SHOWS DE PADRES NO SÃO JOÃO DA BAHIA: a fé dança forró?
- Carlos Henrique Cardoso
- 13 de jun.
- 3 min de leitura

Tem fenômeno novo - e até onde eu sei, inédito - no São João do Nordeste. É a apresentação de padres durante os festejos juninos de algumas cidades baianas. Pelo menos três deles irão se apresentar nos palcos e animar (?) a multidão em busca de um bom arrasta pé. Não é clickbaitt! Os cachês dos sacerdotes Fábio de Melo, Alessandro Campos, e Antônio Maria, são bem generosos. Junta-se a eles, João Carlos, que já se apresentou em Jeremoabo, no mês de maio, dando o ponta-pé inicial na festança de lá. Somando todos, vão faturar cerca de 1 milhão e 400 mil reais! E aí? Prontos pro xote litúrgico? Parece que a fé, além de remover montanhas, arrasta-pé no arraiá.
O São João é uma festa católica trazida pelos portugueses e há muito enraizada nas zonas rurais do país, sobretudo no Nordeste, conforme a cultura, demografia, geografia, e agronomia de cada lugar. Baião, xote, pé-de-serra, costumam ser os ritmos que animam o público. De uns tempos pra cá, o pessoal vem aceitando uma maçaroca de ritmos, tem cidade que a programação possui 10% de forrozeiros e 90% de pagode, axé, e sertanejo. E nesse 2025, louvores sacerdotais, ao que tudo indica.
Como citado, é uma festa católica, mas isso sempre ficou restrito a templos e novenas, separando-se o sagrado e o profano. Pra muita gente, pode soar estranho ter uma atração gospel “divertindo” o público. Isso porque as canções entoadas por esses padres possuem melodias para encontrar a paz de espírito, e não sacolejar o corpo. Alessandro Campos é um deles. Ele é conhecido como “padre sertanejo” e vai levar quase 1 milhão de reais tocando em três municípios (a saber: Campo Formoso, Barreiras, e Itatim). Ele usa chapéu de cowboy - com uma batina por baixo - violão destacado, e visual típico de um astro do gênero. As letras, falam de Deus mesmo. E como sertanejo é uma música palatável para milhões que adoram uma gandaia, o padre acaba arrebatando tanto quem busca a graça como quem busca a cachaça. Esperto ele!
Há algum problema esses lideres religiosos se apresentarem nas festas do interior? Problema nenhum, embora tenha a percepção de que a cada ano, as prefeituras desafiam o gosto musical dos apreciadores da festa com novas ideias e possibilidades sonoras pra entreter o público. Ao mesmo tempo, atende o filão cristão. Ultimo censo mostrou que caiu o número de católicos (de 65% em 2010 para 56,7% em 2022), mas junto a protestantes, perfazem a maioria do conservador povo brasileiro. Uma turma de padres começarem a tocar numa festa requisitada como o São João, pode dar uma reanimada. Também abre brechas para evangélicos colocarem seu chapéu de palha, acender sua fogueira, soltar fogos e colocar uma sanfoninha no palco para entoar seus salmos pelos aires. Mesmo que seja numa festa de santo, coisa que eles não acreditam. Porém, nunca se sabe! O santo fica na igreja e a festa na rua. Então, anarriê, irmãos! Quem tem fé, ama a palavra muito mais que um bate-coxa. Mas cá pra nós... fica bem esquisito um show de louvor em meio a "tô aqui comendo água" e "senta, senta, senta, senta, senta, senta..."
E as pessoas no interior querem ter a possibilidade de assistir essa parafernália toda de ritmos, principalmente quem mora distante de locais que recebem turnês de grandes shows. Portanto, quem reside no meio da Chapada Diamantina ou lá no Raso da Catarina, ver Léo Santana cantando seus sucessos, pode ser aceitável. E quem é católico praticante e não participa de romaria, nem pode ir pra Aparecida ou Bom Jesus da Lapa, pode ver Padre Fábio de Melo cantando praticamente na porta de sua casa. Fica cada vez mais difícil os tradicionalistas exigirem apenas forró nas festas juninas...
E bota difícil nisso! Vai ter Alok em Irecê e Jequié. É, galera, um "arraiárave"! 750 mil reais de cachê. Isso demonstra algo que já falei antes: o São João parece que virou um carnaval de inverno. E já tô pensando aqui “será que ainda teremos padre em cima do trio na folia de Momo?” . E as novas gerações, assim, correm o risco de perder as ligações com antigas tradições e celebrações sazonais. Tudo é aceitável o tempo inteiro, o ano todo, e a cada momento. O curioso disso tudo é que forró é o único ritmo, coitado, que fica de fora de tudo, somente aceito no São João, e olhe lá! Sendo assim, não duvide que no próximo ano o Sepultura toque lá em Amargosa. Após a apresentação de um pastor...
FONTE:
IMAGEM: Site Voz da Bahia
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