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A INQUIETUDE NA OBRA DE RITA VAZ


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A imagem acima é a última obra produzida por Rita Vaz, artista plástica criada a partir da cultura mineira e residente no estado do Paraná, em exposição na Sala de Exposições da Universidade Estadual do Paraná – Campus de Curitiba I, entre os dias 12 de agosto a 30 de agosto de 2025. A instalação apresenta, no primeiro plano, fotografias em tecido de três mulheres que participaram da resistência ao regime empresarial-militar brasileiro (1964-1985) e continuam lutando pela construção de uma sociedade qualitativamente livre e igualitária. Junto de Amelinha Teles, Cecília Coimbra e Judite Trindade estão bordadas palavras que são significativas para essas três mulheres. As linhas bordadas dão forma a valores e a ideias que fomentam uma atuação diária pelo coletivo, respectivamente: “liberdade”, “a vida insiste” e “não esquecer jamais”.


A artista, Rita Vaz, trazendo essas mulheres no primeiro plano, tece na conjunção da fotografia, tecidos e bordados, a memória de tempos recentes. Uma memória que a todo custo, os apoiadores dos militares e da burguesia entreguista brasileira buscam escamotear. Uma memória que é preciso construir e reconstruir para que todos brasileiros e brasileiras nunca se esqueçam das diferentes formas de violências perpetuadas no período.


Rita Vaz toma partido diante da realidade brasileira e, ao evidenciar a presença feminina na resistência, propicia ao observador reflexões sobre as questões de classe e de gênero presentes em nossa história. As fotos, que possuem intervenções com bordados, propiciam ao observador inquieto se questionar e, potencialmente, desvelar a realidade social do país.


Longe de oferecer respostas imediatas, a obra possibilita a reflexão sobre a história daquelas mulheres que trazem uma leveza no olhar, o sorriso e a segurança de suas escolhas. Ainda há nesta instalação mais duas fotografias de mulheres, num segundo plano, que tem suas poses inspiradas nas pinturas “No haras nada conclamar” de Francisco de Goya e “Angelus Novus”, de Paul Klee.


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Novamente, na conjunção de fotografia, tecido e bordados associados às poses performáticas, a artista expõe indignação diante dos horrores causados pelo regime empresarial-militar, presente no olhar e no gesto da imagem inspirada no desenho de Paul Klee, ao mesmo tempo que coloca a revolução como um imperativo para a superação das mazelas da sociedade capitalista brasileira.


O grito de pavor expresso na imagem inspirada no desenho de Goya, com uma mulher que olha com raiva para as profundas marcas deixadas em nosso país pelos governos militares traz o “levante” como saída histórica, ou seja, uma mudança que se constrói coletivamente. A foto bordada convida o observador a se “levantar”, a se tornar sujeito histórico insurgente frente a uma realidade desumanizadora e desigual.


A indignação diante do passado, o chamamento aos observadores do presente e a transformação radical da sociedade como projeto de futuro é o cerne deste trabalho de Rita Vaz que tem sua maior riqueza ao construir essa narração, em forma e conteúdo, a partir da particularidade brasileira. A presença de imagens de mulheres que viveram e foram resistentes ao regime empresarial militar expressam a particularidade do ponto de vista do conteúdo. No que diz respeito ao aspecto formal, o bordado, aprendizado adquirido coletivamente em seu seio familiar, é a sua expressão.


A história complexa revelada por meio desta obra, construindo memória, é urgente num momento em que mais uma vez setores da sociedade brasileira tensionam para uma nova anistia ampla e irrestrita à tentativa de golpe de 2023. O combate aos aspectos fascistóides presentes em nossa sociedade, como diria o professor Florestan Fernandes, é fundamental para a superação da democracia restrita existente no Brasil.


Transformação e tomada de consciência andam lado a lado; é um movimento dialético, individual e coletivo, para o qual as obras de arte, como a da artista trazida, podem contribuir. O filósofo húngaro, Georg Lukács, em suas considerações sobre a arte e a ciência afirma que ambas são formas explicativas da realidade que, a despeito de suas distinções, possibilitam a construção do conhecimento e da compreensão da realidade.


Dialogando com essa apreensão estética, pode-se dizer que esse trabalho de Rita Vaz, ao construir memória e propiciar a inquietação e a reflexão tem papel fundamental em nossa sociedade, porque traz a inquietude, a indignação e a potencialidade da ação coletiva como uma perspectiva de transformação social.



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há uma hora

Trabalho maravilhoso da Rita boa divulgação

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