top of page

FEMINICÍDIO E MISOGINIA SÃO EPIDEMIAS NO BRASIL! ATÉ QUANDO?


ree



Uma epidemia pode ser definida como a concentração de casos de uma mesma doença em determinado local e época, claramente em excesso ao que seria teoricamente esperado. Dessa forma, podemos entender que uma epidemia é, na realidade, uma etapa na evolução de uma doença específica na coletividade. O feminicídio e a misoginia têm sido uma grave doença para o Brasil.


Nos últimos dias, vivenciamos alguns casos de feminicídio e misoginia sendo escancarados nas redes sociais e na mídia. Em menos de 72 horas, ocorreram ao menos seis casos brutais. No Rio de Janeiro, um homem matou duas colegas de trabalho a tiros no CEFET-RJ por não aceitar ser subordinado a mulheres, e depois tirou sua própria vida. Em Recife, um homem tirou a vida de uma mulher grávida e matou quatro filhos ao atear fogo na casa. Em São Paulo, um homem atropelou e arrastou sua ex-namorada por um quilômetro. A vítima teve as duas pernas amputadas em decorrência dos ferimentos, e o agressor foi preso. Outro homem entrou em uma pastelaria e disparou seis tiros contra sua ex-namorada; até o fechamento deste artigo, o criminoso estava foragido. No Ceará, um homem esfaqueou e matou sua ex. Em Goiás, um homem executou a ex a tiros depois que ela pediu uma medida protetiva.


Todos esses casos têm em comum a violência e misoginia contra as mulheres, seguidas de feminicídio em alguns deles. A misoginia pode ser definida como ódio, desprezo, preconceito ou aversão contra as mulheres. Essa postura pode se manifestar por meio de violência física, moral, psicológica ou sexual, bem como através de discriminação, objetificação ou depreciação das mulheres pelo simples fato de serem mulheres. O ápice da atitude misógina é o feminicídio. A doutora Simone Schwinn definiu feminicídio no Dicionário racial: termos afro-brasileiros e afins – volume 2 como “o assassinato da mulher por ser mulher”. Ela completa que “o feminicídio pode ser considerado como a última etapa de uma sequência de comportamentos violentos e que levam à morte” e aponta ainda que “o número de mulheres vítimas de crimes brutais em razão de seu gênero, é uma realidade causada por ódio, desprezo, ou sentimento de perda de controle e propriedade sobre as mulheres, comum em sociedades machistas e patriarcais, onde imperam estereótipos de gênero”.


Apenas em 2024, conforme dados do Mapa da Segurança Pública, foram 1459 mulheres assassinadas, o que equivale a 4 mulheres por dia. São histórias interrompidas. Cada uma que morre não pode ser reduzida a um número nas estatísticas. Em cada feminício existe uma mulher que tinha sua vida, seus sentimentos, seus familiares, suas dores e amores. Eram vidas que não voltarão. A sociedade brasileira precisa de mudanças que provoquem uma revolução que ultrapasse o âmbito legislativo e transforme a estrutura machista e masculinidade tóxica do país. Enquanto houver, por exemplo, homens que se sentem ofendidos e têm sua masculinidade “abalada” por usarem a cor rosa, o machismo continuará sendo alimentado e seguirá forte em nossa sociedade, para citar apenas um exemplo (na mesma semana, o técnico de futebol Abel Braga declarou que seu time não usaria rosa pois não são veados - e quem disse que todo homem que usa rosa é veado? E quem disse que todo veado usa rosa? Esse é assunto para outro texto).

São necessárias mudanças na mentalidade da nação e isso também se faz com subjetividade. Daí a importância, por exemplo, de respeitar quando alguém utiliza todos, todas e todes em um discurso, afinal a língua é viva! O homem, acostumado a ser normalizado em uma língua que o privilegia em detrimento das mulheres, não quer perder seus privilégios simbólicos e materiais, e a forma mais fácil para ele é recorrer à violência. A linguagem pode ser uma ferramenta poderosa para colocarmos a boca no trombone. É importante nomear corretamente cada fenômeno. Feminicídio, racismo e homofobia são fenômenos que precisam ser chamados pelo nome, e não apenas descritos como crimes de ódio ou crimes passionais. No caso em questão, o ódio e a violência contra as mulheres, enraizados em nossa sociedade, não podem continuar sendo amenizados ou silenciados. Feminicídio e misoginia: esses são os termos!


