RACISMO NO BRASIL: Estamos Progredindo ou Regredindo?
- Manuel Sousa Junior

- 14 de ago.
- 5 min de leitura

Você já teve a impressão de que está ocorrendo um aumento dos casos de racismo na Bahia e no Brasil? Será que estamos avançando ou retrocedendo nessas questões? Esta semana, fui indagado sobre isso, o que me provocou algumas reflexões. Siga comigo aqui!
Há muitas variáveis envolvidas nesse diálogo. Para começar, é preciso ter consciência de que, atualmente, existem câmeras de segurança e pessoas com telefones celulares a postos em (quase) todos os cantos do Brasil. Dessa forma, temos mais casos vindo à tona, viralizando nas redes sociais e sendo noticiados pela imprensa.
Segundo Cristiane Lourenço (2024), no racismo, “a cor sempre chega primeiro. Essa é a constatação quando se examinam as conexões políticas, econômicas e sociais no país. O racismo é onipresente em nossa estrutura social, em nossa teia de convivências”. Nesse sentido, é ingênuo pensar que o racismo esteja diminuindo em nossa sociedade. O que acontece é que, com o passar do tempo, temos mais pessoas sensíveis a essa causa e que passam a perceber detalhes que antes passavam despercebidos — como o racismo explícito que havia na televisão nas décadas de 1980 e 1990, quando até personagens negros eram interpretados por artistas brancas e brancos, e tudo parecia normal, existia muito racismo recreativo etc. Exemplos ocorreram em novelas como Escrava Isaura e Chiquinha Gonzaga e programas como Os Trapalhões da Rede Globo de Televisão.
É inegável que, nas últimas décadas, ocorreram avanços nas políticas públicas, muitas vezes impulsionados pelos movimentos sociais. Tivemos a aprovação de leis que tornam obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira e indígena na educação básica, o Estatuto da Igualdade Racial, a política de cotas nas universidades e concursos, entre outras conquistas. Porém, ainda existem dificuldades na plena implementação de todas essas políticas no cenário nacional como a falta de formação de professores e falhas nas bancas de heteroidentificação.
Outro ponto que precisa ser levado em consideração é o avanço da extrema direita nos últimos anos, que repudia pautas progressistas, de inclusão e de combate ao racismo. Apenas para citar alguns exemplos, o ex-presidente Bolsonaro referiu-se aos quilombolas utilizando medidas em arrobas, animalizando-os. Em outra ocasião, ao ser questionado sobre o que faria se um de seus filhos se envolvesse amorosamente com uma mulher negra, respondeu que seus filhos foram bem educados e isso não ocorreria. Esse avanço extremista tem estimulado constantemente seus adeptos a não sentirem mais vergonha de expressar atitudes racistas, homofóbicas, misóginas, machistas, capacitistas, entre outras formas de discriminação.
Assim, o aumento do conservadorismo, aliado muitas vezes ao fundamentalismo religioso, escancara o racismo. No entanto, as pessoas que sofrem atos racistas também aprenderam a enfrentar essas situações e a não abaixar a cabeça. Há algumas décadas, piadas em programas humorísticos ridicularizavam pessoas negras, mulheres e a população LGBTQIAPN+ (então chamada de GLS — Gays, Lésbicas e Simpatizantes). Todos riam, mesmo que fosse uma risada sem graça para os integrantes desses grupos — e, ainda assim, tudo parecia normal. Hoje, esse tipo de comportamento é inaceitável para a maioria das pessoas, embora ainda seja incentivado pela extrema direita e seus seguidores.
O racismo anda de mãos dadas com a branquitude. O intelectual Lourenço Cardoso, classifica a branquitude em crítica e acrítica. Para ele, a primeira é estudada pela literatura científica e refere-se ao estudo do indivíduo branco que desaprova publicamente o racismo, sendo aliado da pauta antirracista. Quando ocorrem “deslizes” e o racismo é cometido, vem a público pedir desculpas ou emite notas de repúdio a qualquer tipo de preconceito. A vertente acrítica refere-se à branquitude individual ou coletiva que sustenta o argumento em prol da supremacia racial branca. “A branquitude acrítica sustenta que ser branco é uma condição especial, uma hierarquia obviamente superior a todos não-brancos” (Cardoso, 2010, p. 611).
Organizações neonazistas e neofascistas, grupos extremistas e seguidores da extrema direita são alguns exemplos de grupos de brancos que defendem a supremacia racial branca como uma superioridade inata/natural, histórica e inquestionável. A justificativa biológica não se sustenta mais na atualidade, porém a História legitima a sua superioridade (Sousa Junior, 2025). “O discurso principal dessa branquitude, ou melhor branquitude acrítica sustenta-se na idéia de existência de uma superioridade racial branca, apesar dessa ideologia ser francamente desautorizada e rechaçada pela comunidade internacional” (Cardoso, 2010, p. 621). A branquitude acrítica quando atua de forma mais branda, tenta inserir-se em espaços democráticos utilizando discursos racistas disfarçados de nacionalistas ou sob o pretexto de liberdade de expressão. De um modo geral, os indivíduos da branquitude acrítica não se consideram racistas, pois, na condição de brancos, eles são naturalmente superiores aos não-brancos.
