MUSTANG EM MARCHA MANUAL: nostalgia no banco da frente, consciência no porta-malas?
- Kelly Lidia
- 10 de mai.
- 3 min de leitura

Já paramos para refletir sobre como a nossa forma de pensar e de sentir desejo é fortemente influenciada pelo contexto sociopolítico e econômico em que vivemos?
Pode parecer meio teórico, mas calma que tem um exemplo bem concreto: o Mustang 2025.
Essa semana, chegou ao Brasil uma nova edição do Mustang (que segundo a internet já está esgotada), com uma curiosidade: apenas em opção com câmbio manual. Isso mesmo, aquele que muita gente já considera ultrapassado. Uma edição limitada e para ‘’colecionadores’’ (200 unidades).
A ideia é de se reconectar com o prazer de dirigir um carro manual, resgatando uma experiência que, aos olhos da indústria, estaria sendo perdida na era dos carros automáticos e altamente tecnológicos.
Desde sua primeira geração, em 1964, o Mustang sempre teve versões com câmbio automático e manual. Pela diferença no custo de produção, a transmissão manual, antes visualizada como uma opção ‘’popular’’ para o mercado, agora é item de colecionador!
Ou seja, a mesma coisa que antes era vendida como algo popular, agora é experiência exclusiva.
É aí que entra o ponto: o capitalismo faz isso o tempo todo. Ele se aproveita das mudanças culturais e transforma tudo em produto. Algo antigo? Vira “vintage”. Algo simples? Vira “autêntico”. O que antes era comum, agora é raro (e claro, caro).
Isso revela uma contradição interessante, pois enquanto o câmbio automático (mais caro de produzir e associado à inovação) se torna dominante, o câmbio manual, antes comum, é ressignificado como objeto de desejo, sob o rótulo de "vintage".
E a gente vai comprando essa ideia.
E ficando preso nesse ciclo, sempre desejando o que nos dizem que é legal, que é tendência. Mas será que a gente realmente valoriza essas coisas por conta própria? Ou será que tá só seguindo o roteiro que o mercado escreveu?
O capitalismo nos empurra o tempo todo para querer o novo, o moderno, o tecnológico. O que é “velho” vira sinônimo de ultrapassado. Mas aí, do nada, o que era velho volta à moda.
E quem decide isso? A própria lógica do mercado (kkk).
Gente, vamos entender que a ideia aqui não é fazer discurso contra o consumo, nem dizer que tudo é manipulação. Mas acho que vale parar e pensar: fora dessa lógica de marketing e status, o que realmente importa para a gente? O que a gente quer de verdade, sem ser porque apareceu num anúncio bonito?
Não esqueçam que, o capitalismo tem uma habilidade notável de se adaptar às transformações culturais e subjetivas. Ele transforma a nostalgia em produto, a memória em marketing, o simples em exclusivo. Aquilo que um dia foi acessível, agora é vendido como raro, como símbolo de bom gosto ou de autenticidade.
No fim das contas, até o passado vira mercadoria. E talvez a maior forma de resistência hoje seja pensar com mais consciência e liberdade sobre o que a gente escolhe, consome e valoriza.
O "vintage" está na moda. Mas quem dita essa moda? E por que seguimos comprando, literalmente e simbolicamente, o que nos é vendido como tendência? E no caso do Mustang o divertido é que nem vamos conseguir comprar o produto (600K é seu preço[1]). Mas sim, a ideia.
A lógica de mercado, de cima pra baixo, vai dominando nossa forma de pensar e especialmente no neoliberalismo não são economizados esforços para nos convencer de que precisamos do novo, do mais moderno, do mais tecnológico. Até que, claro, o mesmo sistema o resgate o ‘’ultrapassado’’ com outra embalagem, atribuindo-lhe valor simbólico e econômico renovado.
Diante disso, vale a pergunta: fora dessa lógica de mercado, o que de fato valorizamos? O que desejamos por nós mesmos, e não porque fomos convencidos a desejar?
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[1] Quem diz qual o valor somos nós, uma vez que o preço é algo objetivo e o valor algo subjetivo.
Link da imagem: https://motor1.uol.com.br/
O texto reflete como nossos desejos e valores são moldados pela lógica do mercado, usando o exemplo do Mustang 2025 com câmbio manual — antes comum, agora produto de luxo. Mostra como o capitalismo transforma o simples em exclusivo e recicla o passado como tendência. A provocação final é: o que realmente desejamos, fora das imposições do consumo?
É interessante porque esse exemplo é um produto de luxo, e um carro realmente caro e fetichizado. Mas eu penso no retorno do vinil, em pessoas que nem tem uma forma de tocar esse tipo de material comprando ele porque se tornou sinal de status e de ser um "fã de verdade". Boa reflexão.
Somos seres construídos socialmente em função de determinadas lógicas dominadas por pequenos grupos de pessoas que exercem domínio na mídia, no capital econômico, cultural, etc. Essas pessoas de alguma forma definem quem nós somos, ou seja, vivemos em uma bolha sendo bombardeados de estímulos e informações.
Quem somos afinal?
Parabens Kelly, Uma reflexão perfeita sobre a influencia capitalista nas decisões que tomamos e consumimos.
Porra,Kelly,que texto interessante! Um olhar preciso sobre as manhas do capitalismo.