O Mapa Nacional da Violência de Gênero mostra que a curva segue subindo em 2025. Quando analisamos o recorte racial, os números expõem de forma brutal o que já sabemos: quase 70% das vítimas são mulheres pretas e pardas. Os dados também mostram que 43% das agressões sem morte cometidas com arma de fogo dentro de casa foram praticadas por pessoas próximas da vítima: amigos, conhecidos, familiares e, na maioria das vezes (8 em cada 10 casos), companheiros ou ex-companheiros.


A violência contra a mulher não é novidade. Fazendo um comparativo com a epidemiologia, a violência contra a mulher figurava como uma endemia, condição na qual uma determinada doença está sempre presente em uma população e área, com casos que aumentam ou diminuem, mas nunca desaparecem. Com o advento das redes sociais e a facilidade de filmar tudo a qualquer momento, os casos têm viralizado e vindo à tona com mais facilidade, mostrando a covardia de homens que choram ao serem presos ou que tiram a própria vida após cometerem feminicídios, mas que, com uma arma na mão, não pensaram nas consequências.


Vale ressaltar que os índices de violência contra a mulher têm relação com o aumento de discursos misóginos e machistas, como grupos nas redes sociais em que a masculinidade tóxica reina e busca sedimentar valores discriminatórios e de desvalorização das mulheres. Essa violência de gênero está sempre associada aos índices de desigualdade entre homens e mulheres e, nesse aspecto, a sociedade tem avançado muito pouco nos últimos anos.


O Estado tem falhado nos locais onde essa mulher não consegue buscar ajuda, em territórios sem rede de enfrentamento e socorro, não apenas por falta de delegacias especializadas, mas também pela ausência de políticas de abrigamento sigiloso em situações extremas de risco, além do uso de tecnologias de monitoramento de medidas protetivas, como as tornozeleiras eletrônicas, que poderiam garantir o cumprimento e a eficácia dessas medidas. O Estado também falha ao não promover campanhas educativas, sobretudo com crianças e adolescentes, para evitar que novos machistas sejam formados nas escolas de todo o país.


O Estado segue falhando, os homens “de bem” seguem matando, as mulheres seguem morrendo! Basta! Chega dessas epidemias, dessas doenças que consomem nosso país e nossas mulheres. Queremos nossas mulheres vivas e reinando, produzindo, maternando, vivendo! O que precisa mudar estruturalmente na sociedade brasileira para que os índices de feminicídio deixem de ser naturalizados? De que maneira a educação básica pode atuar na desconstrução do machismo e da misoginia desde a infância? Como o uso correto da linguagem e a nomeação dos fenômenos de violência contribuem para o enfrentamento do feminicídio? Qual é a responsabilidade individual dos homens na desconstrução da masculinidade tóxica que alimenta a violência de gênero? O que você acredita que o Estado deveria fazer imediatamente para evitar mais mortes de mulheres no Brasil? Deixe suas impressões nos comentários.



REFERÊNCIAS:

 

 

PEREIRA, Maurício Gomes. Epidemiologia: teoria e prática. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006.

 

SCHWINN, Simone Andrea. Feminício. In: SOUSA JUNIOR, Manuel Alves de. Dicionário racial: termos afro-brasileiros e afins. v. 2. São Paulo: Dialética, 2025. p. 113-118.

 

SOUSA JUNIOR, Manuel Alves de. Dicionário racial: termos afro-brasileiros e afins. v. 2. São Paulo: Dialética, 2025.

 

 

Referência da imagem:

 

Artista Faraó. 2023. Disponível em seu instagram @farao.stencil no link

 

Comentários

Avaliado com 0 de 5 estrelas.
Ainda sem avaliações

Adicione uma avaliação
bottom of page