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O TEATRO: Encontro, Gesto, e Transformação


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*Marizete Barbosa de Lima Souza



O teatro é mais do que uma arte; é a própria respiração da existência. No palco, a vida se revela em sua essência: um espaço onde o humano expõe suas fragilidades, contradições e esperanças. Cada gesto é uma pergunta ao mundo, e cada silêncio, uma resposta que ecoa no tempo, convidando a plateia a se reconhecer no outro. É a ética da experiência sensível, como aponta Carneiro (2018), que nos move a sair do lugar comum e a nos transformar.


Não existe teatro sem encontro. Ele exige a presença do ator que se entrega e do público que se abre, formando uma coletividade no instante da cena. Essa arte é do agora: efêmera, mas, por isso, eternamente viva na memória. É nesse espaço de partilha que percebemos que a vida, assim como o teatro, é um constante exercício de assumir papéis, fazer escolhas e improvisar.


O artista de teatro vai além da representação; ele questiona certezas e convoca mundos. Em um contexto de pressa e dispersão, seu trabalho nos lembra da importância do olhar atento e do diálogo direto, reafirmando que a arte é um compromisso com o humano e o coletivo. O teatro é filosofia encarnada, poesia em movimento, nos ensina que viver é atuar e que a cada gesto, palavra ou silêncio, podemos construir novos horizontes.


A potência transformadora do teatro é notável no teatro do oprimido, de Augusto Boal. Inspirado na pedagogia de Paulo Freire, Boal rompe com a passividade do espectador, que se torna um "espect-ator", alguém que intervém e reinventa a história. Como afirma Freire (1987): "ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão." O teatro, nessa perspectiva, se torna um ensaio de liberdade e um espaço para experimentar novas formas de ação coletiva e de existência.


O teatro na escola é uma força transformadora que vai muito além da arte. Ele ocupa o espaço escolar para se enraizar nos alunos, dando voz e coragem a quem se sentia invisível. Ao permitir que os estudantes experimentem a vida no palco, o teatro se torna um território de liberdade, onde erros e acertos fazem parte do aprendizado. Práticas como o teatro do oprimido, de Boal, reforçam essa visão, incentivando a participação ativa em vez da passividade.


O Teatro do Oprimido não é apenas uma técnica, mas uma pedagogia da presença e da escuta que só floresce em relações horizontais e afetivas. Ao encenar suas realidades, os jovens se reconhecem como sujeitos históricos, capazes de transformar as estruturas que os limitam. A sala de aula se converte em um palco-política onde a vida é debatida e reinventada. O teatro abre caminho para que o medo se transforme em coragem, o silêncio em palavra e a apatia em ação.


A presença do teatro na escola é um ato revolucionário, se inscreve no chão da sala de aula como semente de mudança, convocando corpos, vozes e consciências a se reconhecerem em sua própria potência criadora.  Cada jogo, improviso e gesto compartilhado constitui um espaço de experimentação onde jovens deixam de ser apenas espectadores do mundo para se tornarem atores de sua própria história. O palco, por mais simples que seja, se torna um lugar onde a juventude pode transformar suas dores, revoltas e utopias em arte, ao fazer isso, eles não apenas encenam, mas reivindicam sua humanidade e afirmam sua autonomia.

 

Boal (2008), nos ensinou que o teatro é uma arma, não de destruição, mas de criação e libertação. Na escola, essa arma não fere, mas cura; não silencia, mas faz ecoar. Cada estudante que experimenta o teatro do oprimido aprende que a opressão não é um destino inevitável, mas uma construção social que pode ser desconstruída. Levar o teatro para a escola não é uma tarefa simples, exige coragem, formação e um compromisso político do educador, que deve atuar como mediador de processos coletivos, disposto a escutar e dialogar.


Por tudo isso, o teatro na escola não é um luxo, mas uma necessidade, é parte de uma educação comprometida com a dignidade e a emancipação humana, é um instrumento de resistência em tempos de desumanização e um espaço para o cultivo da esperança. Ao plantar o teatro no coração da escola, plantamos também a possibilidade de uma sociedade mais justa, crítica e solidária. Como Freire (1987) dizia, "ninguém liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho: os homens se libertam em comunhão." O Teatro do Oprimido é exatamente esse exercício de comunhão, onde cada corpo em cena se une ao coletivo, e juntos, ensaiam um mundo novo. O teatro é a arte de viver, uma aula de humanidade e um laboratório de futuros, que nos lembra que outro mundo é possível, e ele começa aqui, no ato coletivo de fazer teatro.



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*Mestranda do Programa de Mestrado Profissional em Intervenção Educativa e Social MPIES, da Universidade do Estado da Bahia, Departamento de Educação - Campus XI - Serrinha; graduada em Pedagogia pela UNEB (2010), Especialista em Coordenação Pedagógica (UFBA, 2015) Coordenadora Pedagógica do Centro Juvenil de Ciência e Cultura de Serrinha, Professora da Rede Municipal de Serrinha



Referências:


BOAL, Augusto. Teatro do Oprimido e outras poéticas políticas. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2008.


CARNEIRO, Everton Nery. Ética e hermenêutica: Jesus e o paralytikos. Novas Edições Acadêmicas, 2018.


FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987.


IMAGEM: Portal SME

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03 de set.
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Que arraso de reflexão!! Parabéns Marizete por ter olhar e trazer a arte para a escola!!

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