O PARADOXO DOS MOVIMENTOS DE RUA E A MODERNIDADE LÍQUIDA
- Everton Nery
- 17 de set.
- 2 min de leitura

Quero aqui abordar o paradoxo dos movimentos de rua numa perspectiva que busca fazer uma interpretação a partir do conceito de modernidade líquida de Bauman: as pessoas saem às ruas movidas por um senso de coletividade, mas essa coletividade é frágil, volátil e pouco ancorada em projetos duradouros. Para Bauman, os vínculos sociais líquidos são marcados por sua transitoriedade pois eles surgem com intensidade, mas se dissolvem com rapidez, pois não há consistência institucional, de ideias ou comunitária que os sustente. Essa efervescência dos protestos, frequentemente impulsionada por algoritmos e bolhas digitais, revela mais agregações momentâneas de indivíduos temerosos e inseguros do que verdadeiros movimentos coesos. A “massa” que emerge não é consistente, é uma espuma agitada e instável.
A ideia de “efeito manada” se conecta diretamente com a insegurança crônica da modernidade líquida. Na lógica de Bauman, quando o mundo se torna imprevisível e fragmentado, os indivíduos procuram abrigo em agrupamentos identitários efêmeros que lhes devolvam uma sensação momentânea de pertencimento. Não se unem por convicções racionais compartilhadas, mas por medos e ressentimentos comuns, facilmente manipuláveis por líderes carismáticos. Por isso, esses vínculos são passionais e frágeis: não suportam o dissenso e se desmancham diante da diversidade, já que foram formados não para conviver com o outro, mas para protegê-los do outro.
Bauman também ajuda a entender por que, apesar da aparente “explosão de participação”, cresce o isolamento e a intolerância: a hiperconectividade digital substitui a presença por conexão, mas não produz comunidade. Há interação, mas sem laços duráveis; há proximidade técnica, mas distância afetiva. As manifestações de rua, portanto, são muitas vezes o transbordamento de frustrações acumuladas em ambientes virtuais que pouco cultivam o diálogo e a alteridade. Elas são sintomas da liquidez, e não sua superação.
Assim, a leitura baumaniana permite concluir que os grandes movimentos de massa contemporâneos não são a prova de um renascimento do coletivo, mas o espelho de sua fragilidade: corpos reunidos fisicamente, porém isolados emocional e eticamente; unidos pelo medo, não pela solidariedade. Essa fluidez torna as sociedades atuais mais suscetíveis ao populismo, ao ódio e à radicalização, porque líderes fortes oferecem a ilusão de solidez num mundo escorregadio, e o desejo de solidez, num cenário líquido, costuma ser mais sedutor que a responsabilidade pela diversidade.
FONTE:
Bauman, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar. 2001
IMAGEM: Portal Bahia no Ar
Foda pra Caralho, eu amei S2
Ao mesmo tempo, foi possível refletir que, mesmo com tudo tão 'líquido', podemos tentar estabelecer conexões mais sólidas quando realmente queremos fazer alguma mudança.
É interessante como ele comenta sobre a internet e as redes sociais, que usamos o tempo todo, destacando que nem sempre conexão quer dizer amizade verdadeira.
Achei o texto bem legal porque mostra de forma simples como as pessoas podem se juntar rapidamente a um protesto e também sair dele com a mesma rapidez.
A metodologia adotada possibilita a integração com disciplinas como ciência política, psicologia social e estudos de mídia, ampliando assim o escopo e a importância acadêmica do trabalho.