Em alguma medida, vemos pessoas pretas, homossexuais, mulheres, imigrantes e outros grupos atacados pela extrema-direita figurando como seus adeptos ferrenhos, como o deputado federal Hélio Lopes (Partido Liberal), a influenciadora Jojo Todynho, o maquiador Agustin Fernandez (maquiador de Michelle Bolsonaro) e a deputada federal que se autodeclara indígena, Silvia Waiãpi. Nesses casos, para além da consciência de classe e de raça, o que se observa é que esses indivíduos foram cooptados pela branquitude acrítica e não se reconhecem como membros das comunidades afetadas. Contudo, eles jamais ocuparão o mesmo lugar do padrão extremista: homem, branco, hétero, cisgênero — sendo sempre vistos como coadjuvantes, utilizados apenas como números, exemplos (exceções em verdade) ou símbolos de massa de manobra nos discursos e atitudes políticas.
Esses fatores podem estar contribuindo para o aumento das estatísticas de casos de racismo no Brasil. O Anuário Brasileiro de Segurança Pública, publicado em 2024, apontou um crescimento de 127% nos registros de boletins de ocorrência por racismo em 2023, em comparação com 2022 (Jornal de Brasília, 2024). Uma pesquisa do Datafolha, realizada em novembro de 2024, revelou que 45% dos brasileiros acreditam que o racismo aumentou — percepção ainda maior entre a população negra (Alves, 2024). Esse aumento está relacionado não apenas a uma maior conscientização sobre o problema, mas também ao crescimento do conservadorismo e da extrema-direita, além de uma maior disposição das pessoas em denunciar os casos de racismo.
Apenas pelo Disque 100 foram mais de 3,4 mil denúncias que abrangem mais de 5,2 mil violações de cunho racial de janeiro ao início de novembro de 2024. O número é superior ao de 2023, que registrou 3,1 mil denúncias de racismo e injúria racial e 4,6 mil violações. Já em 2022, o serviço foi menos acionado, com 1,8 mil denúncias e 2,3 mil violações, seguidas por 1,4 mil denúncias e 1,4 mil violações em 2021 (MDHC, 2024).
Desde sua origem, o racismo sempre esteve presente — e agora não é diferente. Ao contrário: está mais forte diante do extremismo em alta no país.
Sigamos juntos na luta antirracista!
REFERÊNCIAS:
ALVES, Beatriz. Datafolha: 59% dos brasileiros acreditam que a maioria da população é racista. CNN Brasil. 20 nov. 2024. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/politica/datafolha-59-dos-brasileiros-acreditam-que-a-maioria-da-populacao-e-racista/. Acesso em: 01 ago. 2025.
CARDOSO, Lourenço. Branquitude acrítica e crítica: A supremacia racial e o branco anti-racista. Revista latinoamericana de ciencias sociales, niñez y juventud. v. 8, n. 1, p. 607-630, 2010.
JORNAL DE BRASÍLIA. Registros de casos de racismo aumentaram 127% no Brasil em 2023; injúria racial também cresce. 18 jul. 2024. Disponível em: https://jornaldebrasilia.com.br/noticias/brasil/registros-de-casos-de-racismo-aumentaram-127-no-brasil-em-2023-injuria-racial-tambem-cresce/. Acesso em: 01 ago. 2025.
LOURENÇO, Cristiane. Racismo. In: SOUSA JUNIOR, Manuel Alves de. Dicionário racial: termos afro-brasileiros e afins. v. 1. Curitiba: Appris, 2024. p. 213-215.
MDHC - Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania. Mais de 5,2 mil violações de racismo e injúria racial foram registradas pelo Disque 100 em 2024. Gov.br. 22 nov. 2024. Disponível em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/assuntos/noticias/2024/novembro/mais-de-5-2-mil-violacoes-de-racismo-e-injuria-racial-foram-registradas-pelo-disque-100-em-2024. Acesso em: 01 ago. 2025.
SOUSA JUNIOR, Manuel Alves de. “Branco com branco, preto com preto”: contribuições da educação eugênica para a branquitude no Brasil (1909-1945). 2025. 329 f. Tese (doutorado) - Educação, Programa de Pós-Graduação em Educação, Universidade de Santa Cruz do Sul, Santa Cruz do Sul, 2025.
Referência da imagem:
SWIFT. Conheça o que é Racismo e quais são as suas ramificações. 28 nov. 2022. Disponível em: https://respeitoaoplaneta.swift.com.br/responsabilidade-social/conheca-o-que-e-racismo-e-quais-sao-as-suas-ramificacoes/. Acesso em: 08 ago. 2025.



O pior que tem negro que é racista e branco que não considera branco.
No cenário atual, a extrema-direita fascista tem o papel de naturalizar as opressões históricas, tais como de gênero, raça e classe.
Pela lógica do medo, é forjado o inimigo comum que está sempre à espreita e no imaginário coletivo.
Por assim dizer, o ódio é outro elemento fundamental do fascismo, em que os algoritmos, através da disseminação de fake news, desinformação e outros crimes, propagam essas opressões sem o mínimo de controle.
Por isso, é fundamental a regulamentação das redes sociais/mídias digitais.