MATURIDADE
- Camila Braga Andrade

- 9 de dez.
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A construção da maturidade e da autossuficiência pode ser compreendida como resultado de vivências subjetivas marcadas pela repetição de discursos familiares e sociais que orientavam o indivíduo a resolver seus próprios problemas sem apoio externo. Esse conjunto de experiências contribui para a invisibilização das competências desenvolvidas ao longo da vida e afeta diretamente a formação da identidade. Para compreender esse fenômeno, este texto fundamenta-se em referenciais teóricos clássicos do desenvolvimento humano, como Erikson, Wallon, Vygotsky, Papalia e Feldman, cujas perspectivas abordam dimensões socioemocionais e cognitivas determinantes para o processo de amadurecimento.
A maturidade e a autonomia são influenciadas por discursos socioculturais que moldam expectativas e comportamentos desde a infância. Em muitos contextos, a orientação para que o indivíduo resolva isoladamente seus problemas constitui-se como elemento estruturante na formação de estratégias de enfrentamento. Assim, o processo analisado evidencia como a insistência em uma autossuficiência precoce impacta a maneira como a pessoa compreende suas capacidades, lidando com responsabilidades antecipadas e naturalizando a necessidade de autocontrole. Para interpretar esse fenômeno, considera-se a perspectiva psicossocial de Erikson, que compreende o desenvolvimento como uma sequência de crises que exigem respostas adaptativas. O discurso recorrente sobre independência relaciona-se às etapas de “indústria versus inferioridade” e “identidade versus confusão de papéis”, evidenciando como a cobrança pela autossuficiência pode levar o sujeito a internalizar a ideia de que sua competência deve ser constantemente provada, ainda que não reconhecida.
Ao mesmo tempo, conforme enfatiza Wallon, a afetividade desempenha papel fundamental na formação do caráter e na relação do indivíduo com o meio. Quando as competências desenvolvidas não recebem validação social, cria-se um cenário de reconhecimento insuficiente que interfere diretamente na construção do valor pessoal. Esse aspecto torna-se evidente quando a pessoa, embora altamente eficiente, tem suas habilidades negligenciadas ou naturalizadas como obrigação. Vygotsky também contribui para essa discussão ao afirmar que o desenvolvimento ocorre por meio da mediação social. No caso analisado, embora o ambiente demandasse independência, oferecia pouca mediação afetiva, levando o indivíduo a construir estratégias internas de resolução de problemas sem apoio emocional ou validação, processo que favorece o desempenho, mas pode gerar sensação de isolamento funcional.
Esse movimento é reforçado pela compreensão de Papalia e Feldman, segundo os quais a maturidade envolve articulação entre competências cognitivas, socioemocionais e adaptativas. Assim, responsabilidades assumidas precocemente podem acelerar determinadas capacidades, mas, ao mesmo tempo, produzir um padrão contínuo de reconhecimento inadequado do esforço individual. Observa-se que a imposição da autossuficiência opera como dispositivo orientador de comportamento, funcionando como norma internalizada que estrutura a autoimagem e as práticas de enfrentamento. A invisibilidade das competências adquiridas como organização, autonomia e resolução de problemas revela uma tensão entre a expectativa social de independência e a ausência de reconhecimento das habilidades efetivamente demonstradas.
A construção da independência, desse modo, configura-se como processo silencioso e constante, caracterizado pela internalização da responsabilidade. Enquanto o indivíduo desenvolve competências elevadas, o meio reforça a ideia de que a autossuficiência é obrigatória, dificultando o reconhecimento dos limites pessoais e invisibilizando o esforço investido nas ações cotidianas. Embora esse processo resulte em habilidades relevantes, também produz sobrecarga subjetiva, uma vez que a ausência de validação externa compromete a valorização interna das conquistas.
Desse modo, conclui-se que a maturidade, no contexto analisado, desenvolveu-se como resposta a exigências sociais e emocionais que demandavam independência precoce. A trajetória evidencia que a autonomia não se formou apenas pela ausência de apoio, mas por um complexo processo interno de elaboração, no qual a responsabilidade tornou-se parte constituinte da identidade. A validação externa, frequentemente ausente, revela-se secundária diante da capacidade do sujeito de reconhecer internamente sua própria competência. Estudos futuros podem aprofundar a compreensão sobre os impactos da autossuficiência imposta e sobre os mecanismos de resistência emocional desenvolvidos por indivíduos que vivenciam padrões semelhantes, contribuindo para reflexões mais amplas sobre maturidade e desenvolvimento humano.
REFERÊNCIAS:
ERIKSON, Erik H. Identity and the Life Cycle. New York: W. W. Norton, 1978.
PAPALIA, Diane E.; FELDMAN, Ruth D. Desenvolvimento humano. 12. ed. Porto Alegre: AMGH, 2013.
VYGOTSKY, Lev S. A formação social da mente. 4. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1991.
WALLON, Henri. As origens do caráter na criança. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.
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Gratidão, pelo texto!