobre-virginia
[4] https://www.ihu.unisinos.br/categorias/644000-beneficiarios-do-bolsa-familia-apostaram-r-3-bi-em-bets
[5] https://www.metropoles.com/saude/cientistas-descobrem-areas-do-cerebro-que-so-se-ativam-pelo-vicio
Na CPI uma cena me chamou atenção, quando a influenciadora Virginia Fonseca confunde o microfone e o “chupa” confundindo com uma garrafa de água. A cena que parece cômica reflete a sociedade que vivemos onde os corpos e mentes estão condicionados, ou seja, funcionando no automático.
O caso de influenciadora não é único, só para exemplificar, pais esquecem os filhos no carro, na escola e em tantos outros lugares.
Assim como no relato bíblico, os “porcos” modernos representam o capital que escapa das mãos daqueles que os controlam, gerando desconforto quando alguém tenta interromper essa cadeia de exploração.
Refletindo sobre esse texto, fiz um paralelo com o relato bíblico de Marcos 5:1-20 (quem quiser compreender melhor, pode ler). Não se trata de uma defesa religiosa, mas de um alerta histórico. Mais de dois mil anos se passaram, mas a cena se repete com novos nomes e roupagens tecnológicas. Há mais de dois mil anos, Jesus libertou um homem que estava atormentado havia muito tempo, e os demônios foram enviados para uma manada de porcos, que depois se lançou ribanceira abaixo. O resultado? Os donos dos porcos ficaram revoltados, não pela libertação do homem, mas pelo prejuízo que tiveram.
O ser humano continua repetindo os mesmos padrões de indiferença diante da dor alheia. Ontem, os donos dos porcos; hoje,…
É adoecedor e preocupante.
Mais do que falar sobre os pontos nocivos da jogatina,devemos conclamar a CBF,que mantém uma bet patrocinando o brasileirão. É preciso avaliar o quanto essas casas de apostas podem estar influenciando resultados de partidas! Sem dizer que - ao que tudo indica - possivelmente pagarão o salário de Ancelotti.