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Foto do escritorLígia Costa

UMA TREND, UMA RAINHA E O TEMPO





Há pouco tempo, navegando em uma rede social, surgiu para mim uma trend1[1] (Acho que esse é o nome) com um desafio para que pessoas acima dos 40 anos de idade postassem uma foto para mostrar que permanecem bonitas, contrariando a régua social de que aqueles que estão na casa dos -entas perderam a beleza.


E por que fui capturada pela brincadeira? Porque quarentei. Como uma jovem senhora, já sou chamada de tia por sobrinhos que nem são meus. Vejam vocês! Lembro da primeira vez que fui chamada assim e do susto que tomei, quando a voz de um menino na rua me pegou em cheio, deixando um amargor de surpresa, indignação e constrangimento. Confesso! Me senti tão ofendida que não consegui dizer nada, só praguejei, muda, a ousadia daquele moleque.


Depois dessa estreia vieram outros “tia”, “minha tia”, “senhora”, que acostumei. Como diz aqui em Salvador: Descarei! Comecei fazer a graça, ri de mim mesma e dançar a dança da vida no agora, no que sou hoje e não no que eu fui.


O meu agora tem fios de cabelos brancos, umas dores nas costas, mas também tem li – ber – da – de. Eu nunca me senti tão livre como me sinto agora depois dos 40, priorizar as minhas vontades é muito bom. Nossa! É bom demais! Os anos das expectativas dos outros não orientam mais o meu humor, sinto que meu choro e meu riso são mais verdadeiros.


Veja! A juventude quando está adoecida nos exige correr, sem saber para onde, saímos em disparada cumprindo comandos sem pensar num motivo para tanta carreira. Viver sem sentir é comida mal digerida, é indigesta. A busca por um ideal de beleza não pode ter concretude, precisa ser inatingível, precisa ser bolo no estômago para se fazer presente, porque se assim não for, a moeda não gira. A insatisfação perene tem movido o mundo.


Sentir-se livre é conectar-se com o aqui e agora e isso quer dizer experenciar as nossas possibilidades a partir da nossa posicionalidade que é dinâmica, por isso mutável. Quando percebemos quem somos e abandonamos as personagens as quais nos exigem performar, jogamos na lata do lixo um peso inútil que carregamos.


Não estou dizendo que devemos subestimar desejos, ao contrário disso. Você já se autorizou fazer perguntas como: O que eu quero? E para que eu quero? Conheço muitas pessoas que não têm resposta para a primeira pergunta muito menos para a segunda, porque estão afastadas de si mesmas.  


Acredito que essas respostas constituem o que verdadeiramente importa: Ser quem se é, para se tornar quem se quer ser na vida e isso não está, necessariamente, atrelado a idade cronológica de ninguém. Têm pessoas que passam uma vida inteira aprisionadas a histórias contadas por outras pessoas.

E por falar em histórias, você gosta de contos de fadas? Os contos de fadas são recheados de lições do que é belo e do que é bom. Mas será que muitas dessas histórias que ouvimos não podem ser recontadas por outras vozes, outras posicionalidades?


Lembremos da história “Branca de Neve e os sete anões”, mas deixemos a história da alva princesa para um outro dia. Pensemos na madrasta da Branca de Neve, a rainha má, uma mulher bonita que todos os dias indagava o espelho mágico:

_ Espelho, espelho meu, existe nesse mundo alguém mais bela do que eu?

De quem era a voz-resposta do espelho mágico? Sua autopercepção. Afinal, o que o espelho reflete se não a nossa própria imagem?


Anos após anos a rainha vigiava a própria imagem e com o passar dos dias os sinais do tempo foram surgindo. Uma ruguinha aqui, uma olheira acolá e a autoconfiança da rainha foi desmoronando como um castelo de cartas, enquanto se comparava ao frescor juvenil da enteada. Qual a moral da história? A juventude é bela e boa.


A rainha rendida aos introjetos de beleza, sucumbe a uma percepção de si mesma disfuncional, se olhava no espelho, mas não se enxergava, desejosa por voltar a ver o que via antes, e para isso acreditou que era preciso destruir a juventude da outra.


Ora! A rainha tornou-se feia e má, porque estava longe de si mesma, estava presa ao que era da princesa, ao invés de estar conectada consigo mesma, livre para ser o que era. Uma bela entre as outras belas.


Assim como a rainha má, muitas pessoas escolhem vivenciar a passagem do tempo com amargura, sem fazer atualizações da sua autoimagem. Essas pessoas estão emocionalmente adoecidas, pois estão presas a modos de funcionamento ultrapassados que não são mais efetivos.


Minha pele não é mais a mesma, mas existem diversos cosméticos próprios para os 40+; já não sou presença em todos os rolês, porque hoje, depois dos 40, conheço muitos cheiros e sabores, aprendi a experimentar a vida e por isso posso mais.

 

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[1] Trend – palavra de origem inglesa que significa Tendência.





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