Por Maria Ávila*
Coloco uma palavra depois da outra, desde que conheço as palavras. Brinco de criar uma vida na cabeça de alguém, através das palavras que seguem nessas linhas, que me parecem estradas. Muitas vezes, trilhas, quem as percorre leva um tanto de mim, mas interpreta a partir do que traz consigo. À tal sabedoria, chamam de ler. À minha rebeldia, chamam de escrever. Apresentar-me como escritora sempre pareceu uma ousadia, uma utopia inalcançável. Como eu, humana que brinca de fazer turismo-poesia, posso me definir como aqueles que mais aprecio? Como eu, tão pequena feito formiga, posso delimitar nas curvas da minha existência a marca de ser alguém que escreve? Não se sabe. Por que fazemos o que fazemos? Por que somos o que somos? São as melhores perguntas de todas, justamente porque não têm resposta.
Escrevo, por urgência e instinto. Sem formação, preparo prévio, ou aquecimento. Correndo na olimpíada da vida, não quero a linha de chegada, quero o caminho-palavra que permite traduzir a poesia que sinto, vejo, troco. Decidi me definir escritora, por que escrever é o que amo, e para mim isso basta. Para além de, sou mulher que escreve, faço questão de marcar a alma dos meus poemas e textos com o líquido preso na parede do útero. Tudo que sai de mim, sai mulher. Sangra mulher. É do ventre da alma, do ventre do corpo. Respeito.
Eu sou escritora. Eu sou poeta. Entende o poder que há em reconhecer-se? Entende o poder que há em ser mulher, e mulher, reconhecer a si dentro daquilo que ama? Você é artista, você é professora, você é arquiteta, você é médica, você é. Corpo físico marcado por cicatrizes próprias, calos que só você entende, por que os sapatos só têm o seu número e só os seus pés percorreram esse caminho, corpo social enfrentando a desumanização, tratado como objeto, como o outro, ou o outro do outro. Mas assim mesmo, corpo casa, morada de si, morada de todas. Então enquanto escrevo, enquanto me expresso, não falo só. Me torno parte de algo maior. Recuso a carrasca que aqui mora e tenta impor a censura, rompo com ela e escrevo. E me intitulo, e caminho. Uma palavra depois da outra, desde que conheço a coragem.
*Escritora e Organizadora da Antologia Mulheres, Afeto e Liberdade. Instagram: @mariamariapoesia
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